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14.30 - Assembleia (simulação)
20.00 - Jantar-Conferência com o Dr Vasco Graça Moura
31-08-2007
Jantar-Conferência com o Prof. Dr Luis Valadares Tavares
 
Bruno Moura Ferreira
Muito boa noite. Aproveitando a presença do ilustre Prof. Luis Valadares Tavares, homem do conhecimento, tecnologia, possuidor de irreverência e capacidade de prospecção e inovação aplicada, algumas das características que caracterizam esta geração.

Queria brindar à sua presença com uma frase de Emídio Guerreiro:

“tende sempre o espírito crítico, para vós não deve haver tabus. Dentro do respeito que mereceis, vós mesmo deveis criticar impiedosamente tudo aquilo existente.

Sim, criticar sem receio, de que vos chamem demolidores. Vós sois demolidores do mal, vós sois os construtores do futuro ideal”. Viva a JSD.

(Brinde e aplausos)

 
Dep. Carlos Coelho
Senhora Professora doutora Maria Manuel, senhor presidente da JSD, senhores conselheiros, senhores avaliadores, minhas senhoras e meus senhores.

Antes de saudar o Professor Doutor Luis Valadares Tavares, e de lhe fazer a primeira pergunta de acordo com a praxe, queria dizer-vos duas coisas:

A primeira é que nós estamos neste momento, e já começámos à tarde, a fazer um teste, que é de certa forma passar das paredes da nossa Universidade para fora. Estamos a fazer o broadcasting, ou seja, estamos em directo na net a emitir a nossa universidade. Fizemo-lo durante o dia de hoje, e continuaremos até ao final da Universidade.

Como queremos que esta Universidade continue a ter algumas características, e que os nossos convidados estejam à vontade para falar sem recearem que as suas declarações possam ser usadas indevidamente, não estamos a fazê-lo em sinal aberto. Ou seja, nem todos os portugueses têm acesso à Universidade de Verão. Estamos a fazê-lo em sinal fechado, com código, e apenas têm estado a aceder à Universidade, os ex-alunos da Universidade de Verão. Os vossos colegas de 2003, 2004, 2005 e 2006 estão a seguir os vossos debates, aquilo que vocês dizem e aquilo que os nossos convidados nos respondem.

Se a experiência der bom resultado, em 2008, vocês terão oportunidade de estar do lado de lá, em vossas casas, onde desejarem a seguir a Universidade de 2008, ou pelo menos os debates que considerarem mais interessantes, mais estimulantes ou mais úteis para aquilo que estiverem a fazer na vida na altura. E, é mais uma inovação que se regista e é um passo que damos nesta Universidade 2007.

Depois queria pedir aos nossos avaliadores e aos nossos Conselheiros que estejam presentes numa reunião que faremos a seguir a este jantar para decidir duas questões de organização que se prendem com as Assembleias de amanhã, e que temos que decidir esta noite.

Eu conheço o Professor Doutor Luis Valadares Tavares há muitos anos. Conheci-o quando ele era Director-Geral do Ministério da Educação, onde conduzia uma equipa de gente com muito valor, que produzia pensamento sobre educação.

O Professor Doutor Luis Valadares Tavares é Professor catedrático no Técnico, é um homem que dedicou a maior parte da sua vida à educação, é Presidente do INA, e portanto, é um homem que conhece bem a Administração Pública, fez muitas coisas na vida, como aliás, têm oportunidade de ver pelo currículo que foi distribuído, mas eu sempre associei o Professor Valadares Tavares a uma das pessoas que em Portugal mais sabe de educação, e não apenas mais sabe sob o ponto de vista do conhecimento, mas mais sabe sob o ponto de vista da capacidade de produzir pensamento estratégico. Não é de estranhar pois que o tenha convidado para estar aqui connosco esta noite, sobretudo por causa disso.

O Professor Valadares Tavares tem como hobby viajar, como comida preferida o peixe grelhado, como animal preferido a águia-real, o livro que nos sugere é a “mensagem” de Fernando Pessoa, o filme “O leopardo” e a principal qualidade que mais aprecia é a lealdade.

Senhor Professor, muito obrigado por ter aceite o nosso convite. Eu tenho o privilégio de lhe fazer a primeira pergunta, depois as outras serão dos grupos, e a pergunta não pode ser outra se não esta:

Numa Universidade como a nossa há uma acusação repetida de que há um défice de qualidade no sistema educativo português. A afirmação reiterada de que Portugal para ser um país competitivo no mundo global em que nos integramos, tem que ter uma estratégia mais inteligente de valorização dos seus recursos humanos, e há o diagnóstico de sempre, de que temos um falhanço total na política educativa em Portugal.

A pergunta como pontapé de saída é esta:

Há futuro para a educação em Portugal?

Minhas senhoras e meus senhores, connosco o Senhor Professor Doutor Luis Valadares Tavares.

(APLAUSOS)

 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
Bom, boa noite, boa noite a todos. Eu tenho imenso gosto de estar aqui, é assim como em família, aliás alguns de vocês já me aturaram como professor e como presidente do INA, e já não é a primeira vez que venho aqui, e gostava realmente, antes de mais, de felicitar o nosso reitor Carlos Coelho por esta excelente iniciativa. Este produto, este formato devia ser registado, realmente tem muito mérito, tem muito valor, e há poucas iniciativas deste tipo no nosso país.

Em relação à questão que me foi colocada, é uma questão incómoda porque eu sei que vocês tiveram um dia muito pesado, desde os impostos aos mandamentos do nosso amigo Marcelo Rebelo de Sousa, vocês hoje percorreram todos os problemas difíceis da sociedade e vão acabar este jantar, espero que duma forma pouco indigesta, apesar de todos os problemas que existem na educação.

De modo que eu vou tentar ser sintético, para depois ouvirmos as vossas questões que são mais interessantes que as minhas, sintético mas leal.

Há bocadinho o Carlos Coelho lembrava que realmente é a qualidade que eu acho que é mais importante é sermos leais uns para com os outros. E acho que devo ser leal para convosco na forma como falamos sobre educação.

E tem havido um conjunto de equívocos e de mal entendidos, e há bocadinho o Carlos Coelho lembrou, eu saí de director do planeamento há quase vinte anos, portanto, em 1988, e quando iniciei funções, havia a ideia no Ministério da Educação que nós tínhamos uma educação difícil, de modo que daí que havia muitos alunos que chumbavam, muitos alunos que desistiam, etc., mas de muita qualidade, ou seja, as pessoas sabiam muito.

E eu tinha a impressão exactamente oposta. E conseguimos uma coisa que na altura foi revolucionária, que foi Portugal participar num teste internacional de comparação de níveis de conhecimento dos alunos, nos doze anos e nos dezasseis anos, ou seja, iniciou-se aquela sequência de estudos que muitos de vocês conhecem, os Pisas, os estudos da IEA, etc..

E gostava de vos dizer que quando se iniciou esse processo, eu era vice-presidente do comité de Educação da OCDE, e a OCDE achou por bem iniciar esse projecto, eu fui um dos entusiastas, as reacções no país não podiam ser piores, muitos dos nossos políticos disseram “nem pouco mais ou menos, isso é muito perigoso, podemos chegar à conclusão que afinal de contas a nossa educação não é tão boa como isso”. Bom, os mesmos que há poucas semanas diziam que a educação era óptima, e foi um momento difícil, mas foi um momento que se conseguiu, Portugal participou, nessa altura o Ministro da Educação era Roberto Carneiro, o Primeiro-ministro era o Professor Cavaco Silva, apoiaram muito esta ideia e conseguimos. A boa notícia no nosso país é quando se consegue qualquer coisa depois é imparável, ou seja, nenhum outro ministro hoje teve coragem para dizer que Portugal deixava de participar. Se calhar alguns apeteceu-lhes muito fazer esse despacho, mas não ousaram, e portanto, isto é uma lição que eu gostava de vos deixar:

O nosso país é tão conservador que quando se consegue qualquer coisa, esse qualquer coisa mantém-se no tempo, portanto, é uma boa notícia.

E chegámos à conclusão que os nossos níveis de aquisição de conhecimentos eram muito baixos, os nossos miúdos dos nove anos, dos onze anos, os nossos jovens dos quinze sabiam pouco. E esta preocupação de objectividade naquilo que dizemos, e naquilo que fazemos e naquilo que falamos na educação, penso que é muito importante. Portanto, a partir dessa data, podemos dizer que, de facto, os resultados de aprendizagem do nosso sistema educativo são baixos, são dos que estão na cauda da União Europeia. Também é interessante dizer-vos, eu agora vou encher-vos de más notícias, mas depois vou deixar para o fim uma boa notícia, uma notícia muito boa para cada um de vocês, especificamente, mas isso é só no fim. Para já vamos começar pelas más notícias.

O que é interessante é que estes estudos, estas comparações fazem-se de dois em dois anos, anualmente, de três em três anos. E o que é que tem acontecido ao longo do tempo?

Melhorámos? Não. Piorámos? Também não, estagnámos. Mas há aqui um problema, é que os outros não estagnaram. Isso é que é terrível. Apetece-nos tentar convencer os outros Estados da União Europeia a estagnarem, pelo menos durante um ano, dois anos, três anos. Mas eles não se convencem disso. E temos tido casos fantásticos de evolução ao longo destes últimos dez, quinze anos. Por exemplo, o caso do Reino Unido, tinha algumas bolsas de níveis de desempenho muito baixos, conseguiram corrigir. O caso da Grécia, subiu vários pontos, o caso da Irlanda, que é o caso mais fantástico, que passou também de uma posição do fundo para uma posição intermédia. Ou seja, é possível mudar, é possível mudar, mas nós não temos mudado.

Se vocês olharem para a questão da participação, ou seja, das desistências, também temo-nos mantido mais ou menos estáveis. Para vocês terem uma ideia, há 18 anos atrás havia cerca de 120.000 nados vivos, 125, e apenas 30-40%, quarenta e poucos por cento atingem o fim do ensino secundário. Portanto, vocês estão aqui, do ensino universitário, já pertencem a uma fracção muito pequena dessa geração. Isto não é habitual, portanto, continuamos a ter muitas desistências e muitas repetências, especialmente no ensino secundário.

Alguns especialistas internacionais têm dito que devemos ser dos piores ensinos secundários a nível da União Europeia. Isso tem-se mantido assim.

O nosso ensino superior, em termos globais, como sabem também tem aumentado bastante. Aumentou bastante nos anos 90 o número de alunos, mas continuamos a ter índices de eficiência muito baixos, cerca de 40% não acabam os cursos, que é mau, é muito negativo. Ou seja, nós temos um problema, em educação temos dois problemas, só temos dois problemas: o primeiro problema é que este sistema educativo, esta oferta de educação é de qualidade muito fraca, globalmente falando.

É evidente que temos áreas de excelência, temos grupos excelentes, temos cursos óptimos, temos professores também muito bons, temos alguns alunos fantásticos, mas globalmente em média, os nossos indicadores são fracos e estão em estagnação.

Bom, esta é a realidade.

Qual é o segundo problema que temos em educação? O segundo problema, e portanto, eu tenho uma formação científica, gosto de demonstrar tudo aquilo que vos disse, portanto, disse-vos que a nossa educação globalmente é fraca e está estagnada e demonstrei-vos com indicadores. O segundo problema também vos vou demonstrar, não por indicadores, mas por um episódio recente. O segundo problema que temos em educação é que estamos conformados com esta educação má, ou seja, há uma atitude de conformismo em relação a esta situação.

E há um exemplo que eu gostava aqui de vos recordar. Aqui há tempos, um responsável político muito importante, na televisão, era entrevistado e perguntavam-lhe o que é que ele achava de haver erros nos enunciados dos exames. Como sabem é um dos problemas que o nosso país tem. Há países na Europa, onde haver um erro num enunciado acontece menos de uma vez em quinze ou vinte anos. No nosso país, há quinze ou vinte erros por ano. É uma situação anómala. E o entrevistador colocava essa questão, e o entrevistado respondeu : “é normal”. Mas o que ainda é mais espantoso é que no dia seguinte a comunicação social criticava, dizia mal em relação a várias questões, se havia questão que não discutia era esta, porque também achou normal. Estão a ver? Portanto, nós só temos dois problemas em educação:

Um é a oferta educativa ser fraca, o outro é nós acharmos normal que a oferta educativa seja fraca. Deixem-me dar-vos aqui o meu testemunho: eu sou professor convidado em universidades, tenho sido em universidades de países com níveis de desenvolvimento muito diferentes, sou professor convidado numa universidade nos Estados Unidos, mas também fui em Marrocos ou na Turquia. E o que diferencia muito os países, hoje em dia, é exactamente essa questão, é estarmos conformados ou não conformados com a situação que temos. E eu acho que cada um de vocês percebe o que eu estou a dizer, quer dizer, se cada um de nós quando acorda, olha-se ao espelho e diz “eu sou o maior, atingi a perfeição”, é natural que não tome nenhumas iniciativas de mudança ao longo do dia. O nosso país em relação a certas questões assumiu a necessidade de mudar, por exemplo, nos anos 90, assumimos a necessidade de passar a ter uma rede de estradas melhor, e mudámos essa rede. Nos últimos anos, assumimos, (vários partidos, o PSD, o PS), a importância de corrigir o défice público, e estamos a corrigi-lo. O défice da educação não foi ainda assumido como uma necessidade de mudança.

E portanto, o que estamos a fazer é aquilo que os ingleses chamam os “miner adjustments”. Corrigimos um sistema de promoção, corrigimos um concurso, aumentamos umas vagas aqui, mudamos um conteúdo acolá, complicamos isto, dificultamos aquilo, mas globalmente o sistema mantém-se como tal. Portanto, temos estes dois problemas. O que é que eu gostava de vos dizer?

Cada vez mais em educação, até porque nós estamos bastante atrasados, existem lições que nós podemos aprender noutros países. Deixem-me dizer-vos que eu acho fantástico como é que o nosso país de um modo geral tenta reinventar a roda. Eu fui durante 4 anos presidente do Instituto Nacional de Administração, e em todos os dias quase tinha que chamar à atenção que muitos dos problemas que nós tivemos ou nós temos na Administração Pública foram vividos pelos outros países nos anos 80. Temos uma vantagem fantástica, é que podemos ver o que é que correu bem e o que é que correu mal nesses países e não estar a reinventar a roda. Em educação, há a paixão por reinventar a roda. Por exemplo, fazem-se currículos de matemática. Mas porque é que eu hei-de fazer um currículo de matemática?

Há países avançadíssimos, com excelentes resultados, que já fizeram um currículo de matemática, portanto, eu não devo reinventar um currículo de matemática. O da História justifica-se porque temos uma História diferente, mas o da física também não. Esta ideia de que tudo tem que ser reinventado no país como se não houvesse o resto do mundo, e depois transformado numa lei, é realmente uma atitude provinciana no mau sentido do termo, e que tem prejudicado muito a educação. Portanto, vocês reparem: se nós efectivamente temos a vantagem de termos essas experiências no resto do mundo, que podemos estudar e podemos ver quais são as boas receitas, porque não dizê-lo? As boas soluções, temos que pensar, analisar, ver quais são aquelas que se adaptam melhor ao nosso país e aplicá-las.

Isso não é muito difícil, o que é difícil é a questão política. E deixem-me dizer-vos, eu agora cada vez aceito mais convites para intervenções em organismos políticos, porque o problema da educação está cada vez mais a ser um problema político, porquê?

Porque não é um problema de educação, é um problema de mudança política, é um problema de ruptura política, e essa é a questão fundamental. Nós não conseguimos mudar sem rupturas políticas em educação. Há dez anos que se demonstra isso, e portanto, não devemos continuar por este caminho. Agora vocês podem-me é dizer assim:

Ah, mas isso é muito incómodo, já temos outros problemas, já temos a questão da saúde, já temos a questão do défice, então continuamos com os maus resultados que temos.

Se assumirmos esse desafio político, e reparem, o PSD é um partido que se forjou muito em torno de um projecto de mudança política. O nome de Francisco Sá Carneiro está associado a grandes rupturas políticas no nosso país, e, portanto, ou assumimos a necessidade de introduzirmos essas rupturas, ou continuamos com uma situação de estagnação.

Mas para sermos objectivos, deixem-me dar-vos dois exemplos concretos de ruptura política noutros países, e que também são difíceis:

O caso de Inglaterra: tínhamos alguns municípios com escolas com mau desempenho. O que é que o governo do Senhor Tony Blair fez?

Deu apoios, e ao fim de um ano de dar mais apoios, os resultados continuaram péssimos, exactamente como acontece connosco. E qual foi o passo seguinte?

O passo seguinte foi exonerar aquelas comissões directivas daquelas escolas, e abrir concursos públicos e contratar outras instituições para fazerem a gestão daquelas escolas. É uma ruptura, é incómodo, é evidente que suscitou imensos protestos, levantou imensas objecções, mas passados três anos, aquelas escolas tinham níveis muitíssimo melhores daqueles que tinham antes.

Vou-vos dar outro exemplo: Nova Iorque

Nova Iorque é uma cidade fascinante, alguns de vocês conhecem, outros não, tem dez milhões de habitantes, e tem um milhão de alunos, e também tinha problemas e tem problemas de má qualidade do ensino em certas zonas, designadamente ali naquela zona de Brooklyn, tem uma série de bolsas de níveis de desempenho baixos, muito especialmente na área das tecnologias e das matemáticas. O actual Mayor começou por tomar duas decisões: a primeira foi demitir a comissão de educação que tinha. Como sabem, a educação básica e secundária nos Estados Unidos é competência municipal, e, portanto, é o município de Nova Iorque que tem essa responsabilidade, demitiu a comissão, nomeou um responsável único, e lançou um projecto que se chama “The teacher project”. O que é que é esse projecto?

Esse projecto é o seguinte:

Vão às empresas, informática, tecnologias, etc., e convida profissionais dessas empresas a durante um ano dedicarem-se ao ensino básico e secundário. Pessoas que nunca fizeram ensino, eu tive o privilégio por exemplo de ter uma reunião com um engenheiro informático da HP, nunca tinha estado numa escola a ensinar, aceitou o desafio, tem um curso, não é muito mais longo do que este que vocês têm aqui, são umas semanas, e depois desse curso vão ensinar para as escolas. E ao fim de um ano, verifica-se quais são aqueles que têm mais vocação, quais são aqueles que estão mais interessados e têm a possibilidade de optar por essa carreira com um complemento remuneratório da empresa. E está a ser um enorme sucesso. Vocês reparem que isto é abrir a escola à sociedade, é reconhecer que no domínio das ciências, das tecnologias, podemos ter especialistas óptimos na sociedade civil sub-utilizados. Como sabem, muitas vezes hoje em dia as empresas têm excesso desses profissionais. Em vez de se reformarem antecipadamente, alguns até são reformados antecipadamente, mas aproveitamo-los para o ensino.

Agora reparem, isto implica ruptura política, com quê?

Com a ideia de que os professores são uma torre, um cilindro blindado que não pode ser atravessado por nada.

De modo que gostava de vos dizer o seguinte:

Eu penso que, realmente por muito que tenha sido, e é com certeza, o talento e o apreço que eu tenho por todos os responsáveis pelas políticas educativas, porque é realmente uma tarefa extremamente ingrata, e temos tido pessoas dedicadíssimas e interessadíssimas, mas muito especialmente nos últimos dez anos, a educação não melhorou, nem no ensino básico e secundário, nem no ensino superior. Depois a longo das vossas questões, também podemos falar mais sobre o ensino superior.

Se nós quisermos melhorar, não é muito difícil saber quais são as boas práticas, agora isso implica mudança política. E é por isso que eu deixava-vos aqui um repto:

Todos vocês de uma forma ou de outra estão interessados na actividade política. Daqui a dois anos vamos ter eleições, a elaboração dos programas com que cada partido se apresenta é o momento ideal para propor essas rupturas. Em vez de desenharmos aqueles cenários cor de rosa a dizer que vamos andar todos mais satisfeitos, mais saúde, mais assistência social, evidentemente menos impostos, como aliás se tem visto, em vez de fazer esse tipo de discurso cor de rosa, devemos propor mudanças concretas. Eu pessoalmente estou convencido que há um número muito importante de portugueses que não têm opiniões radicais nem extremadas em termos políticos, mas são a favor da introdução dessas reformas, dessas rupturas em termos políticos. Isso vai permitir relançar a educação. E portanto, eu estou convencido que, se os outros países conseguiram, nós também vamos conseguir.

Qual é a boa notícia que eu também gostava de vos deixar aqui hoje?

Alguns de vocês participaram num jogo que fizemos no Instituto Nacional de Administração, entre governo e oposição, em torno da preparação, da discussão e do debate sobre o orçamento de Estado. A partir desse jogo, eu e mais uns colegas, designadamente, o Professor Fernando Pacheco, de economia da Universidade Católica, elaborámos um jogo que se chama “play Gov”. O que é que é esse jogo? É gerir melhor o país, como vocês já se devem ter apercebido que o país pode ser melhor gerido. Esse jogo vai ser lançado com o jornal Público a partir de 15 de Setembro, numa modalidade que é semelhante à dos jogos de gestão, portanto, vocês têm equipas, podem-se inscrever, temos a possibilidade de oferecer as inscrições. Neste primeiro ano há um conjunto de equipas, e cada um de vocês pode fazer evoluir o mesmo país ao longo de uma legislatura, de modo a chegar ao fim da legislatura numa situação mais vantajosa. “Play Gov”, portanto, é a novidade deste ano. Se vocês quiserem continuar com este ímpeto de juventude política que estão aqui a ter na universidade JSD, não deixem de participar.

E agora estou à disposição das vossas questões e perguntas.

(APLAUSOS)

Dep. Carlos Coelho: - O Professor Valadares Tavares deixou-nos um power point que não é utilizável neste contexto, pelas razões que conhecem aqui na sala, mas que em qualquer circunstância estará disponível na intranet, e portanto, podem lá ir e fazer o download, aqueles que quiserem ficar com cópia.

Vamos agora entrar na fase das perguntas, em grupos de duas, e o primeiro grupo será o grupo laranja, Teresa Graça Moura, e pelo grupo cinzento, Andreia Barreira.

 
Teresa Graça Moura
Muito boa noite a todos. Eu gostaria de começar por lhe agradecer em nome dos alunos da Universidade de Verão, o tempo que se dispôs a conceder-nos hoje à noite.

E em segundo lugar, a pergunta do grupo laranja é se acha que hoje em dia faz sentido integrar os alunos com necessidades especiais de aprendizagem em turmas com alunos sem dificuldades desse foro? Ou seja, se é uma medida eficaz de integração, se atrasa o progresso dos restantes alunos e se os professores estão preparados para lidar com essa situação? Obrigada

 
Andreia Barreira
Boa noite a todos, em especial ao Professor Valadares Tavares. Antes de mais, o grupo cinzento quer agradecer a sua presença neste jantar, e felicitá-lo pela bela escolha que fez no que toca ao livro que nos aconselhou a ler. De facto, Fernando Pessoa, tal como defendeu o grupo cinzento, é e sempre será o grande português de sempre.

(APLAUSOS)

 

(Um minuto inaudível)

 

(...) sua pátria, pela possibilidade de alcançar a realização profissional.

Este ano, um novo record foi atingido, por exemplo, só em Santiago de Compostela entraram em medicina 50 alunos, enquanto que no ano passado, apenas três.

Assim, na sua opinião, considera que o sistema de ensino superior português está a dar as devidas oportunidades aos nossos jovens, ou estaremos a desperdiçar talentos nacionais? Obrigada

 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
São duas questões muito interessantes.

Em relação à educação especial e ao ensino especial, eu julgo que nós temos que ter em conta o seguinte:

Há níveis muito diferentes dos problemas das deficiências que efectivamente cada um de nós tem. De certa forma, todos nós temos deficiências, e portanto, há um espectro muito amplo. Em muitos casos, eu julgo que a solução da integração pode ser uma boa solução, e o que temos é que realmente dar preparação aos professores para serem capazes de lidar com grupos heterogéneos. Isso é um défice que eles têm muitas vezes. O professor tem muita dificuldade de gerir uma turma com grandes diversidades, e portanto, deve-se-lhes dar preparação nesse sentido. Mas é possível. É evidente que depois temos aqueles casos de deficiência muito acentuada que podem exigir ofertas educativas muito segmentadas. Mas deixem-me contar-vos por exemplo uma experiência que nós temos tido no INA. Há um concurso nacional para participar num curso que dá acesso à função pública, que é o CAJP, temos aqui aliás, um dos diplomados nesse curso. Temos tido sempre pessoas que têm deficiências profundas, por exemplo, são invisuais, e temos conseguido que eles participem no curso, na mesma turma, de uma forma perfeitamente harmónica, eficaz e eficiente, porquê?

Porque sabemos gerir essa diversidade. Portanto, eu diria que na generalidade dos casos é possível e é desejável essa solução, desde que os professores estejam adaptados. Se depois tivermos situações extremas de deficiências muito profundas que exigem canais educativos muito especiais, esses têm que ser segmentados.

Em relação à questão do ensino superior, eu devo dizer que não acho nada mal que haja 50 portugueses em Santiago de Compostela. Posso é achar mal que não hajam 50 espanhóis de Santiago de Compostela aqui connosco a estudar. Acho que é bom e é desejável cada vez mais os nossos jovens irem estudar para o estrangeiro, eu também fui e penso que é muito benéfico, é muito vantajoso. Agora, também temos que ter fluxos equilibrados e temos que ter alunos estrangeiros a estudarem nas nossas instituições e nas nossas escolas.

Bolonha ao criar um momento de circulação internacional a seguir ao primeiro ciclo, a seguir aos três anos, permite que haja uma mobilidade e uma competição muito grande a esse nível. Isso foi desejado muito especialmente pelas grandes instituições universitárias europeias, desde o Imperial College, à Universidade de Berlim, porquê?

Porque estão convencidos que vão captar os melhores alunos para o segundo ciclo. Há aqui um problema de competição. Nós temos que ser capazes de também captar alguns desses melhores alunos para os nossos segundos ciclos, e aí é que temos que ser capazes de mostrar que esse aluno ao escolher uma escola nossa tem as mesmas probabilidades de sucesso e de integração na vida profissional do que se escolher Paris ou se escolher Roma. Vamos ter exigências muito mais competitivas para a qualidade do nosso sistema de ensino. Agora haver mais portugueses em Espanha, confesso que acho muito bem, aliás, tem a vantagem de haver mais convívio ibérico, eu acho que é muito simpático. A minha geração foi uma geração em que havia um receio e um afastamento muito grande relativamente a Espanha, e eu sempre achei mal. Uma das primeiras actividades que tive como dirigente associativo no Técnico foi ir fazer uma intervenção à Associação de Estudantes, das universidades de Madrid e foi uma intervenção bastante animada, eu tentei falar no melhor espanhol que consegui e depois no fim, os meus amigos espanhóis gostaram muito e disseram-me que quando os portugueses falavam o português como eu falava até percebiam completamente tudo o que eu tinha dito, portanto, foi uma experiência que eu gostei muito e acho que devemos ter mais ligações com Espanha.

 

Dep. Carlos Coelho: - Vasco Campilho, grupo roxo, que é o grupo da casa, a quem quero agradecer o facto de terem sido nossos anfitriões e a companhia que nos fizeram durante o jantar, e depois, Joana Aranha do grupo rosa.

 
Vasco Campilho
Boa noite. Somos nós que agradecemos a vossa presença, a presença do Professor Doutor Luís Valadares Tavares aqui na Universidade e a oportunidade de os termos acolhido aqui nesta mesa da presidência.

Antes de fazer a pergunta do grupo roxo, queria só partilhar uma pequena história muito curta, relativamente aquilo que falou de não reinventar a roda. Por razões pessoais, a minha mãe é professora do ensino básico e encontrou-se em Bruxelas durante vários anos a dar apoio escolar a pessoas de várias nacionalidades, e descobriu por exemplo uma coisa que eu acho fundamental, que é que Portugal e a Grécia são os dois únicos países da Europa onde ainda se ensina a fazer contas empinadas no papel. Em todos os outros países ensinam-se logo a partir da segunda classe métodos de cálculo mental, que fazem com que as pessoas mais tarde, qualquer pessoa, quer seja de ciências ou de letras tem uma facilidade muito maior com a matemática do que nós. As coisas jogam-se logo na segunda classe e isso é uma coisa que nós não precisávamos de inventar, era só ir buscar métodos de cálculo mental e começar a aplicá-los na escola desde a primária. E agora passo à pergunta, que é uma pergunta que não é directamente sobre educação, mas sendo o Professor Luís Valadares Tavares um Ex-Presidente do INA –Instituto Nacional de Administração, gostava de lhe perguntar, visto que saiu recentemente desse cargo, que balanço faz dessa passagem pelo INA. Conhece muito bem a nossa administração, os seus recursos humanos e os desafios que há de qualificação da administração, eu gostava de lhe perguntar se estamos a conseguir travar a batalha do aumento das qualificações na Administração Pública e que novas medidas para o futuro, nomeadamente a nível do maior envolvimento das universidades também nessa grande batalha pela qualificação da Administração Pública Portuguesa? Obrigado.

 
Joana Aranha
Boa noite Senhor Professor. Como o currículo que nos foi dado a conhecer, não nos deixa mentir, tem uma vastíssima obra que se dedica à área da Administração Pública. Os esforços que o governo socialista na área da modernização da Administração Pública conduziu o país a uma revolução apelidada por muitos como uma perda de direitos adquiridos e algumas injustiças sociais.

A nossa pergunta é neste sentido:

Que simplex sugeriria o Senhor Professor para minimizar estes danos colaterais? E que paliativo se lhe afigura como mais razoável para fazer frente a alguns sectores moribundos? Muito obrigada

 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
Sim senhor. Então temos aqui duas questões da área da gestão pública. Bom, para já, deixem-me dizer-vos o seguinte:

Eu tenho dado aulas num MBA da Universidade Católica desde há muitos anos, desde os princípios dos anos oitenta, e ajudei o Professor Alfredo Sousa (como sabem faleceu, era Professor de Economia da Universidade Nova), a lançar o primeiro MBA em 81.

E devo-vos dizer que desde o início dos anos oitenta no nosso país, portanto há 27 anos, temos tido imensas iniciativas: MBA’s, cursos de Gestão, executivos, pós-graduações, etc., que têm vindo realmente a criar uma cultura de gestão empresarial, e muitas das empresas que hoje em dia têm sucesso no nosso país são conduzidas por pessoas que efectivamente receberam essa formação, que é uma história que já tem 25 anos. Desde as cervejas aos sumos, desde os cimentos às energias, vocês encontram essas pessoas, e essas pessoas têm uma cultura de liderança, uma cultura de novas ideias, de inovação, de gestão empresarial, de geração de valor para o consumidor que tem alterado no nosso país, e o nosso país é o que é hoje em dia, não devido àqueles sectores que receberam mais apoios nos anos 90, como os têxteis, que estão na situação que vocês conhecem, mas graças a essa capacidade empresarial que se foi desenvolvendo.

O que é que aconteceu na Administração Pública?

Aconteceu o seguinte: esses cursos de gestão, de novas ideias, liderança, gestão por objectivos, não começaram em 1980, desculpem-me a imodéstia, mas comecei-os eu em 2004 no INA. Estão a ver? 24 anos de atraso, 24!

O primeiro curso de alta direcção na Administração Pública, que é no fundo, aquilo que os americanos chamam o MPA, o “Master and Public Administration” começou em 2003-2004. E comecei em 2003-2004 sem a lei, nessa altura era Ministra responsável pela Administração Pública a Dra. Manuela Ferreira Leite, e era Primeiro Ministro o Dr. Durão Barroso, e os processos de legislação são sempre complicados e pesados, e a lei ainda não tinha sido aprovada. A lei só veio a ser aprovada em Janeiro de 2004, e eu iniciei o curso em Outubro de 2003. Isso valeu-me uma acusação do Dirigente Sindical ao Primeiro-ministro a dizer que o Presidente do INA tinha começado os cursos depressa demais, e o Dr. Durão Barroso, como sabem uma pessoa com muito sentido de humor, respondeu dizendo que era a primeira vez que tinha recebido uma crítica dizendo que a Administração Pública tinha sido rápida demais.

De facto, não estávamos a ser rápidos demais, porque começámos com 24 anos de atraso. Bom, depois felizmente saiu a lei em Janeiro e correu tudo bem.

Portanto, reparem, há aqui um défice. Estou a acabar de escrever um livro que deve ser publicado proximamente e ao fazer essa pesquisa bibliográfica, reparem, o relatório principal de gestão por objectivos na Administração Pública, por exemplo, no caso inglês, é de 1969. A primeira vez que aparece no discurso oficial do nosso país, a gestão por objectivos na Administração Pública é de 2004, pela pena da Dra. Manuela Ferreira Leite e da Dra. Susana Toscano, que era à data Secretária de Estado da Administração Pública.

Portanto, nós temos que ter presente que houve aqui um atraso. Vocês podem dizer : “bom, mas isto comparado com a História da humanidade, com os milhões de anos que nos separam do jurássico, não é nada”, 20 anos realmente não é nada, mas a nível das nossas vidas é muito, e portanto, nós não podemos querer que, subitamente, o sistema mude, isto tem o seu timing, tem os seus processos de transição. Agora, as questões que me puseram são muito interessantes. Em relação ao capital humano, esse é o problema fundamental. O problema fundamental da nossa Administração Pública é, efectivamente, um défice muito grande de capital humano, ou seja, há muitas pessoas mas pouco qualificadas. Houve muitas pessoas que foram contratadas com níveis de qualificação muito baixos, e até isso leva depois a que seja muito difícil, por exemplo, que aceitem, aquelas ideias por exemplo de avaliação de desempenho. Se vocês forem estudar as reformas da Administração Pública de Pequim ou de Washington, são iguais: tem que haver gestão por objectivos, tem que haver avaliação de desempenho, e depois tem que haver compensação do mérito. Isto é common sense, não vale a pena reinventar a roda, e portanto, essas ideias mesmo são muitas vezes difíceis de aceitar.

Deixem-me contar-vos um episódio interessante que eu tive no Porto (podia ter sido noutra cidade, também tive outro semelhante em Lisboa), em que se discutia com dirigentes o problema da avaliação, e expliquei que uns teriam classificações mais elevadas, outros menos elevadas, a certa altura há um Sub-Director Geral que me diz assim:

“Oh Professor, olhe nós gostamos muito de o ouvir, o senhor até quase que nos convenceu, bom, mas há aqui uma questão, nós não nos importamos de ser avaliados, mas veja lá se arranja um sistema em que estejamos todos acima da média”.

Bom, isto de facto, não é possível, não é? Já devem com certeza ser como eu, espectadores assíduos dos Simpsons. Há um episódio dos Simpsons em que justamente na escola do Bath se pretende que todos os alunos tenham nota acima da média. Bom, realmente não é possível, porque para haver média tem que haver uns abaixo e depois tem que haver outros acima. Portanto, vocês reparem, há aqui um problema de cultura, de mudança de atitudes, de mentalidade. A formação, é evidente que é um objectivo fundamental, e é por isso que aqui o Vasco tem toda a razão quando diz que as universidades neste momento deviam estar a fazer mais formação em gestão pública. Mas isso depois também devia estar associado a um esforço de renovação da administração, que é substituir pessoas menos qualificadas por outras mais qualificadas, porque senão as pessoas não vão fazer cursos porque sabem que depois não têm emprego, portanto, tem que haver aqui renovação.

Chegamos assim à segunda questão.

Bom, mas é que isso causa problemas. Há pessoas que perdem direitos, há outros que são prejudicados, portanto, não há transformações sem dor, isso é verdade. Agora temos é que ser capazes de fazer essa gestão duma forma em que se respeite muito cada pessoa, os seus direitos, as suas opções, e oferecer oportunidades a essas pessoas. Deixem-me aqui contar-vos por exemplo o caso do Canadá, que é muito interessante. O Canadá curiosamente também tinha uma Administração Pública em alguns casos com níveis de qualificação muito baixos, e o que o Canadá fez foi muito simples: foi dizer a essas pessoas “olhe, tem duas hipóteses: ou aproveita uma oportunidade de formação que lhe vamos dar, investe tempo, paciência, estuda, ganha outras competências, e nós acolhemo-lo de braços abertos, vai ter novas funções, melhor remuneradas, mais motivadoras, ou, oferecemos-lhe uma pensão de reforma antecipada, que não é o seu vencimento, habitualmente andava na casa dos quarenta por cento e vai para casa, e vai fazer o que quiser, pode ter uma actividade comercial, pode tratar dos seus netos, pode fazer outra coisa qualquer”. E foi um sucesso. E neste momento a Administração Pública do Canadá é uma Administração de referência em muitos aspectos, ou seja, temos de ser capazes de fazer a gestão desse processo de mudança duma forma que se atinjam os objectivos e se respeite o mais possível as opções de cada pessoa. Agora se a pessoa diz: “eu não tenho formação, eu sou um inútil, eu não quero aprender, eu não quero mudar, mas quero que vocês considerem que eu sou inamovível até ao fim dos tempos”, bom, isso é pouco aceitável, é dificilmente aceitável, e em muitos casos causa muitos problemas às organizações. A minha mulher trabalha, é professora da área de sociologia e de gestão de recursos humanos, e eu aproveito muito as leituras que a vejo sempre a fazer, que é um bom exemplo, quando vocês se casarem, alguns poderão até já ser casados, devem fazer bastante esse cross culture fertilization. E os livros que ela estuda, por exemplo, sobre a gestão da mudança, insistem sempre numa nota que eu acho que é muito interessante, que é isto: de um modo geral, nós não temos medo da mudança, nós temos medo da transição, da viagem que vai ser necessária para essa mudança, e isso é muitas vezes assim.

E, portanto, o pior que há é por exemplo deixar as pessoas sem informação, o pior que há é criar ansiedade. No INA, houve um determinado período em que todos os dias apareciam os boatos mais fantásticos, e os funcionários acreditavam, todos os dias. Houve um dia que eu dizia: “olhe, já sabem a última notícia que veio do Gabinete do Primeiro-Ministro? Vou-vos dizer: todos nós afinal não existimos, estamos no second life, e afinal não existimos”. Bom, portanto, esses climas de ansiedade, esses climas de não informação é que são realmente péssimos.

Temos de ser capazes de fazer essa gestão bem, o que exige processos de comunicação muito eficazes e muito eficientes que nós não temos.

Agora, deixem-me dizer-vos o seguinte:

Eu sou a favor de reformas radicais na Administração Pública. Porquê?

Por uma razão muito simples. Porque a Administração é alimentada por dinheiros públicos. Como sabem o país não reduziu as suas despesas públicas. Vocês hoje devem ter discutido isso à exaustão. O nosso país continua a ter, salvo erro dos 48% do PIB de despesa pública. Eu acho errado, acho muito mal, acho que devíamos ter muito menos, e portanto, para nós reduzirmos a despesa pública, devemos centrar a Administração apenas naquilo que se traduz em quê? Em mais-valia oferecida aos cidadãos, o resto não acho que seja razoável. Isso é difícil, pois é, mas voltamos à tal questão das rupturas. Até agora, nós em termos de Administração Pública, não tivemos ainda rupturas políticas, por muito que pese. Temos tido ameaças, temos tido dificuldades, temos tido mudanças, mas não propriamente rupturas, e se continuarmos assim, nós não vamos reduzir a despesa pública em percentagem do PIB, o que em meu entender é um erro.

 

Dep. Carlos Coelho: - Jorge Miranda, grupo verde e depois, Afonso Fontoura do grupo amarelo.

 
Jorge Miranda
Boa noite. Antes de mais, gostaria de agradecer a presença do Professor Valadares Tavares aqui neste jantar. Bem, eu tenho duas questões muito simples:

A primeira é a seguinte: existem como todos sabem cada vez mais professores licenciados que saem cá para fora e não são colocados. Eu gostaria de saber, na sua opinião, quais seriam as soluções para esse problema?

E a segunda é a seguinte:

O sistema de classificação dos professores está ou não está bem feito?

 
Afonso Fontoura
Ora muito boa noite. Boa noite ao Professor Luís Valadares Tavares.

Como sabemos, actualmente em Portugal impera uma cultura de facilitismo no ensino básico. E a nossa pergunta é a seguinte:

Até que ponto é esta cultura positiva, e se não for positiva de todo, como podemos terminá-la? Muito obrigada

 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
Bem, são duas questões muito saudáveis, e acho que são realmente muito interessantes. Reparem, a questão dos professores, todos aqueles licenciados que formamos a pensar que vão ter actividades educativas, e depois ficam no desemprego, é talvez uma das expressões mais evidentes do que é a desarticulação entre o ensino superior e a sociedade. O nosso ensino superior tem áreas de excelência, tem professores óptimos, tem alunos óptimos, mas globalmente é um sistema de ensino que se preocupa pouco com a sociedade, e portanto, há muitos cursos que foram inventados porque os professores gostavam daqueles assuntos, fizeram doutoramento naquele tema e portanto, voltaram e acharam interessante abrir aquele curso. Há muito pouca preocupação de analisar a relevância, do emprego associado a cada curso, e em muitos casos até se acha que a universidade não deve fazer isso. Eu estive uma vez num debate na Universidade de Coimbra entre a Associação de Estudantes e um conjunto de professores, (depois vim a perceber que havia um conflito bastante grande entre eles porque de vez em quando voavam objectos por cima da minha cabeça), mas em que fundamentalmente era isso, porque os professores diziam: “nós não somos uma agência de emprego, e portanto, a nossa vocação, a nossa função é ensinar bem os assuntos, depois se vocês ficam todos no desemprego ou não, é um problema vosso”.

Esta é uma concepção errada de universidade. O ensino superior tem que se preocupar com as necessidades da sociedade. Eu vou-vos dar um exemplo muito concreto: Eu estive uma vez numa reunião de jovens, numa entidade da cidade de Lisboa, e em que vi 15 jovens licenciados, uns em direito, outros em matemática, outros em arqueologia, e todos eles estavam no desemprego há mais de três anos. Eu achei essa situação inaceitável, e desenvolvemos um projecto na Universidade Católica, que foi um curso de três meses destinado apenas a licenciados no desemprego há mais de dois anos. E o que é que nós ensinávamos nesse curso?

Instrumentos úteis à vida das empresas. Ensinávamos por exemplo, a utilizar bem o Access ou o Excel, a fazer actas das reuniões, a ajudar nos processos de comunicação interna, a fazer a gestão de algumas actividades. E esse curso teve três meses de duração. E vocês acreditem ou não, mas passado dois meses depois do curso acabar, esses jovens estavam todos empregados. Isto passou-se, foi antes de eu ir para presidente do INA, portanto, deve ter sido em 2001-2002. Ou seja, não é verosímil que em licenciaturas às vezes de quatro, cinco, seis anos, (vocês gostam imenso das escolas e portanto, muitas vezes prolongam as estadias bastante mais do que seria imaginável), não é verosímil que não seja possível em três meses ensinar um conjunto de matérias que sejam realmente úteis às pessoas. Aliás, essas matérias deveriam ser ensinadas no ensino secundário. Os miúdos do ensino secundário, os mais jovens acham imensa piada a aprender o excel e vão ser utilíssimos a começar por casa, porque se calhar passam a fazer a folha de excel da gestão das contas bancárias e das electricidades, etc., e os pais pensam “finalmente o meu miúdo aprendeu qualquer coisa de útil na escola”. Não há motivo nenhum para que nas escolas e nas universidades não se ensinem assuntos úteis. Podemos é dizer que nalguns casos os professores não sabem, mas reeducam-se, vão para um processo de reeducação, aprendem. Nas nossas escolas a certa altura ensinava-se o lotus, quando já não havia lotus, o lotus 123, como sabem a certa altura estava em competição com o excel, mas perdeu e a certa altura desapareceu, e nós fomos o único país do mundo em que continuava-se a ensinar Lotus. É uma coisa realmente extraordinária, essa questão da relevância. Eu acho que se devia publicar anualmente o número de licenciados de cada curso e de cada escola que estão inscritos no desemprego, para que o jovem quando se inscreve num curso no ensino superior saiba qual é o seu destino. Eu não tenho nada a ideia de que as pessoas só devem fazer engenharia, ou só devem fazer gestão, eu acho que uma pessoa que realmente tem uma grande vocação para a arqueologia deve fazer o curso em arqueologia, agora o que não é lógico é ir fazer arqueologia só porque não tem matemática, isso é que já não, isso é um défice do nosso sistema educativo. Essa informação por exemplo do desemprego devia existir, existem essas estatísticas, porque é que não são divulgadas? Porque não há coragem política, é tão simples como isso. Porque ainda não tivemos um governo e um ministro que dê um murro na mesa. Deixem-me contar-vos isto que é um caso que eu vivi muito: o problema de conhecermos os resultados das escolas no 12º ano, uma coisa trivial. Durante anos e anos, os ministros da educação recusavam-se a divulgar esses dados. Teve que haver um movimento cívico em que eu terei dado alguma participação, mas que teve sucesso graças a jornais como o Público, consegui que se divulgassem esses resultados, depois vieram a ser conhecidos pelos “rankings”. Não eram divulgados. Houve um ministro da educação, no final dos anos 90, escreveu pelo seu punho ao Conselho Nacional de Educação, que nunca aceitaria que o próprio Conselho Nacional de Educação conhecesse esses dados.

Isto é patológico. Porquê?

Porque havia a ideia de que conhecer faz mal às escolas. Não sei até como é que temos bandeiras azuis nas praias, porque aquelas que não têm bandeira azul, imagino também que seja prejudicial para o comércio da praia. Estão a ver? Portanto, esta questão da informação é fundamental.

Se nós passarmos a ter os níveis de informação adequados, eu não tenho dúvidas nenhumas que aquelas pessoas que vão para cursos orientados para actividades educativas, são aqueles que correspondem às necessidades do país, e que são menos do que os actuais. Mas há muitas actividades que deviam ser feitas e que não são feitas.

Vou-vos dar um exemplo muito concreto: nós temos uma taxa de repetência escandalosa no 12º ano, portanto, o jovem entra em derrapagem 10º, 11º e 12º.

Porque é que nós, com algum excesso de professores que haja, não organizamos cursos intensivos de recuperação para o 12º, designadamente durante o verão? Se temos professores disponíveis, se temos alunos à espera de conseguir passar, porque é que não fazemos isso?

Nunca, nunca se fez. Portanto, o problema do emprego dos professores é um problema que é resolúvel, como todos os outros, mas não escamoteando a informação, isso não. Estamos a enganar os nossos jovens.

Agora, o outro problema, que obviamente é muito simpática a intervenção que vocês fizeram, sobre a questão de facilitismo, vocês têm de compreender o seguinte:

Não é a vossa geração, mas o país viveu realmente uma revolução e viveu um período muito complicado. Eu tenho amigos que eram professores do ensino básico e secundário, e nos anos 70 quando os encontrava, eles falavam-me que o seu grande objectivo era implantar a democracia na turma. Bom, é uma coisa tonta, que não tem razão nenhuma de ser, a turma não deve ser democrática, a turma deve ser eficaz. Eficácia o que é? É acolher bem as pessoas, dar muita atenção a cada jovem para que ele evolua da melhor forma, portanto, não é um problema de democracia, é um problema de boa qualidade do ensino, e portanto, essa cultura traduziu-se muito em facilitismo.

Vocês têm toda a razão. Há uma frase que eu muitas vezes escrevo quando quero ensinar um assunto mais chato, mais pesado, eu costumo usar essa técnica de pôr essa frase que é: “escola fácil = vida difícil, escola difícil = vida fácil”.

Na nossa escola, de facto, criou-se muito a ideia do facilitismo, e não é só o facilitismo, é o caos, a desordem. Se vocês repararem por exemplo nas nossas escolas secundárias, se uma pessoa estiver próximo da porta de saída de uma das turmas, quando dá o toque, aquilo é como se fosse, de facto, uma torrente de água que passa por cima das pessoas, quer dizer, é uma confusão. As escolas devem ser disciplinadas, deve haver ordem, deve haver disciplina, e deve haver muito trabalho activo. Eu julgo que nas nossas escolas, pedem-se muito poucos exercícios activos aos alunos, pode ser fazer uma redacção, um essay, pode ser fazer uma peça de teatro, pode ser fazer um estudo, pode ser fazer uma crítica, isso pede-se muito pouco. Eu só tive uma experiência de ensino básico, já agora vou-vos contar porque para mim foi uma experiência muito importante:

Eu era aluno, estava a fazer o mestrado numa universidade inglesa, e um dos meus colegas era professor, dava aulas numa escola básica, e ele adoeceu, e eu fui substituí-lo durante duas semanas, e percebi porque é que aquele ensino funcionava bem. Uma das coisas que se fazia aos miúdos muito pequeninos, na casa dos 7, 8 anos, era pedir-lhes que eles fizessem, praticamente dia sim, dia não, um essay, uma apresentação, uma descrição, uma redacção, e depois eles liam e eram eles que corrigiam uns aos outros e depois havia um concurso e havia uma competição. As nossas escolas não fazem nada disto, as nossas escolas são ainda escolas muito passivas, e portanto, a ideia do facilitismo é realmente um mal, deve ser combatido, mas deve ser combatido numa lógica de proactividade, ou seja, não é estarmos mais tempo a desenvolver uma atitude passiva ou de memorização, é suscitar mais uma atitude activa, mas activa correcta em relação a objectivos como há bocadinho se falava, por exemplo, da conceptualização do cálculo. Vocês sabem que no nosso país no ensino secundário, continua a haver a psicose das máquinas de calcular? Qualquer dia eu estou convencido que empresas como a Texas vão ter modelos que só se vendem nas nossas escolas de ensino secundário. Já não se vendem em nenhum sítio do mundo, porque as pessoas ou fazem cálculo mental ou usam o computador, e, portanto, aquela psicose de cada aluno ter a sua máquina com muitos botões, etc., é realmente também uma coisa lusitana. Se forem a Espanha já não têm. Portanto, a ideia do facilitismo deve ser realmente combatido, mas deve ser combatido de uma forma proactiva, envolvendo o jovem, o aluno, em actividades dentro da escola e actividades fora da escola.

 

Dep. Carlos Coelho: - Grupo encarnado, Carlos Carvalho e, depois Tiago Borga do grupo azul.

 
Carlos Carvalho
Bem, começo por cumprimentar a esposa do Professor Luís Valadares Tavares, que também o acompanha nesta missão hoje, portanto, por parte do grupo encarnado, o nosso obrigado também pela sua presença.

Senhor Professor, ilustre Reitor, restante staff, caros colegas de todos os grupos, convidados, imprensa se houver por aí, muito boa noite a todos.

A verdade é que concordando com aquilo que o Professor disse da necessária intervenção da política para melhorar a educação, é prova esta Universidade de Verão que também é preciso muita intervenção da educação na política.

Professor, partindo para a pergunta deste grupo, o grupo encarnado, aquilo que lhe queríamos mesmo perguntar é:

No âmbito da crescente globalização, no âmbito do abrir de fronteiras, no âmbito de um aluno que hoje vê não com dificuldade a partida para Espanha, mas sim como quase uma obrigação a partida para qualquer parte do mundo, o que tem o ensino em Portugal que fazer para melhorar a competitividade do recém-licenciado ou recém-mestrado, recém-doutorado para melhorar a sua competitividade com os restantes alunos de qualquer parte do globo, principalmente naqueles países que estão na ponta da cabeça e não na ponta da cauda como está Portugal?

Muito obrigado.

 
Tiago Borga
Olá boa noite. Nós aderimos ao processo de Bolonha, no entanto não houve o acompanhamento em termos de equipamento nas áreas tecnológicas. Como vê este problema?
 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
Eu acho que é realmente, as vossas questões são muito saudáveis e mostram que nos próximos anos vamos com certeza ter aqui uma geração de portugueses mais esclarecidos.

A questão da competitividade é talvez a questão principal. Ainda há pouco tempo numa reunião de educação na Fundação Gulbenkian (costumam fazer todos os anos uma reunião mais ou menos repetindo os mesmos assuntos), havia um especialista em ciências educacionais, que alguns de nós chamamos ciências ocultas, que dizia “não deve haver bem objectivos, os professores, os alunos encontram-se e vão descobrindo os seus trajectos educativos”. Eu acho que é um disparate, a menos que tenhamos pais ricos, como diz o anúncio do BES: (Risos) Se tivermos pais muito ricos podemo-nos dar a esse luxo, vamos aprendendo umas coisas e depois vamos fazendo um surf ou umas actividades recreativas. Mas se não tivermos pais muito ricos, temos de ganhar a vida, e para ganhar a vida temos de concorrer, ou seja, estamos realmente em competição, e como tu disseste e muito bem, cada diplomado hoje em dia, seja com o nível de doutor, mestre ou licenciado, está em competição com todos os outros europeus, pelo menos os europeus, porque é muito fácil um jovem do Imperial College vir trabalhar para Portugal, ou um português ir trabalhar para a universidade de Erasmus, portanto, estamos realmente em competição uns com os outros. E devo dizer que esse é o tema que eu tenho andado a reflectir nos últimos anos, afinal de contas, o que é que dá vantagem comparativa a cada um de vocês?

E eu acho que tenho alguns resultados para partilhar convosco, portanto, agora é o momento importante da noite. Ora bem, e vou-vos dizer o seguinte:

Eu tenho estado várias vezes em comissões de selecção de jovens licenciados, de multinacionais, desde a Shell, à BP, etc. Como sabem, seleccionam com um certo cuidado, constituem comissões cuidadosamente, e depois seleccionamos as pessoas, e há umas centenas de candidatos, e depois há uns currículos que são analisados, e de modo geral a shortlist andará por uns cinquenta, quarenta, sessenta. E eu aí tenho percebido o que é que realmente faz a vantagem competitiva de cada um, porque depois esses quarenta, cinquenta, são entrevistados, e eu vou-vos dizer o que foi o resultado dessa minha experiência, portanto, pode ser realmente útil objectivamente a cada um de vocês:

O que é que dá essa vantagem competitiva?

Primeiro lugar: mostrar no currículo que é uma pessoa activa, interessada por actividades. Vocês acreditem ou não, mas por exemplo, a pessoa ter sido agente associativo, ou estar a participar num curso destes, ou ter integrado um movimento de combate à fome, ou ter sido voluntário em Moçambique por não sei quê, isso é valorizado, ou seja, as instituições apreciam pessoas proactivas, com iniciativa.

Eu lembro-me por exemplo de um caso de um jovem, aliás, formado em engenharia, que acabou por ser seleccionado, e de facto, em relação a outro, tinha um currículo académico semelhante, razoavelmente parecido até, mas este tinha tido muita actividade no grupo de teatro da sua associação de estudantes, e o júri valorizou isso. Não fiquem com a ideia de que os processos de selecção são só uma questão de notas académicas, são evidentemente muito importantes, mas é muito importante vocês manifestarem a vossa capacidade de iniciativa em acções concretas, actividades concretas, pode ter sido agente de um clube de surf ou pode ser líder de um processo de reivindicação social.

Segunda fonte de vantagem competitiva:

Esta é muito importante, façam favor, tomem nota nas vossas cabeças: serem capazes de comunicar bem, mesmo que não saibam nada do assunto. E eu devo-vos dizer que tenho entrevistado alguns colegas vossos, que a certa altura, eu vejo mesmo que ele não sabe nada, mas comunica excelentemente, e isso é uma vantagem muito importante. Vocês reparem. Porque é que é muito importante?

Porque hoje em dia, vivemos como há bocadinho o nosso Reitor Carlos Coelho nos recordava, vivemos numa sociedade globalizada, uma cidade globalizada é uma cidade de networkings, e portanto temos que estar permanentemente em interacção uns com os outros. Mesmo a ciência, se vocês repararem, se estudarem a História da ciência, o princípio do século XX, havia grandes descobertas individuais, o Einstein fez a sua teoria da relatividade fechado em casa, hoje em dia isso não é possível, mesmo a própria ciência é feita em rede, e portanto, a comunicação é muito importante.

Eu devo dizer-vos que tenho tido imensa pena de alguns licenciados portugueses nesses processos de selecção que chumbam porque comunicam pessimamente, e comunicam pessimamente porque durante o curso praticamente não tiveram uma prova oral, só tiveram provas escritas, que é um erro fatal, e que se está a agravar, não é? Eu conheço jovens da vossa idade que só comunicam por mail, mesmo o telefone já é difícil: Eu penso que eles pedem namoro também por correio electrónico ou por SMS. (Risos) Não sei como é que é, mas isso é, de facto, dramático. Portanto, vocês façam esse exercício uns com os outros, comunicar mesmo sobre um assunto que vocês saibam pouquíssimo, por exemplo a cultura do regadio no Vale do Yeng Tse na República Popular da China, e cada um de vocês durante cinco minutos tem que expor a sua perspectiva sobre isso aos vossos amigos. Façam esse teste. É divertido e podem ter a certeza que ganham imensa vantagem comparativa. Depois há uma terceira faceta muito importante:

Vocês manifestarem a capacidade de trabalhar em equipa e de chefiar outras pessoas, liderança. Isso é muito importante. Há pessoas insuportáveis, há pessoas que detestam os outros. (Risos) Não sei porque é que vocês se estão a rir, porque realmente é assim, e é bom, somos todos diferentes.

Eu quando dou aulas de gestão, costumo explicar que (acho que há aqui uma ou duas pessoas que foram meus alunos), a primeira qualidade para vocês poderem de certa forma ter uma componente de gestão (e hoje em dia, se vocês forem trabalhar para uma empresa, sejam agrónomos, sejam médicos, ou sejam economistas ou sejam engenheiros, têm sempre essa componente de gestão), a primeira condição é vocês gostarem das pessoas, que de certa forma é também a condição fundamental para o trabalho político, é gostarem das pessoas, e há pessoas que detestam as pessoas, portanto, as pessoas que detestem as pessoas podem ir para outras actividades, por exemplo, geologia, as rochas não se importam nada que vocês não gostem delas. (APLAUSOS)

Podem ter a certeza que isto é muito importante, e houve uma vez um colega vosso que me perguntava:

“O que é gostar das pessoas?”. E eu disse-lhe: “olha é uma pergunta bem formulada e que eu vou responder: gostares das pessoas é valorizar o que essas pessoas têm de mais positivo e subvalorizar o que têm de mais negativo”. As pessoas que embirram com os outros são exactamente os outros, são aqueles que valorizam só os defeitos, passam a vida a repetir que vocês chegaram uma vez atrasados, uma namorada que vocês tenham tido, chata, repete-vos durante vinte anos que vocês chegaram atrasados naquela ida ao cinema quando não sei quê, ora bem, isso são pessoas que devem ir para geologia. (APLAUSOS)

Agora, a capacidade, deixem-me dizer-vos isso, vocês sabem porquê?

As empresas preocupam-se muito com isto pelo seguinte:

Porque aquelas pessoas que comunicam bem, que gostam dos outros e que trabalham bem em equipa, etc., são uma mais-valia fantástica, enquanto que os outros são uma fonte de problemas, e a empresa já tem imensas dificuldades, já tem imensa competição, já está com imensos problemas, e dizer “agora vou contratar mais este fulano que vai ser uma fonte de chatices”, chumba, estão a ver? Mas ele teve dezoito no curso, “está bem, mas por amor de Deus, depois tenho de contratar outro para fazer a gestão dos conflitos que ele vai originar”. Ninguém tem paciência para isso.

Mas oiçam, acreditem nisto que eu estou a ser muito sincero convosco, há vinte anos, eu tenho tido sempre uma actividade ...       

 

(Um minuto inaudível)

 

Se no outro mundo. Hoje em dia ninguém me contrata para isso. Porquê? Porque ninguém tem paciência. Essas pessoas ou são despedidas, ou são postas na prateleira ou são aposentadas, antecipadamente. Ninguém tem paciência para isso. Estão a ver? O termos mau feitio é um luxo que, realmente, mais uma vez, se vocês tiverem pais muito ricos e, de facto, quiserem ir para Geologia, tudo bem. Caso contrário é muito importante que vocês tenham estas vantagens comparativas que é: manifestação de uma atitude proactiva, uma excelente capacidade de comunicação, devem praticar todos os dias, não é? Como musculação, todos os dias.(Risos) Especialmente um assunto que não saibam nada, mas tentar convencer o outro, comunicação muitas vezes para negociação. É evidente que também é um dom natural. Há pessoas que, naturalmente, são assim. Nós, por exemplo, eu e minha mulher, temos uma filha que, desde miúda, tem imenso jeito para negociar. Tinha dez, doze anos, já ficávamos com a sensação que tínhamos perdido tudo e ela tinha ganho tudo, pronto, é um talento específico. Mas nós todos podemos aprender alguma coisa sobre isso. Comunicação, negociação, trabalho em equipa, e uma sólida formação académica de largo espectro. Vocês, bem, 90% dos assuntos que vocês estudam, não vão ser úteis. O que fica de útil é a capacidade de terem aprendido, não é? E é, por isso, que apesar de tudo aquele nosso método de exigirmos bastante, às vezes, no Ensino Superior, que vocês aprendam para um exame, etc., é bom. Mesmo quando vocês, depois, a seguir ao exame, esquecem tudo. Para começar a aprender o que vão aprender para o exame seguinte. Mesmo assim, não é muito mau porque desenvolveram essa capacidade de aprendizagem.

Estas são, realmente, as vantagens competitivas e cada vez mais importantes. Por amor de Deus, vocês não cheguem à situação de ter óptimos currículos académicos e com uma péssima capacidade de comunicação com elas frases engatadas do, e, portanto, já agora, quando é por escrito ainda é pior. E saber línguas, não é? Saber, pelo menos, inglês, francês, espanhol. É muito importante saber línguas, portanto, está associado a isto.

Portanto, essas são, realmente, as capacidades para aqueles de vocês que tenham uma boa formação académica que não vão para Geologia, que gostem das pessoas, tenham um espírito activo, liderança e equipa, eu acho que vocês têm muito sucesso. Muito sucesso em qualquer sítio, aqui, em Nova Iorque, em Washington, em Londres, em Oslo, em qualquer sítio. Vocês têm muito sucesso.

Agora, a outra questão que o nosso amigo colocou em relação a Bolonha. Bom, vocês reparem numa coisa, se há sistema conservador na sociedade portuguesa, são as universidades. Nós detestamos mudar, não é? O Professor Universitário tem o culto da estacionaridade.

Como vocês possivelmente, sabem, nós, os Professores Universitários acham que, em princípio, não devíamos morrer, devíamos ser eternos. Mas, a evidência estatística é que, também morremos. Então, em alternativa, criamos a eternidade, imaginando que o mundo não muda. Portanto, somos uma instituição muito conservadora.

Portanto é evidente que estas mudanças de Bolonha, para nós, foram um choque muito grande. Porquê? Porque há muitos cursos que as pessoas gostavam muito que fossem muito longos e passaram a ser mais curtos. Eu acho perfeitamente aceitável que os cursos tenham três anos. Acho que, em três anos, se podem ensinar muitos temas úteis, como também verifico que em muitos dos cursos de cinco ou seis anos se ensinavam uns temas que não eram úteis. Assim, sempre é melhor porque estão menos tempo a despender recursos próprios, pessoais, à família, à própria sociedade. Confesso que sou favorável, globalmente, ao processo de Bolonha. A questão das instituições dizerem que não estão preparadas, não têm meios, não têm equipamentos, eu acho que é sempre um bocado desculpa, não é? Os portugueses detestam a mudança e, portanto, nós tentamos atrasar a mudança, o mais possível. E só mudamos mesmo, no último segundo, quando vemos que temos mesmo que mudar, não é? Como sabem, aconteceu com o próprio 25 de Abril. Deveria e poderia ter sido, 20 anos antes. Mas, fomos atrasando, atrasando, atrasando e só no último momento é que mudamos.

E, portanto, com Bolonha, eu estou convencido que nunca estaríamos preparados, com toda a sinceridade. Quer dizer, as instituições achariam sempre que era preciso pensar mais, discutir mais, fazer mais grupos de trabalho. Agora, o que interessava não era tanto isso. Interessava era acompanhar a mudança, ou seja, verificar o que é que está a acontecer, corrigir os erros e chamar a atenção para as boas práticas, ou seja, ter uma cultura didáctica, pedagógica em relação à mudança. Isso é que era muito interessante e não está a ser feito.

Portanto, eu, francamente, sou a favor de Bolonha, sou a favor do processo de mudança, acho que os calendários que foram adoptados são perfeitamente razoáveis. Agora, acho que devíamos estar a acompanhar o que é que está a acontecer em cada Escola e corrigir o que está mal. E, por outro lado, chamar a atenção que há aspectos muito positivos que continuam a não ser aplicados. Vou-vos dar um exemplo. Tem a ver com a competitividade: um dos factores de competitividade muito importante é o Diploma que vocês obtêm no final do curso, também ter uma tradução em inglês. Ninguém fala português a não ser aqui e no Brasil, e em África mas a maior parte dos países não falam português. Se vocês chegarem a Hong-Kong, (já me aconteceu isso) com um Diploma do Instituto Superior Técnico, é a mesma coisa que chegar um chinês, aqui, com um Diploma de Pequim. Portanto, isso é uma regra da União Europeia.

Eu sou um europeísta militante, convicto, e acho que tem sido uma experiência extremamente positiva para Portugal, pertencer à União Europeia. E esta é mais um facto. Há uma decisão que é a decisão da chamada “Descrição do Curso” que é um documento anexo em inglês, em que se descreve aquilo que vocês aprenderam. Todas as nossas escolas do Ensino Superior, sempre alguém acaba um curso, devia estar a emitir esse papel, praticamente ninguém está. Isso prejudica a competitividade. Quando vocês amanhã quiserem trabalhar na Holanda ou em Itália têm mais dificuldade. Globalmente sou favorável a Bolonha e acho que vai ter em termos globais, um impacto positivo na nossa sociedade.

 
Dep. Carlos Coelho
Na linha que o Professor Valadares Tavares disse agora, deixem-me contar uma história vivida por mim. Nós estamos habituados a portugueses irem lá para fora, estamos menos habituados a ver estudantes estrangeiros a virem para Portugal, sobretudo quando os estrangeiros são espanhóis. Houve uma espanhola que achou que a Universidade de Lisboa tinha uma Pós-graduação muito interessante. E veio fazer. Esteve oito meses em Lisboa, a fazer uma Pós-graduação na Universidade de Lisboa. E gostou. Pagou e gostou. Objectivamente, porque viu algum interesse no curso que nós lhe podíamos oferecer.

Aconteceu que, depois, queria o Certificado para disputar o mercado de trabalho em Espanha com a Pós-graduação que era uma mais-valia. E no caso espanhol, não havia grande problema que fosse em português que eles, lido, escrito ainda percebem. O mais complicado é falado.

Bem, a nossa Universidade de Lisboa não lhe deu o Certificado. Passa-se um mês, dois meses, três meses, seis meses, até que ela pede ao pai para meter uma cunha, e eu passo pela situação mais humilhante que é o pai, que é um Deputado espanhol, um importante Deputado espanhol no Parlamento Europeu, a vir ao meu Gabinete e a dizer, Carlos, pá, desculpa lá, mas a minha filha pagou, estudou no teu país, há um ano, está há catorze meses a pedir o Certificado, ela precisa desesperadamente do Certificado. Bem, e eu tive que passar pela vergonha de falar ao Reitor da Universidade de Lisboa e dizer, isto é uma vergonha, se vocês não passam já o Certificado, este Deputado que é um Deputado espanhol, vai dizer o pior da escola portuguesa, da Administração portuguesa, de Portugal e fazer opinião contra nós. Ela não estava a pedir nenhum favor, estava a pedir uma coisa a que tinha direito e que já tinha pago. Mas infelizmente, é como nós funcionamos.

Bem, Professor Valadares Tavares, antes de dar a palavra às duas últimas perguntas, temos aqui uma regra de cortesia que é deixar a última palavra aos nossos convidados. E, portanto, esta é a oportunidade que tenho para, uma vez mais, lhe agradecer, lhe agradecer a generosidade de ter vindo ter connosco, responder às nossas questões e à forma como o faz. É um prodígio de comunicação, já o conheço há muitos anos, mas os participantes da Universidade de Verão ficaram a conhecê-lo e a admirá-lo, seguramente.

Últimas perguntas para o nosso convidado, Luís Valente, Grupo Bege, e depois Sofia Cavaleiro do Grupo Castanho.

 
Luis Valente
Muito boa noite, Senhor Professor Valadares Tavares. Boa noite a todos. Bem, um dos maiores problemas da Educação em Portugal começa logo no próprio Ministério da Educação. A instabilidade que sofre o Ministério da Educação sempre que há uma mudança de Governo, uma mudança de Ministro cria graves problemas a todo o funcionamento do Ministério e das escolas. Por experiência própria, posso dizer que até no caso dos Projectos Europeus de Educação, esta instabilidade que houve nos últimos 6, 8 anos, em Portugal, estes Projectos ficaram parados.

Houve financiamento europeu que não foi investido em Portugal porque, dentro do Ministério, não sabiam enviar um Relatório para Bruxelas. E há uma solução para isto, uma solução que já está aplicada noutros países e que há pessoas dentro do próprio Ministério que a defendem. Que é criar dentro do Ministério, uma parte do Ministério que não seja dependente do poder político. Isto é, pessoas técnicas que percebam da matéria e que alguns Departamentos do Ministério sejam estáveis ao longo dos anos.

Se a Educação é uma função, mais ou menos contínua, educar os portugueses é sempre a mesma coisa ao longo dos anos, é educar a função do Ministério, se calhar, pensar num corpo mais estável, iríamos ter melhor sucesso para os nossos alunos no futuro. Professor, o que é que acha desta ideia?

 
Sofia Cavaleiro
Muito boa noite Sr. Professor Valadares Tavares. Se me permitem, gostaria de felicitá-lo pela clarividência do seu discurso. Dado o adiantado da hora e para não correr o risco de me tornar maçadora, gostaria de lhe colocar uma questão, muito breve e prosaica, formulada pelo nosso Grupo.

As competências que, outrora, eram cometidas a um único Ministério repartem-se, actualmente, por dois: o Ministério da Educação e o Ministério do Ensino Superior.

No seu entendimento, não poderá esta duplicidade contender com um desejável tratamento unitário e sistemático do percurso escolar? Obrigada.

 
Prof.Dr.Luis Valadares Tavares
Bom, oiçam, estas duas questões têm muito a ver com aquilo que nós defendemos em relação ao aparelho de Estado que trata da Educação. Nós acreditamos que deve existir o Estado, acreditamos que são importantes as políticas educativas e, portanto, tem que haver um aparelho administrativo que tem essa responsabilidade. A responsabilidade de concretizar essas políticas.

Esta noite ainda não tínhamos discutido isso. Em termos muito simples, uma das revoluções mais profundas na concepção política da Administração e do aparelho de Estado é uma ideia muito simples, é uma ideia que a escola inglesa de jurisprudência chama, o Estado Contratualizante, ou seja, em muitos casos, não deve ser a Administração, não deve ser o aparelho do Estado a fazer as coisas, devem ser outras entidades que são contratadas por nós e que prestam esses serviços em condições que nós especificamos. Essas entidades são os chamados Providers.

E, portanto, reparem, voltando àquela história com que começámos dos exames que têm erros, os enunciados têm erros, têm erros de todo o tipo: têm erros conceptuais, têm erros de texto, por exemplo, este ano, houve uma inovação fantástica. É que havia um erro que era faltar o gráfico. A pergunta dizia, não sei quê, compare o gráfico da figura 1 e o miúdo, coitado, ia depois ver e não havia figura. Portanto tem todas as formas de erros. Porque é que há-de de ser o Ministério a fazer os testes, os enunciados? Estão a ver? Pode ser uma entidade, pode ser uma empresa privada, pode ser uma agência, pode ser uma associação de Professores. Pode ser uma entidade que é contratualizada pelo Estado e que, anualmente, diz, olhe, os Senhores têm que fazer uma base de dados de perguntas. Nós, depois, analisamos a qualidade dessa base, e depois extraímos aleatoriamente um conjunto de perguntas, que são os testes.

Bom, essa ideia, é uma ideia que está a revolucionar o sector público da maior parte dos países. Essa ideia, de facto, não chegou até nós. Eu não sei se vocês já repararam, tem-se discutido muito o défice, tem-se discutido muito a reforma da Administração Pública, mas não tem havido redução do papel do Estado. Não há nenhuma área onde vocês digam, agora, aqui já há menos Administração Pública. Eu não conheço nenhuma.

Portanto, este problema da Educação é um problema típico. Será que a solução de ser o Ministério da Educação, a máquina Administrativa, a desempenhar estas actividades é boa? Eu penso que não. Eu penso que tem sido um erro muito grande, temos um grande Ministério, com as Direcções Regionais, com centenas de funcionários a mandarem papéis uns para os outros.

Acho essa máquina indesejável, francamente indesejável. Acho que se devia reduzir ao mínimo. E depois devíamos afectar estas actividades específicas, sob forma contratualizada, às entidades que, por concurso, se manifestassem mais competentes: umas faziam os enunciados, as outras podiam preparar a formação de Professores, os outros podiam tratar dos sistemas de promoção, de avaliação, e assim por diante.

Portanto, talvez o que haja de positivo no Ministério do Ensino Superior é quase não haver Ministério, porque é praticamente só uma Direcção Geral. Mas já começou a haver a tentação de haver mais coisas. Isso é que é pena. A ideia de juntar ou partir não me atrai muito, atrai-me muito a ideia, e devo-vos dizer que partidos com a orientação ideológica da vossa, em vários países têm ganho as eleições com propostas baseadas nestas ideias. São ideias com algum valor político, que é de reduzir a dimensão do aparelho do Estado e contratualizar essas funções a terceiros. Porquê? Porque se cumprem mal, eu rompo o contrato: não pago. É uma grande vantagem. Se o teste veio com erros olhe, não pago. Pode ser mas, mesmo assim, vinha com erros, que é uma maçada. É. Mas como a entidade sabe que não vai receber, vai ler com muito cuidado e quando se diz, consulte o gráfico, está lá o gráfico. Estão a perceber?

Portanto, este problema de Ministérios, Educação e Ensino Superior, enfim, eu penso que, com toda a sinceridade, a solução não é essa. A solução é, realmente, reduzir muito a dimensão. Nós temos Países na União Europeia em que o Ministério da Educação tem 80 pessoas. Por exemplo, na Finlândia têm 75 pessoas, setenta e cinco funcionários, a Suécia terá um bocadinho mais, andará pelos 90. Portanto, não é preciso ter 20.000. E sabem que, em termos das Ciências de Gestão, eu não tenho estado a querer maçar-vos com isso, mas há muitas dúvidas que se saiba fazer a gestão de 20.000 pessoas. A menos que seja o exército russo, mas mesmo o exército russo teve muitos problemas, como sabem, não é? Como é que se gerem 20.000 pessoas? Eu não sei. Não me peçam para gerir 20.000 pessoas porque eu não sei.

Portanto, a ideia, realmente, é essa. Agora, a outra questão, a questão da politização ou da profissionalização. Como vocês sabem, os cargos de nomeação política existem em todos os países: existem nos Estados Unidos, existem em Inglaterra, etc., mas são poucos, por exemplo, o Director de um Centro de Saúde não é um cargo político na generalidade dos países, não é uma nomeação política, portanto. O número de cargos de nomeação política deve ser muito reduzido, e deve ser controlado. Eu sou a favor do sistema inglês. No sistema inglês, o Governo tem a possibilidade de fazer propostas de nomeação política para um conjunto de funções, são poucas e que estão bem definidas. E essas propostas vão a uma Comissão que é presidida por um Lorde, é uma Comissão Independente e que faz a análise curricular. E se eu, a certa altura, tenho muita confiança no meu barbeiro, porque reparem, eu quinzenalmente vou lá e entrego-lhe a minha cabeça que vale qualquer coisa, (Risos) eu tenho confiança no barbeiro, mas se eu propuser, o barbeiro para Director Geral, é uma proposta tonta. Quando chegar a essa Comissão, a Comissão diz, olhe, o Senhor desculpe mas é tonto. O Senhor tem confiança nele porque lhe entrega a cabeça quinzenalmente, mas nós não achamos razoável que seja Assessor ou Director Geral, etc. E no fim do ano, esse Lorde reúne os casos e publica a lista dos chumbos que, obviamente, é uma matéria de discussão e debate riquíssimo, no Parlamento. Porque toda a Oposição vai-se deliciar a tentar ver quais foram os chumbos daquele ano. O que significa que o Governo tem que ter muito cuidado, não vai propor o barbeiro. Porquê? Porque se já sabe que está mesmo a ver que vai ser um dos chumbos, e o chumbo depois, aparece no fim do ano. Portanto, são sistemas de controlo social.

O nosso País está afastado desta prática. Para já, em muitos casos, há nomeações políticas que não têm lógica nenhuma. Portanto, para muitas funções que não há qualquer razoabilidade, essa confiança política. É por isso que, depois, como vocês dizem, e com razão, há um excesso de politização dentro do Ministério da Educação, como há nos outros Ministérios. Mas pior que isso, não há esse controlo, ou seja, não há a tal Comissão, não é? É uma área onde tem havido uma confusão muito grande entre sistema político e sistema administrativo, com prejuízo para os dois casos. E, realmente, há pessoas que desempenham cargos públicos que não têm quaisquer habilitações para o fazer; e há pessoas que tinham muitas habilitações para o fazer e que não são nomeadas. Portanto, eu devo-vos dizer que aí, é uma área onde eu acho que há uma grande injustiça. Sabem que a sociedade portuguesa é uma sociedade simpática e amena e nós até nos damos, razoavelmente bem, uns com os outros. Mas é uma sociedade também com muitas injustiças. Essa é uma grande injustiça. Eu conheço pessoas qualificadíssimas, competentíssimas, que seriam excelentes dirigentes públicos e que não são nomeados.

Danças de Ministérios, acho que quanto menos melhor. Se conseguirem escolher 10% do que existe era o ideal. Em cada Ministério escolher 10% das pessoas mais importantes. E o resto fazer o contracting out, todos nós saíamos beneficiados. Está bem? Cheguei ao fim, foi?

Oiçam, portanto, rematando com as ideias mais importantes: está mal, mas isto pode ficar muito melhor, se vocês quiserem; os Partidos políticos como o PSD, em meu entender, deviam deixar a prática dos cenários cor-de-rosa nas alturas eleitorais e propor mudanças de ruptura a favor da transformação da nossa sociedade. Para cada um de vocês ter sucesso, neste momento, já sabem como é, é muito simples: começar por gostar das pessoas, espírito activo, liderança e muita, muita, muita, muita comunicação e negociação, a propósito de tudo e de todos.

E última ideia que eu vos queria deixar aqui é, quanto ao Estado, quanto à Administração, as coisas têm que ser muito diferentes do que estão actualmente. A ideia que tem havido sempre de o Estado e a Administração querer fazer as coisas e serem sempre, os melhores, é má. Vou rematar com uma pequena história que vivi em 1988, quando era Professor do Técnico e fui convidado para Director Geral do Ministério da Educação, e passados poucos dias fui a uma reunião com os equipamentos educativos e com mais outras pessoas porque há sempre imensa gente, como há imensos funcionários, as reuniões têm imensas pessoas. E eu não percebia o que se passava na reunião porque falava-se em cadeiras, ainda pensei que estávamos a tratar de um currículo, e só ao fim de meia hora é que percebi que estavam a falar de cadeiras físicas. Porque o Ministério da Educação, naquela altura, ainda entendia que era ele que sabia fazer cadeiras de madeira, cadeiras físicas para os alunos se sentarem. Bom, isto é ridículo, hoje em dia. Hoje em dia já não fazemos cadeiras. Mas esta cultura ainda se manteve, a do Estado que faz tudo. Não fazemos automóveis porque não calhava. (Risos) Mas esse Estado tem que acabar e nós temos que mudar completamente as nossas concepções em relação ao Estado, em relação à própria Administração Pública.

E, por último, aquela boa notícia, não se esqueçam, a partir de 15 de Setembro, PlayGov é o jogo da gestão política que cada um de vocês deve participar. E muito obrigado por esta oportunidade.

 

(APLAUSOS)