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14.30 - Assembleia (simulação)
20.00 - Jantar-Conferência com o Dr Vasco Graça Moura
31-08-2007
Paixão e Razão no processo de Construção Europeia
 
Dep. Carlos Coelho
O convidado desta manhã está um bocadinho atrasado, dispensou o transporte com um motorista que nós lhe oferecemos, quis vir pelos meios próprios e deve ter virado onde não devia, e dá-nos uns minutinhos para tratarmos de outras matérias.

Primeira questão, eu tenho lido as vossas sugestões e o vosso “achei curioso”, e gostaria de responder a algumas delas.

Primeiro, há dois ou três participantes que chamam a atenção para a necessidade de haver formação em áreas não substantivas mas ligadas ao exercício da política. Sobre o ponto de vista da estratégia não há de facto nenhum tema nem nenhuma conferência prevista nesta semana. Há sob o ponto de vista do exercício da retórica, através do debate desta tarde. Como vos disse, o debate desta tarde, para lá de levantar um problema da actualidade, a questão se devemos ou não baixar os impostos, vai-vos permitir ter dois actores da política de primeiro plano, o Deputado socialista Hasse Ferreira, e o Deputado Social Democrata, Miguel Frasquilho, a exercitar argumentos um contra o outro, e portanto, vai ser um exercício, se    quiserem, de esgrima política à volta de uma matéria substantiva. Portanto, vão ver não apenas a natureza da substância dos argumentos que vão pôr em cima da mesa, mas a forma como eles a utilizam no seu debate, e vamos ter no sábado de manhã, uma aula sobre comunicação, o chamado “Falar Claro”, que vos dará exemplos práticos de como se deve estruturar a comunicação politica. E sob esse ponto de vista, neste dois momentos, já haverá, em parte, resposta à questão que colocaram.

Muitos de vós sublinharam alguns aspectos concretos da organização, de forma elogiosa, e em nome de todos quero agradecer isso, desde a Elsa que diz que a intranet está muito bem desenhada, até outras referências a diversos outros pontos da organização da Universidade de Verão.

Mas eu nessa matéria queria dizer-vos que, de facto, a organização tem-se aprimorado, são várias pessoas, e várias pessoas a título voluntário, que estão aqui a colaborar para vos oferecer as melhores condições de trabalho e de estudo nesta universidade.

Depois, queria dizer-vos que sublinho com particular agrado a quantidade e a qualidade das perguntas que têm feito. Na área das perguntas a personalidades, a vossa Universidade já bateu o recorde de todas as outras Universidades. Nem 2003, nem 2004, nem 2005, nem 2006, chegou à quantidade de perguntas que vocês já formularam. E a qualidade é bem significativa, quando o Presidente da República de Timor-Leste, a quem pedimos para responder a duas, decidiu responder a 5 ou 6. Portanto, eu acho que ele ficou surpreendido quando soube que havia perguntas do lado de lá do Atlântico, de Portugal. Deve ter gostado da experiência, mas se achasse que as perguntas não tinham valor, tinha-se limitado a responder ao número a que se tinha comprometido.

Isso gerou um problema com o JUV, porque o espaço que estava previsto não contemplava tantas perguntas, mas encontrou-se uma solução, e foram todas publicadas, como sabem.

Gostaria também de agradecer ao Presidente da JSD, ao Pedro Rodrigues, que é da casa, mas que em qualquer circunstância foi uma das personalidades que nós escolhemos para vocês poderem fazer perguntas, que decidiu, (já sabem), responder a todas. No JUV não temos a possibilidade de fazer essa publicação, vamos apenas publicar duas, mas na intranet todas as perguntas que quiserem fazer ao Presidente da JSD, ele compromete-se a responder online. Presumo que aquelas que já foram feitas, já estão respondidas, se houver mais alguma até ao final da universidade, até sábado, ele responderá via intranet. E portanto, temos aqui uma comunicação virtual, entre pessoas que estão realmente presentes, mas sublinho a disponibilidade do Presidente da JSD em responder a todas as perguntas e não deixar nenhuma por responder.

E, finalmente, questões sobre a assembleia. A Assembleia é, desde que foi criada, um momento alto da Universidade de Verão, porque vocês terão a oportunidade de viver um debate parlamentar, recriar um debate parlamentar e de esgrimir argumentos no quadro dos temas que vos foram distribuídos por sorteio. E com base nas propostas que vocês próprios elaboraram. Portanto, é um exercício de política, em que vocês são avaliados pela substância das propostas que tiverem, pela substância da argumentação que utilizarem, mas também pela correcção na forma que utilizarem para defender as vossas posições.

Há alguns de vós que já fizeram perguntas que não estão recolhidas nas regras, e a minha tentativa era tentar responder a essas perguntas e depois se houver mais algumas responder de imediato.

Primeiro, nós desejamos que o tema do sábado de manhã, com o Dr. Rodrigo Moita de Deus, seja um tema com valência na área da forma, e portanto é possível que vocês possam extrair alguma coisa dessa aula para utilizarem nas assembleias à tarde. Mas não queremos que utilizem de uma forma acrítica ou mecânica. Ou seja, não há aqui uma espécie de grelha de pontuação, em que nós vamos ver, olha, usaram a sugestão 3, usaram a sugestão 4… Isso não funciona assim. O que funciona é a eficácia da comunicação. Vocês têm que ser convincentes, quer no Governo quando apresentam as propostas, quer na Oposição quando tentam combater as propostas do Governo.

Já me perguntaram se podem inventar argumentos. Se por exemplo, podem presumir declarações da outra parte, isto é, se podem criar um cenário de fantasia. A resposta é sim, podem, não têm nenhuma limitação relativamente a isso, mas arriscam-se, se pisarem a linha, a que a outra parte possa fazer a mesma coisa. Se eu estiver numa assembleia e para embaraçar o Pedro Rodrigues disser “Sr. Deputado Pedro Rodrigues, o Sr. ainda ontem dizia o contrário”, ele pode-me responder, “Eu ontem estava na Austrália, o Sr. está aqui a mentir aos portugueses”. Portanto, há um limite da fantasia, porque como cada um pode inventar, se inventar atribuindo declarações, atitudes ou medidas à outra parte, a outra parte pode responder na mesma moeda, ou pode dizer pior, enfim, não vos vou dar sugestões para não limitar a vossa criatividade.

Dito de outra maneira, vocês vão recriar um debate, e vão ter que imaginar um ambiente político que não está definido. Nas fichas do jogo nada vos dizia se vocês tinham que ser comunistas ou social democratas, nada nas fichas do jogo vos diz que estão em Portugal ou se estão nos Estados Unidos da América, se é um país rico ou um país pobre, se há tumultos populares ou instabilidade civil.

Bem, esse cenário não está definido, portanto, vocês podem presumi-lo nas vossas intervenções. Portanto, vocês podem criar, podem fantasiar o ambiente político que justifica as vossas intervenções.

Agora, elas são centradas na matéria e a matéria são as vossas propostas, porque são elas que estão em cima da mesa, são elas o objecto do debate político que vai acontecer.

Como já vos disse, o Governo vai estar onde está o Pedro Rodrigues, a mesa estará aqui ao pé do ecrã, as oposições estarão na primeira fila e os grupos neutros estarão nas filas de trás. Isto, roda em cada exercício. Vocês vêem de frente o governo, o coordenador do grupo é o Primeiro-Ministro, e designa-se por Primeiro-Ministro, os outros membros designam-se por Ministros. O facto de haver um Primeiro-Ministro ou uma Primeira-Ministra, e Ministros ou Ministras, não significa qualquer tipo de obrigação no uso da palavra, significa só a posição protocolar na assembleia. Isto é, pelo governo não é obrigatório que seja o Primeiro-Ministro a falar, pode ser um ministro ou pode ser o Primeiro-Ministro. Cada grupo é que decide, dentro das regras que foram fixadas da distribuição equitativa das oportunidades de intervenção, quem é que usa da palavra na assembleia.

Vocês vêem o Governo de frente, e verão nos ecrãs, nos plasmas, as oposições. Isto é, para os grupos neutros que vão avaliar quem é que ganhou o debate, poderem ver todos os contendores de frente, como vocês estão por detrás dos vossos colegas que estão na primeira fila, vão ver as caras deles nos ecrãs laterais. Por essa razão, nós vamos pedir aos porta-vozes da Oposição para se sentarem no centro, onde está este microfone sozinho. Haverá um grupo deste lado e um grupo daquele, os respectivos porta-vozes vão–se encontrar no meio por causa do ângulo de mobilidade da câmara, assim têm sempre nos ecrãs a cara dos dois oposicionistas, que farão o ataque ao governo.

Relativamente às questões que me colocaram acho que não tenho mais nenhuma informação para a Assembleia, mas admito que haja curiosidade da vossa parte, se houver curiosidade da vossa parte eu posso responder a qualquer questão que me queiram colocar.

Dúvidas relativamente à Assembleia, há alguma?

Isto é fantástico, um grupo de gente, ou estão todos já satisfeitos ou estão todos muito adormecidos.

 

Participante: - Bom dia, a ordem, primeiro fala o Governo, depois fala a Primeira Oposição, depois, será à semelhança do Melhor Português de Sempre?

 

Dep. Carlos Coelho: - Sim. O Governo fala durante 5 minutos. Vamos ver um relógio digital, um cronómetro digital para vocês poderem acompanhar ao segundo a gestão dos tempos, porque vamos ser muito rigorosos na gestão dos tempos. O Governo fala durante 5 minutos, a seguir o Presidente dará a palavra ao Deputado da Oposição Um, de seguida ao Deputado da Oposição Dois, e finalmente ao Governo para responder. As intervenções da oposição, são cada uma delas no máximo 3 minutos, e o governo terá 3 minutos para responder em conjunto às duas oposições.

Portanto, na prática, em cada assembleia, o Governo tem 8 minutos para falar, 5 no início e 3 no fim, e o conjunto das oposições terão 6 minutos, sendo que são 3 minutos para cada uma. Ou seja, se formos todos rigorosos com os tempos, cada assembleia dura, exactamente 14 minutos.

A seguir às intervenções, os grupos neutros são solicitados a votar, quem é que ganhou o debate. Aqui as cores não têm interesse, não se trata de uma pontuação, trata-se duma votação simples. Quem ganhou o debate, o Governo, a Oposição Um ou a Oposição Dois. Para nós, sob o ponto de vista da contagem é mais simples se todos usarem a mesma cor, propormos que usem o 1, o boletim de voto vermelho, porque quando há muitas cores é mais complicado contar, mas é apenas para nossa facilidade, não há aqui nenhuma obrigação, mas se quiserem ajudar, sugeria que votassem com o cartão nº 1, com o cartão encarnado.

Mais questões sobre a assembleia?

Muito bem.

Senhores Conselheiros, Senhores Avaliadores, há alguma coisa que me esteja a esquecer e que seja importante partilhar?

 

Conselheiro: - O número de perguntas nos Jantares.

 

Dep. Carlos Coelho: - Tem havido queixas relativamente a uma violação que nós não temos reprimido, mas para que vos pedia a vossa atenção, nos temas e nos jantares. A regra é: cada grupo tem direito a fazer uma pergunta, não são cinco perguntas. Às vezes há uma pergunta que tem uma subdivisão natural, outras vezes as perguntas são de carácter naturalmente diferente, e esgotam as perguntas disponíveis para os grupos que vêm a seguir. Aqui diríamos que podíamos premiar os últimos, o último grupo poderá ter aqui maior latitude porque não está a prejudicar ninguém nas conferência ou jantar, já aqui nos temas está, porque pode haver perguntas livres. Portanto, nós pedíamos que, quem fala em nome dos grupos que se reconduza à ideia de que há uma pergunta, para não esgotar a intervenção dos vossos colegas que vêm a seguir.

Bem sei que a vossa criatividade é ilimitada, mas ainda assim, podemos assegurar que ela não seja cerceada com excesso de perguntas que não estão previstas nas regras.

 

Participante: - (Não se ouve)

 

Dep. Carlos Coelho: - Ah! muito bem. O que é que vai acontecer de diferente? Vamos ensaiar este modelo este ano. Aqui onde eu estou vai desaparecer o púlpito, porque o Governo fala da sua bancada e as Oposições falam da respectiva bancada, e vou estar eu sentado com o Rodrigo Moita de Deus, portanto, o vosso formador da aula de comunicação de sábado de manhã, e eu e o Rodrigo vamos fazer comentários curtos no final de cada assembleia. Cada assembleia vai ter o seguinte desenho: o debate da forma que vos expliquei, pontuação de quem é que ganhou de debate através da vossa votação, feita pelos grupos neutros, e depois, haverá um comentário técnico, feito por mim e pelo Rodrigo. Isto nunca aconteceu, foi uma substituição relativamente ao grupo surpresa que existiu no ano passado e que foi muito criticado pelos vossos colegas, portanto, vamos ver como é que funciona.

Como vos disse ontem, o que pode acontecer é que alguns pormenores vão sendo aperfeiçoados. Isto é, vocês vão ouvindo quais são o tipo de comentários que fazemos relativamente aos vossos colegas, e vão ajustando algumas coisas que teriam pensado ou algum tipo de comportamento ou postura, etc.

O que significa que, os grupos que ficarem para mais tarde, têm a vantagem de terem ouvido já os comentários que foram feitos aos anteriores. Por essa razão, nós eliminámos uma votação, que era a votação de qual tinha sido o melhor governo e a melhor oposição em conjunto, porque as armas não são iguais. Isto é, vocês quando estão a representar a vossa assembleia, não tem todos a mesma informação, terá mais informação os grupos que falarem mais tarde, e os primeiros terão menos informação porque ainda não ouviram comentários.

Assim, não se fere a igualdade. Relativamente à ordem das intervenções, à ordem das assembleias, ela vai ser fixada e assim que nós o fizermos, daremos conhecimento.

Acácio.

 

Acácio: - Eu sei que isto é um bocado lateral ao tópica da assembleia, mas fomos agora informados pelos nossos coordenadores que irá haver a presença da imprensa, possivelmente a partir de hoje até Domingo. Quais é que são as regras que nós devemos esperar que a organização vai impor a essa imprensa, e onde é que nós devemos ter mais cuidados, e quais são as zonas onde podemos estar livres para falar.

 

Dep. Carlos Coelho: - Vamos cá ver. Quando nós estamos aqui, estamos em família. Estamos em família. A imprensa está convidada a acompanhar-nos para dar visibilidade à Universidade de Verão, e recolherá lá fora declarações dos nossos convidados, à saída ou à entrada conforme está estabelecido. Para perceberem um pouco o que é que nós estamos aqui a fazer, e para perceberem que vocês prescindiram de uma semana não para férias, mas trabalhar, para não se dizer que estamos a premiar com uma semana de férias 100 jovens de elevado potencial, que se distinguiram nas campanhas do partido. Nós damos por vezes, de forma selectiva e por convite, a oportunidade a alguns jornalistas de assistirem a parte dos debates, com a condição de não citarem esses debates. Ou seja, vocês estão a falar para nós, não estão a falar para fora.

Agora, ainda bem que o Acácio coloca esta questão, e eu agradeço-lhe porque podemos ter um ligeiro problema. O problema é com a festa de sábado à noite. Há sempre uma festa de despedida, e esta vez, nesta universidade, pela primeira vez, decidimos inovar com o “Cabaret”, que é um número de criatividade para o qual cada grupo foi convidado a participar apresentando um sketch o mais diversificado, cabe-vos a vocês decidirem e definirem o que é que querem fazer na noite do cabaret. Vai ser praticamente impossível circunscrever o cabaret à família, isto é, num mesmo espaço vão coexistir pessoas de fora e, sobretudo, jornalistas.

E portanto, eu pedia-vos, sem cercearem a vossa criatividade, porque isso é interessante e tem piada, terem isso em atenção, sobretudo quanto a coisas mais agressivas. Queremos que, quem nos vê, tenha uma melhor ideia da Universidade de Verão, e não uma má ideia da nossa iniciativa.

Portanto, muito obrigado pela dica, que me permite fazer este apelo.

Mais questões?

 

Participante: - (Não se ouve)

 

Dep. Carlos Coelho: - Muito bem. Mais uma forma de vocês se associarem à elaboração do JUV, como vos disse no primeiro dia, o JUV é o nosso jornal, mas é sobretudo feito por vocês, e portanto, mais uma oportunidade para um de vós, não apenas escolher a manchete, mas escolher a fotografia que vai abrir a primeira capa.

Quem é que é o Marcelo Rebelo de Sousa.

Como vêem há sempre alguém que consegue dar uma resposta sucinta, objectiva e esclarecedora: é um senhor que dá aulas.

Mais questões?

 

Participante: - Bom dia, os convidados até à data para responderem às perguntas para o JUV, foram todos pessoas ilustres, no entanto ambos possuíam uma área comum, ou seja, todos possuíam uma área ligada à política, deixava o repto para numa posterior edição, em variar o tema, como cultura, desporto, no fundo áreas ligadas com o nosso quotidiano, e que no entanto também nos dizem algo. Isso seria um enriquecimento cultural e seria uma forma também de fugir um pouco ao tema que se tem cruzado, nomeadamente a política.

 

Dep. Carlos Coelho: - Acho que é uma excelente sugestão. Eu pedia-lhe para deixar por escrito, ou através do impresso ou directamente na net, para depois na sessão de avaliação que nos fazemos, que é um dia de trabalho sobre as vossas respostas, sobre as vossas avaliações, e as vossas opiniões, nós termos isso em papel à nossa frente. E vamos imprimir da intranet todas as vossas sugestões, depois organizadas por temas, e portanto, pedia para não deixar de o fazer por escrito, porque senão vou esquecer, nós só podemos fazer esta avaliação daqui a três ou quatro meses, quando tivermos  todo o tratamento estatístico dos inquéritos que vocês têm feito, e portanto, assim, não se esquece dessa sugestão que me parece excelente sugestão, muito obrigado por ela.

Mais questões?

Duarte, alguma coisa que me esteja a esquecer?

Pedro? Qual é Acácio?

 

Participante: - Ó Carlos, isto não é uma crítica, é uma sugestão, dado que muitos usam os portáteis, e não temos aqui forma de os ligar, arranjar mais extensões numa próxima edição para que possamos todos ligar aos computadores.

 

Dep. Carlos Coelho: - Sugeria também pôr por escrito. Acho que é uma boa dica.

 

Participante: - E outra, nós trabalhamos tanto à noite, se pudesse haver uma comidazinha lá em cima no bar, à nossa disposição. Umas sandezinhas só.

 

Participante: - Eu vou fazer por escrito também esta sugestão, mas era se calhar importante acabar com estas pernas incomodativas que as mesas têm, que às vezes ficamos aqui numas posições complicadas.

 

Dep. Carlos Coelho: - Muito bem. Não sei quem é que está aqui de engenharia, mas pode-nos ajudar a desenhar  mesas sem pernas. (Risos)

 

Participante: - Eu posso tentar. Então se me permitem é uma questão de as pôr mais para o lado. (Risos)

 

Dep. Carlos Coelho: - Nesta parte acendeu-se uma bolinha no canto superior esquerdo do ecrã. Não há menores de 18 anos da sala?

 

Participante: - Há!!!

 

Dep. Carlos Coelho: - Então eu pedia para se conterem.

Mais sugestões?

 

Participante: -  (Não se ouve)

 

Dep. Carlos Coelho: - Vamos cá ver. Ok. Eu peço desculpa, também já me tinham chamado a atenção para isso, e eu tomei nota algures, mas não neste papel. Vamos cá ver, as conferências já estão praticamente todas esgotadas. Vamos por partes, nós por uma questão estética e para valorizar o nosso convidado, nos jantares nós queremos distribuir isso nas mesas, mas vocês têm acesso porque essas informações estão na intranet, através da intranet podem ir ao currículo e ao retrato falado dos convidados. Está lá tudo.

Hã? Só é posto no dia? Ah, então, isso pode ser alterado, eu pedia ao Duarte Marques para pedir à equipa da informática para meter já esses dados todos, não há nenhuma razão para estar só disponível no dia.

Portanto, relativamente a isso vamos providenciar, portanto, há aqui uma falha que eu não tinha conhecimento, para estar na intranet tudo desde já, retrato falado e currículo.

O tema das conferências, as conferências estão assentes em personalidades, mas com um tema orientado. A Dra. Leonor Beleza queríamos que viesse cá falar da sua experiência à frente da Fundação Champalimaud.

A Dra. Teresa Morais, falar de Crianças em risco e do regime de Adopção.

O Prof. Paulo Mota Pinto, falar de Justiça.

O Prof. Luís Valadares Tavares, que vai estar connosco nesta noite, sobre Educação, ele é um homem que pode falar de muita coisa, é um homem muito polivalente, mas vem falar sobre Educação, que é uma das suas especialidades. Ele foi director geral do gabinete de estudos e Planeamento do Ministério da Educação, é Professor Catedrático do Técnico. Também podia falar da Reforma da Administração, que ele foi presidente do Instituto Nacional de Administração. Mas, vem falar de Educação, ou seja, a pergunta que lhe vou fazer tem a ver com educação.

E o último jantar conferência, o Dr. Graça Moura, como é que vos posso dizer? Vem falar de questões relacionadas com a cultura e com a história. Por razões que perceberão não posso avançar mais neste momento. Mas o Dr. Graça Moura é um homem particularmente inteligente e muito culto, e portanto, vocês podem alargar o tema das vossas perguntas. É um fundador do PSD, que saiu do PSD há muitos anos, saiu em 75 se a memória me não trai, que depois se reaproximou independente, não é militante. Na prática é um membro da nossa família política, embora sem o cartão de militante, que já teve no passado.

Mas é um homem que pode responder a questões de cultura, a questões da Europa e a muitas outras questões relacionadas com a política, desde que não entrem em detalhes de natureza técnica de áreas que ele não domina, sei lá, se lhe perguntarem coisas sobre taxas cambiais, instabilidade, eu admito que nessas matéria mais concretas da economia ou de outras áreas ele diga, eu não sou um especialista, sobre isso não me quero pronunciar. Mas, vai ser seguramente uma conferência muito interessante, nós tivemo-lo cá há dois anos e foi uma coisa notável.

Há dois anos fizemos uma conferência dele ao jantar, centrada sob a questão de saber onde começa o homem político e o homem cultural, e onde é que ele se sentia melhor, se era a representar a política, se era a produzir literatura, e portanto foi uma conversa mais intimista sobre o Homem e a obra, mas foi muito bonito, foi um melhores jantares conferência que me recordo de anos anteriores.

E nós começámos com uma surpresa, estou-vos a dizer isso porque escusamos de repetir. Quisemos homenageá-lo de uma forma precisa. O Dr. Graça Moura é, na minha opinião, talvez, nos contemporâneos, a figura cultural mais marcante, para mim. Os vossos colegas que fizeram o brinde, não fizeram o brinde, portanto, a vossa colega que tinha a responsabilidade do brinde disse “Dr. Graça Moura, nós não queremos fazer nenhum brinde, queremos fazer uma coisa especial, então apagámos as luzes do restaurante, ficou tudo às escuras, fizemos um solo de viola muito bonito, feito por antigo colega vosso que tinha participado na Universidade de Verão de 2003 e declamámos uma poesia de Jorge de Sena, que é muito bonita chamada “Carta a meus filhos, sobre os fuzilamentos de Goia”, quem não conhece, recomendo-vos, pode encontrar facilmente na net, na net apanham mais versões amputadas, mas é uma carta grande, é uma prosa poética, muito bonita, muito bonita, muito bonita. “Não sei meus filhos que mundo será o vosso…” e depois explica qual é o mundo que ele gostaria que os filhos tivessem. Um texto fantástico, com uma carga emotiva descomunal.

E homenageámos um grande poeta português, lendo uma prosa de um outro poeta português já falecido.

E o Dr. Graça Moura que não sabia, foi uma surpresa, deu-nos uma aula de 10 minutos sobre o Jorge de Sena. É impressionante as coisas que ele sabia sobre o Jorge de Sena. Tanto que muitos dos vossos colegas vieram depois piscar o olho e dizer. Ah, isto estava tudo combinado, vocês tinha dito ao homem que iam fazer esta coisa do Jorge de Sena a ele. Não. Zero. Não foi rigorosamente combinado, mas foi uma coisa muito bonita e foi um momento alto da nossa universidade de 2005, se não estou em erro, se a memória não me trai.

 

Participante: - Só uma última sugestão. Eu acho que assim como fazemos a avaliação das pessoas que vêm cá falar, poderíamos também fazer dos conferencistas que vêm aos jantares.

 

Dep. Carlos Coelho: - É uma excelente sugestão. Vão ter oportunidade de fazer isso no Domingo de manhã, e espero que todos façam.

E vão fazer outra avaliação. Vão-se avaliar a vocês próprios e aos vossos colegas. Essa avaliação é uma avaliação diferente, é uma avaliação anónima, e portanto, para exactamente vos pedir a sinceridade até na vossa própria avaliação. Nós não sabemos quem é que faz a cruz em cada impresso, mas achamos esse exercício importante.

 

Participante: - Relativamente às conferências, tirando as perguntas de grupo, podia haver uma parte de perguntas livres mais extensiva. Ou seja, eu sei que o tempo às vezes não permite, mas nem que fossem por escrito ou seleccionadas, ou não sei, que era para haver mais oportunidade de mais pessoas fazerem perguntas aos convidados nas conferências da manhã.

 

Dep. Carlos Coelho: - Isso é verdade, só que há o chamado tempo psicológico. Nós temos a clara noção de que quando o jantar se prolonga excessivamente, vocês já estão particularmente cansados e passa a ser muito penoso e gera efeitos contraproducentes. Primeiro, já não se consegue gerir o silêncio da mesma maneira, depois porque o convidado percebe que metade da sala já se está nas tintas para aquilo que ele está a dizer, terceiro, porque vocês não estão aqui a falar para a gravação, estamos a gravar tudo, mas a ideia não é essa, a ideia que isto tenha um valor formativo. Ora, se vossa atenção já não está centrada aí, estamos a perder tempo. E o tempo é demasiado precioso, o vosso e o nosso, para nós perdermos tempo. E, portanto, há opções que fazemos. Podem ser erradas, admito que sim, não temos a veleidade de pensar que temos sempre a certeza absoluta daquilo que estamos a fazer, mas para nós os jantares não podem ser prolongados excessivamente.

Nos temas, depende da gestão do tempo, do vosso tempo e do tempo do orador. Por exemplo, hoje não sei se será muito possível termos muitas perguntas livres, porque esta aula vai começar com um grande atraso.

Mais questões? Se não tivermos mais questões, podemos preparar-mos para receber o nosso convidado que deve estar a entrar no hotel a todo o segundo, a última informação é que ele estava a 12 quilómetros, mas isso já foi há uns 10 minutos, portanto, a uma média de 60 quilómetros horários, deve dar uns 10/12 minutos, e portanto, deverá estar a chegar.

E na próxima Universidade de Verão não permito aos oradores que venham no carro próprio, obrigo-os mesmo a virem no carro da organização para ter a certeza que estão cá a horas. Ou então vêm cá dormir, mas isso, eu não me meto na vida privada de cada um, cada um é que sabe com quem é que dorme. (Risos)

Dado que a modéstia de quem recusa o motorista para o ir buscar, não é no contexto dos nossos trabalhos a melhor solução, agradeço ao Prof. Dr. Miguel Poiares Maduro, o facto de ter aceite o nosso convite. O Doutor Miguel Maduro, é um jurista brilhante, tem uma carreira notável como tiveram ocasião de ver pelo currículo que foi distribuído. Hoje é Advogado Geral do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, e eu estou como Deputado ao Parlamento Europeu, na situação privilegiada de vos dizer que é dos mais respeitados, senão o mais respeitado Advogado Geral do tribunal. É português, fala a nossa língua, está no estrangeiro há muito tempo, e como já estamos atrasados, dispenso mais apreciações, sem deixar de, para cumprir as regras, recordar o seu retrato falado.

O hobby é o hedonismo em geral, mas em particular cinema, cozinhar e jogar futebol; a comida preferida, é a que está constantemente a ser reinventada, e dizem que ele reinventa muito bem; o animal preferido é o cavalo; o livro que sugere é “Imperfect alternatives”; e o filme que nos sugere é “Mr. Smith”, Denzel Washington e “Unforgiving”; a principal qualidade que mais aprecia é a honestidade.

Prof. Miguel Maduro a palavra é sua.

 
Prof.Dr.Miguel Maduro
Felizmente que no meu retrato falado não disse que a principal qualidade que eu apreciava era a pontualidade, senão tinha sido um início complicado. (Risos)

Peço imensa desculpa pelo atraso, eu estou em trânsito de certa forma para o Luxemburgo, o que é a única desculpa que eu posso avançar.

Em primeiro lugar muito obrigado pelo convite para intervir nesta audiência que parece extremamente interessante e variável.

E, o tema que me foi proposto abordar, tem a ver com a União Europeia e pensei fazer de certa forma um retrato global sobre a União Europeia, centrado naquilo que é frequentemente o juízo e a discussão que tem existido no contexto da União Europeia, sobre os problemas de legitimidade que enfrenta o processo de integração europeia.

Normalmente, esse tipo de debate é centrado e é dominado pela retórica do défice democrático, e de forma que eu farei alguma referência a essa questão. Mas fundamentalmente aquilo que pretendo fazer convosco é uma análise global sobre os desafios da União Europeia, enquanto entidade que procura um certo modelo de construção política, um certo modelo de organização de política, um certo modelo de organização do seu poder, e das dificuldades que tem de encontrar pontos de referência, relativamente a esse modelo de organização do poder.

Porque frequentemente o modelo tradicional democrático, centrado na ideia do Estado-Nação, não assenta muito bem naquilo que é a União Europeia.

Fundamentalmente irei abordar convosco duas questões, em primeiro lugar, a relação entre a própria União Europeia e a democracia nacional, a democracia dos Estados Membros, que impacto é que a União Europeia tem a nível dos processo de governação dos Estados, dos mecanismos de organização democrática dos próprios Estados Membros, e procurar demonstrar aí que o impacto globalmente, é extremamente positivo. E que a União Europeia, ao contrário da retórica habitual sobre o défice democrático, constitui um superavit democrático em relação aos processos democráticos nacionais, em muitas circunstâncias - irei dar alguns exemplos disso.

Mas também demonstrar as dificuldades que a União Europeia tem, em conjugar e em suplementar a essa relação democrática, que estabelece com os Estados Membros, uma organização democrática das duas próprias formas de exercício de poder.

Esta crise, de que frequentemente hoje se fala no contexto da União Europeia, e simbolizava os problemas relativos ao Tratado Constitucional, de que vocês têm seguramente conhecimento, é frequentemente descrita como uma crise existencial, que se exprime também uma certo eurocepticismo, atribuído a muitas das opiniões públicas europeias de muitos dos Estados Membros, relativamente ao processo de integração europeia.

E essa caracterização quase existencial, de uma crise de natureza existencial, no contexto da União Europeia, ela é praticamente definida dessa forma, na chamada “Declaração sobre o Futuro da Europa”, que era a declaração que deu origem ao processo de tipo constituinte, que por sua vez resultou no Tratado Constitucional. Levou-me a encontrar uma metáfora que procurasse descrever os desafios da União Europeia e a natureza da sua relação com a Democracia, através duma obra muito conhecida, que é uma obra, precisamente, que se inicia por um momento claramente existencial. E essa obra é “A divina comédia”, do Dante.

Na “Divina Comédia” do Dante, para aqueles que conhecem, o Dante começa por dizer que está “nel mezzo del caminn”, no meio do caminho da sua vida, e que tem duas vias, praticamente, duas opções, duas alternativas, que pode eventualmente seguir.

Mas o que é mais interessante na “Divina Comédia do Dante”, do meu ponto de vista, é a relação, a metáfora que existe subjacente a toda a obra, em que basicamente ele passa pelo purgatório, pelo inferno até chegar ao paraíso, e no fundo, isso é um retrato social da Itália, das diferentes categorias sociais, e do percurso da sua vida e dos desafios que os seres humanos têm na sua existência. E nessa obra, na Divina Comédia, o Dante, é acompanhado e é levado através do purgatório e do inferno, passa os diferentes níveis do purgatório e do inferno por um personagem que é Virgílio, que era um poeta, e que era a imagem da razão. Portanto, para ultrapassar todos os diferentes círculos, as dificuldades do purgatório e do inferno, ele necessita da razão. Mas Virgílio, curiosamente, não pode entrar no paraíso, porque pessoas apenas dotadas de razão não têm acesso ao paraíso, dizia a obra do Dante.

E quem é que confere a entrada no paraíso? Quem é que aguarda Dante à entrada do paraíso e o faz entrar no paraíso? Normalmente, neste caso, sempre uma mulher, e  essa mulher é Beatriz, que era a paixão da vida de Dante, ela morreu, muito nova, mas era a paixão da vida de Dante, que ele utiliza como personagem nessa obra

Há aqui uma metáfora, que é uma metáfora da relação entre a razão e a paixão. No fundo, ele estabelece uma relação necessária, entre a capacidade cognitiva que é fornecida pela razão e a emoção que é necessária para desfrutar da vida, e para atingir realmente o paraíso que é depois, neste caso, simbolizado em Beatriz.

E eu quero utilizar essa metáfora, essa relação entre paixão e razão, para compreender também a natureza da Democracia e a relação da Democracia com a União Europeia.

No fundo, as democracias para serem bem sucedidas precisam também de paixão e de razão. A paixão no fundo, identifica as nossas preferências pessoais e as nossas pré-compreensões subjectivas que motivam, por exemplo, a participação no processo político.

Mas simboliza também, frequentemente a natureza da relação que temos enquanto cidadãos, com uma comunidade política particular, que nos leva a manter a lealdade, a permanecer membros dessa comunidade política, mesmo quando os resultados de um processo político concreto, por exemplo, de umas determinadas eleições, não correspondem às nossas preferências.

São elementos também de natureza fortemente de pré-compreensão, que podem ter a ver com história, com religião, até com caracteres étnicos, por exemplo. Mas não são frequentemente elementos racionais. Nós podemos reconstruir a nossa adesão a uma determinada comunidade politica, nós podemos reconstruir as preferências que prestamos num processo político em termos racionais.

Mas frequentemente a sua base não é puramente racional, a nossa adesão a elas não é puramente racional.

Por sua vez, a razão, na Democracia, pode simbolizar ou corresponde à linguagem do processo deliberativo, aos processos e às regras impostas no sistema democrático, de forma a que ele, - de forma muito sumária, depois vou desenvolver isto -, internalize, incorpore nas suas decisões, todos os custos e benefícios das mesmas. No fundo, isto é também a natureza da relação, a razão corresponde à função daquilo que – eu sou alguém de uma origem, enquanto jurista, do direito constitucional -, um pouco à função do constitucionalismo que as normas constitucionais têm num sistema democrático: é assegurar os elementos racionais para o funcionamento do sistema democrático.

Deixem-me explicar porque é que a democracia necessita destes dois elementos, e quais são as consequências disso, e depois veremos a relação com a União Europeia.

A Democracia pode ser definida de forma muito sumária, - vou ser bastante breve, relativamente a este aspecto – com referência à ideia de auto-governo. Aqui a oposição é entre heteronomia e autonomia, a Democracia visa salvaguardar a autonomia, o governo próprio, por nós próprios. E daí que, frequentemente, a Democracia é reconduziada a uma ideia de liberdade, de protecção de autonomia individual. É entendida, para utilizar uma frase célebre de Rousseau, como o único mecanismo do governo ou o mecanismo do governo que mais respeita a liberdade. Porquê? Porque como dizia Rousseau, obediência às leis que impomos a nós mesmos é liberdade.

Mas mesmo que não se veja na liberdade o ponto fundador ou o ponto de partida para a justificação de um sistema ou de uma forma de governo democrática, e se veja sim na igualdade, isto implica em qualquer um dos casos, que o elemento fundamental do sistema democrático e da forma do governo democrático, é o reconhecimento de uma igual dignidade política a todos os cidadãos. Ponto fundamental, de base, de uma forma de governo democrática, é a ideia de reconhecimento a todos os cidadãos de uma igual dignidade política.

Ora, isto tem várias consequências. A primeira, é que a Democracia, esta ideia de igual reconhecimento de uma dignidade política não é meramente uma ideia de igual forma de participação no processo político, é muito mais do que isso.

A Democracia, em primeiro lugar, não é simplesmente um contar de cabeças, não corresponde meramente a um igual direito de participação, através do voto, por exemplo, no sistema democrático, mas exige, igualmente, que o impacto diferenciado de diferentes decisões em diferentes cidadãos, seja tido em conta.

E é isto que reflecte igualmente, a ideia de representação. A ideia de representação reflecte igualmente esta exigência de que as decisões democráticas não devem apenas exprimir uma soma ou uma maioria das preferências de cada um, mas essas preferências devem corresponder também ao impacto diferenciado que certas decisões podem ter.

E nós temos muitos exemplos, nos mecanismos através dos quais o constitucionalismo organiza a democracia, que visam exprimir isso. Os direitos fundamentais, de certa forma, correspondem a dar um peso preferencial a certos cidadãos relativamente a certas decisões. Mas igualmente a organização do sistema democrático, não apenas, ou até, não fundamentalmente através de mecanismos de democracia directa, mas através de mecanismos de Democracia representativa.

Eu não posso entrar nesse ponto aqui, mas depois podemos no debate falar disso.

Mas a democracia representativa por oposição à democracia directa. Que é uma democracia claramente baseada em jogos de soma 0 e, portanto, num puro contar de cabeças, como eu dizia, é um modelo de organização democrática, de apuramento da vontade democrática, que atende, de forma mais apropriada a esse impacto diferenciado que possíveis decisões podem ter.

Uma segunda consequência importante desta noção mais ampla e complexa da Democracia, é que necessitamos de atender à circunstância que a Democracia tem lugar num tempo e num espaço.

O que é isto significa? Significa que a Democracia tem lugar e exerce, por referência, a uma determinada jurisdição geográfica ou jurisdição temporal. Não todas as pessoas, têm hoje direito de voto, têm que ser maiores de idade, por exemplo. E isto significa que a jurisdição de representação de hoje, a comunidade política que vota hoje democraticamente certas decisões, está a decidir certas matérias que têm impacto noutros cidadãos que ainda não votam, por exemplo, as gerações futuras. Este é um dos problemas fundamentais da democracia que temos hoje em dia. É que aquilo que é democrático hoje, pode não ser democrático no sentido em que vai alterar, por exemplo, a capacidade deliberativa de gerações futuras.

Portanto, há frequentemente assimetrias temporais nos sistemas democráticos.

Outro problema é geográfico, como vos dizia. Frequentemente e, hoje em dia, neste Mundo globalizado, para utilizar um cliché, e interdependente, certas comunidades políticas decidem certas questões que têm impacto noutras comunidades políticas. E os cidadãos dessas outras comunidades políticas frequentemente não têm voz nesses processos democráticos, que afectam os seus interesses.

Terceiro ponto importante a que é necessário atender é que, e para o qual é importante a manutenção e a importância a dar a essa racionalização do sistema democrático, é que a Democracia enquanto espaço de compatibilização, de diferentes interesses de sujeitos dotados de igual dignidade política, exige igualmente instrumentos de deliberação associados a uma racionalização do espaço público e do processo político. Essa compatibilização de interesses, exige que haja um espaço de debate e que esse espaço de debate funcione e tenha mecanismos que possam ser partilhados por todos.

Ora, a razão é a única linguagem susceptível de que, ainda que de forma imperfeita, ser partilhada por todos, e como tal, ser susceptível de constituir a base de um espaço e discurso público inclusivos.

Igualmente é a razão que garante o pluralismo político no sistema democrático. Porque é ela que estabelece a conexão, uma conexão efectiva entre democracia e liberdade política. Na medida em que, é através do uso da razão, e legitimando-nos dessa forma, que podemos fundamentar o exercício da crítica e, de certa forma, falsificar as verdades contextuais, predominantes num determinado sistema político.

Por outro lado, se o sistema democrático necessita de pluralismo político e necessita claramente de pluralismo político, necessita de confronto de ideias, de oposição de ideias, o risco do pluralismo político, se ele se torna radical, é que ele se transforme num mero confronto de forças, de poderes.

Ora, é a utilização de uma linguagem de um discurso que permite reconduzir esse pluralismo político a uma forma viável de funcionamento de um sistema democrático. E de novo aí, os processos de racionalização do sistema democrático, são fundamentais, para que o pluralismo político seja conduzível a objectivos que permitam a manutenção e a progressão de uma determinada comunidade política e não se torne destrutivo dessa mesma comunidade política e do seu sistema democrático.

De forma sucinta, podemos dizer que as decisões democráticas devem ser livres, informadas e inter-subjectivas, no sentido de que, a nossa posição no sistema democrático deve ser constituída e formada em diálogo com os outros. Em debate com os outros. E que todos estes mecanismos, todos estas condições necessárias à formulação de boas decisões democráticas, exigem uma racionalização do sistema democrático.

Ora, há diferentes instrumentos que visam promover a racionalização dos processos democráticos.

O constitucionalismo, como vos disse, é em larga medida um instrumentos dessa racionalização do sistema democrático.

E o projecto de integração europeia, é desde a sua origem, sobretudo, um processo de racionalização das democracias nacionais. E, nessa medida, é um processo mais dominado pelo constitucionalismo do que pela democracia; mais dominado por preocupações de natureza constitucional do que preocupações de natureza democrática.

 

(Um minuto inaudível)

 

Ora, em larga medida, essa função de racionalização dos processos democráticos nacionais, exercida pelo processo de integração europeia, pertence até ao código genético originário da União Europeia. Se vocês pensarem, o processo de integração europeia surge na sequência da 2ª Guerra Mundial, e precisamente para dominar, moderar, controlar os excessos que eram bem conhecidos nessa altura provenientes das paixões nacionais. Desde o início que ele é dominado não pelo objectivo de construção no espaço democrático deliberativo a nível europeu, mas sim por uma racionalização, por uma moderação das democracias nacionais.

E nessa área o processo de integração europeia tem, ao contrário do que muitas vezes se entende, trazido um profundo valor democrático acrescentado às democracias nacionais, aos sistemas políticos nacionais. Ele tem em muitos domínios reforçado e expandido as próprias democracias nacionais. E permitam-me dar três exemplos dessa função democrática do processo de integração europeia, relativamente às democracias nacionais. Três áreas em que a União Europeia claramente se traduz num reforço do valor democrático dos próprios processos deliberativos nacionais. A primeira tem a ver precisamente com a questão que eu referi antes do problema da democracia ser frequente de existirem assimetrias democráticas, entre a definição daqueles que participam numa determinada deliberação democrática e aqueles que são objecto ou que sofrem as consequências dessa decisão.

Ora, as democracias nacionais (sempre o tiveram) mas têm crescentemente externalidades, impacto noutras comunidades políticas nacionais. Por outras palavras, as decisões democráticas de uma determinada comunidade política nacional frequentemente afectam os interesses de cidadãos de outros Estados. A União Europeia pode ser entendida nesta matéria como criando um vínculo político entre as diferentes comunidades políticas nacionais, que as obriga a mutuamente abrir as suas democracias aos cidadãos de outros Estados Membros.

Princípios como as liberdades de circulação, o princípio de não discriminação com base na nacionalidade, por exemplo, podem ser vistos como basicamente dando direitos de representação aos cidadãos de todos os Estados na União Europeia nos processos democráticos de cada um desses Estados. Pensem, por exemplo, a nível dos processos legislativos, questões ambientais que têm impactos transfronteiriços. Hoje em dia muitas dessas questões já são alvo de serem transferidos do processo deliberativo, da democracia de um Estado para o espaço europeu. Essas questões ambientais que têm impactos transfronteiriços estão sujeitas à deliberação de um leque muito mais alargado de interesses.

E, portanto, há uma maior correspondência entre a jurisdição daqueles que são afectados por essas decisões, que regulam questões ambientais que têm um impacto transfronteiriço e aqueles que participam nessas decisões. Por exemplo, nessa matéria a União Europeu claramente se traduz frequentemente num reforço democrático relativamente a esses processos decisionais. Mas, mesmo, relativamente a matérias que permanecem no domínio dos Estados, a União Europeia através de princípios como a não discriminação com base na nacionalidade, mas outros também, frequentemente obriga, hoje em dia, os Estados-Membros, a decidirem essas questões já não atendendo apenas aos interesses dos seus nacionais mas também à medida em que essas decisões podem afectar os interesses de nacionais de outros Estados-Membros. Eu lembro-me do exemplo, um dos casos mais clássicos em matéria de Direito Comunitário das liberdades de circulação, que no fundo garantem a circulação das mercadorias, dos serviços, das pessoas no contexto para a criação de um mercado único, ou de mercado interno no seio da União Europeia, um dos casos mais clássicos era um caso Cassis de Dijon. Tinha a ver com uma proibição na Alemanha de venda, como licores, de bebidas alcoólicas com menos de 23º, se me recordo bem. Basicamente, a Alemanha dizia: se uma bebida tem menos de 23º não pode ser vendida como licor porque os consumidores alemães têm uma certa expectativa do que é um licor, ou seja, licor no sentido de liqueur, têm uma expectativa de uma bebida com certo grau alcoólico. E havia produtos, no caso concreto que era um produto francês que era o Cassis Dijon, que era um licor francês, mas que tinha um teor alcoólico mais baixo. Acontece que esse licor francês não podia ser vendido na Alemanha como licor, poderia ser vendido como outro tipo de bebida, mas não beneficiando da caracterização como licor, da denominação como licor. Ora, a Alemanha, considerava que isto não era nenhuma violação das liberdades de circulação, porque dizia a nossa legislação não é discriminatória, ninguém na Alemanha pode vender um licor produzido na Alemanha como licor que tenha menos de 23º, portanto nós não discriminamos nada contra os nacionais dos outros Estados-Membros. No entanto, o Tribunal de Justiça considerou que havia uma restrição à livre circulação de mercadorias, que aquela norma não era válida à luz do Direito Comunitário. Porquê? Porque para o Direito Comunitário já não é suficiente que um Estado não discrimine contra os cidadãos de outros Estados. É necessário que quando ele delibera por exemplo, sobre questões que regulam o mercado, atenda também às diferentes tradições de regulação de outros Estados-Membros. E no fundo o que acontece, o que impôs o Tribunal de Justiça é dizer à Alemanha: não, a Alemanha agora ao decidir por exemplo, sobre as características que as bebidas alcoólicas podem ou não ter, já não pode decidir só de acordo com aquilo que são as tradições dos seus consumidores, e com as práticas de produção no seu mercado nacional. Tem de atender a que está a decidir com impacto num mercado muito mais amplo, portanto tem de atender à circunstância de que há quem produza produtos similares de forma diferente noutros Estados–Membros.

E há frequentes exemplos nessa matéria no Direito Comunitário. Ainda recentemente o Tribunal relativamente à Alemanha numa situação semelhante, no que dizia respeito à venda através da Internet de produtos, de medicamentos de venda livre, que a Alemanha de novo dizia que não era discriminatória, nós proibimos a venda pela Internet de qualquer medicamento de venda livre, nenhuma empresa que venda pela Internet o pode fazer também. E o Tribunal de novo considerou que isso não era admissível. Porquê? Porque disse que isso não atendia à circunstância de que para as farmácias on-line de outros Estados-Membros não teriam outros mecanismos de acesso ao mercado alemão que não aquele. E, portanto, de novo o Tribunal impediu aquele Estado-Membro, naquele caso a Alemanha, de decidir de uma forma isolada.

Um Estado, hoje em dia, ao legislar, tem de legislar atendendo às possíveis consequências que o exercício do seu poder legislativo ou do seu poder regulador tem também noutras comunidades políticas nacionais. E daí que, uma das primeiras consequências do direito da União Europeia é essa expansão do leque de interesses que têm de ser representados no quadro dos processos deliberativos nacionais, e daí essa ideia que eu vos dizia de expansão das democracias nacionais, de correcção de problemas de externalidades das democracias nacionais. Há aí um reforço do valor, há um reforço da democracia em relação aos cidadãos, porquê? Porque o Direito Comunitário confere-nos agora um direito a ver os nossos interesses representados nas decisões democráticas de outros Estados-Membros.

Mas o direito da União Europeia e a União Europeia têm também uma função importante em termos de racionalização dos processos democráticos de forma puramente interna, por exemplo. Em muitos aspectos, a União Europeia tem servido para proteger as democracias nacionais de si próprias. Pensem por exemplo, em circunstâncias em que os sistemas democráticos nacionais frequentemente têm problemas de funcionamento devido a uma grande disparidade entre a concentração de custos e benefícios de decisões.

Na ciência política isto é uma questão bastante conhecida, que se demonstra que uma das circunstâncias em que há frequentemente mais problemas de captura dos processos políticos, é quando existem interesses muito concentrados de um lado e, por outro lado, interesses muito difusos. Em que, por exemplo, os benefícios estão muito concentrados num pequeno grupo de actores, e os custos estão muito difusos no resto da comunidade. Porquê? Porque frequentemente esse pequeno grupo de actores tem um incentivo através da concentração de interesses para agir de forma muito activa na defesa dos seus interesses, e aqueles que vão pagar os custos estando esses custos tão disseminados não se apercebem sequer de que os vão pagar. E portanto, frequentemente o sistema político é susceptível de ser dominado, de ser controlado, de responder de forma preferencial a esses interesses concentrados.

Ora, a União Europeia frequentemente nalgumas das formas como age face aos Estados-Membros corrige problemas desse tipo. Pensem, por exemplo, na proibição de auxílios do Estado, que é uma questão que vocês já devem ter ouvido falar imenso nos jornais, já aconteceu várias vezes com Portugal. Em princípio há uma proibição de concessão de auxílios de Estado, mas auxílios de Estado selectivos, se um Estado por exemplo tem um imposto em geral sobre as empresas mais baixo, isso é admitido pelo Direito Comunitário face a outro Estado. Mas se um Estado concede a uma determinada empresa, ao sector produtivo uma redução face ao imposto geral, isso já não é permitido, isso é um auxílio do Estado que em princípio só é admissível se a Comissão o autorizar, à luz de certos interesses que são reconhecidos como legítimos pelo Direito Comunitário.

Ora, a proibição do auxílio de Estado feita pelo Direito Comunitário, – que é uma coisa que por exemplo não existe no sistema federal americano, em que os Estados os podem fazer, em princípio –, têm uma justificação democrática face aos próprios sistemas democráticos nacionais.

Porquê? Trata-se de controlar circunstâncias em que frequentemente os sistemas democráticos nacionais sofrem desses problemas de funcionamento, em que há interesses muito concentrados de um lado e os custos estão disseminados pela comunidade, pelos cidadãos em geral, que não se apercebem dele. A maior parte dos auxílios de Estado não têm qualquer justificação do ponto de vista de qualquer interesse social ou económico. Acontece frequentemente que eles são concedidos pelo Estado, porquê? Porque o sistema político não tem capacidade de dizer não quando face a um interesse muito concentrado, por exemplo, de uma fábrica que está em dificuldades e que faz imenso barulho e menos protesto político e, por outro lado, toda a gente diz: bem qual é o problema de se dar 2 milhões, porque o custo ninguém sabe bem quem é que vai pagar aquilo. O custo está tão disseminado pelo resto da comunidade que frequentemente essas decisões são tomadas.

Ora, o Direito Comunitário ao controlar esse auxílio de Estado, no fundo, está a ajudar os próprios processos democráticos nacionais. Está a corrigir problemas de funcionamento que existem nos sistemas democráticos nacionais. De certa forma, eu costumo ensinar aos meus alunos de Direito que, a proibição de auxílios de Estado é frequentemente um auxílio aos próprios Estados.

Há outros aspectos em que isso sucede. A vontade política – e vocês provavelmente sabem isso melhor do que eu, estando pelo menos alguns de vocês mais próximos do sistema político –, é um recurso limitado, tal como a nossa vontade individual. E é frequente, aliás, é perfeitamente compreensível que num sistema político, os governantes frequentemente prefiram transferir os custos políticos de certas decisões para mais tarde. Para não sofrerem as consequências em termos de responsabilidade política numas eleições.

Ora, da mesma forma que a Constituição tem mecanismos para evitar isso, o direito da União Europeia também funciona. Pensem na União Económica e Monetária e nos limites aos défices orçamentais que ela estabelece e que nós conhecemos muito bem em Portugal. No fundo, do que se trata aí, é verdade que se limita, de certa forma, a nossa liberdade deliberativa da nossa geração, de hoje em dia. Porquê? Porque nós, por exemplo, não podemos endividar-nos tanto como gostaríamos para construir os aeroportos, os estádios, o que nós quiséssemos. Mas essa limitação a essa liberdade deliberativa, se quiserem, existe para quê? Para salvaguardar a liberdade deliberativa das gerações futuras. Porque quanto mais nós nos endividarmos agora, maior é o nosso espaço de decisão democrática, é verdade, mas menor será o espaço de decisão democrática das gerações futuras. Portanto, esses critérios que disciplinam o sistema político hoje em dia, e o nosso sistema democrático hoje em dia, destinam-se a salvaguardar a garantir de certa forma o funcionamento do sistema democrático no futuro, a liberdade de deliberação democrática das gerações futuras. E aí têm mais um exemplo de como a União Europeia pode ser vista como tendo essa função, de racionalização dos sistemas democráticos nacionais para garantir na realidade uma verdadeira democracia a longo prazo.

Outro exemplo dessa função de racionalização das democracias nacionais tem a ver com a circunstância de que muitas vezes as democracias nacionais ficam se quiserem congeladas. Frequentemente há legislação que é adoptada, e quando é adoptada faz todo o sentido do ponto de vista social, mas ao manter-se em vigor frequentemente desactualiza-se, pode deixar de fazer sentido; mas ao mesmo tempo que se desactualiza, frequentemente também ela criou já uma comunidade de interesses estabelecidos e um conjunto de práticas sociais que são resistentes à mudança. Ora, a União Europeia ao criar um novo espaço deliberativo perante o qual podemos questionar algumas das políticas nacionais, ao exigir através de muitas das normas do Direito Comunitário aos Estados uma justificação acrescida face à manutenção de certas políticas nacionais, como que reintroduz a racionalização e uma verdadeira capacidade deliberativa nas democracias nacionais. Redesperta as democracias nacionais nessa matéria.

Em terceiro lugar, a dimensão desse valor democrático acrescentado que a União Europeia tem relativamente às democracias nacionais. E esse tem a ver fundamentalmente com a perda de capacidade de controlo que os Estados têm sobre certos processos de decisão, sobretudo os que têm a ver com processos transnacionais, seja com os fluxos de capitais internacionais, com o crime transnacional, mas também com emergência de entidades reguladoras, com autonomia de regulação, novos entes de regulação de actividades que têm dimensão transnacional. Frequentemente, um Estado isoladamente já não tem capacidade de controlo sobre esses fenómenos, sobre fenómenos simples de circulação de capitais a nível transnacional, sobre fenómenos de criminalidade internacional, e é a União Europeia que veio conferir de novo aos Estados alguma capacidade de controlo, e portanto, reintroduzir-nos a nós cidadãos algum controlo democrático sobre esses processos. Pensem por exemplo, em grandes multinacionais e na dificuldade que um Estado pequeno como Portugal teria de impor a certas grandes multinacionais a compatibilidade com certas normas da concorrência. Seria extremamente difícil. Muitas vezes uma grande multinacional seria ao contrário, teria quase um efeito de chantagem sobre o nosso Estado. Diziam, ai não querem? “Vão-nos aplicar uma sanção em matéria de concorrência?” “Então saímos do vosso mercado”. E nós podíamos estar tão dependentes – e não quero aqui dizer nomes, nem posso –, da tecnologia por exemplo dessa multinacional que não teríamos outra alternativa senão capitular.

Há certo tipo de matérias sobre as quais só conseguimos ter controlo democrático a nível europeu. Permitam-me dar-vos um outro exemplo relativamente a uma matéria, que vocês conhecem seguramente, e que é talvez o processo em matéria de Direito Comunitário que se tornou mais famoso perante a opinião pública, que é o Acórdão Bosman. Já todos ouviram falar do Acórdão Bosman relativamente à livre circulação dos jogadores de futebol. Que veio determinar, no fundo, que havia certas normas que não eram dos Estados, eram da FIFA e da UEFA, entidades de regulação do futebol, que eram incompatíveis com o Direito Comunitário, com a livre circulação. Que normas eram essas?  Para além das normas relativas às quotas nacionais de jogadores, fundamentalmente era a norma que impedia um futebolista de fazer um contrato com outra equipa de futebol, mesmo tendo terminado o seu contrato de futebol com uma equipa anterior. Ou seja, o passe de um jogador era necessário para a sua transferência para outra equipa mesmo no fim do seu contrato de trabalho. Portanto eles não tinham a liberdade de contratação que tem qualquer outro trabalhador. Ainda hoje continuam a não ter. Mas há excepções que o Tribunal considerou que podiam ser admissíveis e outras que não.

Se vocês falassem com muitos juristas portugueses em matéria de direito de trabalho, muitos deles diriam que essa norma provavelmente não era compatível com a Constituição portuguesa, há aqui alguém que seguramente melhor do que eu poderia tomar uma posição a esse respeito, mas muitos seguramente diriam que essa norma poderia não ser compatível com a Constituição portuguesa, e em muitos outros Estados-Membros seria assim. Mas nunca ninguém colocou em causa, ou melhor, nunca houve um Tribunal nacional que declarasse a incompatibilidade daquelas normas da FIFA e da UEFA com a respectiva legislação nacional em matéria de direito de trabalho ou normas de direitos fundamentais. A explicação é muito simples provavelmente: é que das poucas vezes que houve tribunais nacionais de Estados isoladamente, que tentaram colocar em causa decisões da UEFA e da FIFA, o que é que aconteceu? Vocês já ouviram falar das circunstâncias. A UEFA e a FIFA limitaram-se a dizer a esse Estado isolado, que podia ser a Grécia, podia ser Portugal, ou França: ai querem colocar em causa as nossas normas? Estão excluídos do próximo campeonato da Europa, estão excluídos do próximo campeonato do Mundo. E é óbvio que nessa circunstância os sistemas judiciais nacionais, os sistemas jurídicos nacionais recuam e dizem não, vamos reconhecer autonomia de gestão do ordenamento desportivo por parte da FIFA e UEFA. Curiosamente, no processo Bosman, a FIFA e a UEFA não disseram isso, não vieram dizer que a União Europeia estaria excluída. Porquê? Porque não podiam dizer que Portugal, França, Reino Unido, Espanha, Itália, Alemanha, Holanda estão todos excluídos do capital da Europa. Não pode. Isto é um exemplo claro de uma matéria que na realidade o direito da União Europeia não diminuiu ou limitou a soberania do Estado, pelo contrário, veio reforçar a soberania do Estado, veio reinstituir a soberania do Estado perante uma entidade supranacional que os Estados individualmente já não conseguiam controlar. E, portanto, têm aqui um exemplo claro, em que relativamente a certos processos transnacionais a União Europeia claramente se traduz num valor democrático acrescentado face aos Estados-Membros.

Depois desta visão paradisíaca da relação entre União Europeia e democracias nacionais, podemos questionar-nos de onde vêm então os problemas com a democracia a nível da União Europeia. A questão fundamental é esta: é que na prossecução destas tarefas democráticas, ou nestas tarefas de racionalização do sistema democrático nacional a União Europeia foi também (isso era inevitável) assumindo um crescente poder e autoridade política e normativa perante os Estados, e muitos entendem que essa autoridade e poderes não estão suficientemente legitimados nem controlados.

Como é que a União assumiu esse poder e autonomia? E de que forma é que se manifesta esse elevado grau de poder e de capacidade decisória que a União tem hoje em dia? Três aspectos que configuram essa expansão do poder e autoridade política da União face aos Estados-Membros, de forma muito breve.

O primeiro, é um crescimento progressivo das competências comunitárias e das competências da União Europeia. A União Europeia tem visto crescerem as suas competências, mas aqui só um breve parêntesis para dizer que frequentemente, e é uma questão que me parece ser interessante para vós, o crescimento dessas competências não é função dinâmica europeia de apropriação de competências pelas instituições europeias. Grande parte do exercício da actividade legislativa que tem lugar a nível europeu é na realidade produto de dinâmica política interna dos Estados-Membros. Isto é muito importante para entender a relação entre União Europeia e os Estados-Membros como dois níveis diferentes do exercício da actividade política. O que é que acontece (há estudos que demonstram isso) apesar de formalmente as iniciativas legislativas da União Europeia terem de ser provenientes da Comissão Europeia, materialmente, no fundo, a maior parte delas, mais de 80%, são promovidas pelos Estados-Membros, governos nacionais que pedem à Comissão Europeia que faça uma iniciativa legislativa naquele documento. Mais de 80%, e depois os Estados-Membros queixam-se que a União Europeia legisla demais. A razão é simples, é que frequentemente os governos nacionais por exemplo, podem utilizar a União Europeia para tentar escapar ao controlo político dos parlamentos nacionais. Imaginem um governo nacional que é minoritário a nível nacional, que tem dificuldade em fazer aprovar certas medidas no seu parlamento nacional, mas por outro lado sabe que a posição que defende relativamente a uma determinada política é partilhada por outros governos de outros Estados-Membros, pode tentar promover a adopção dessa legislação a nível da União Europeia, é natural que o faça.

Para um qualquer actor político ou social a União europeia é, simplesmente, um outro nível de decisão, através do qual pode tentar obter a satisfação das suas preferências. E o que acontece é um jogo, uma dinâmica entre esses dois níveis de decisão. Daí que seja muito difícil, e isso acontece com os governos a esse nível, mas também acontece com os governos, por exemplo, para evitarem os custos políticos de certas decisões. Eu lembro-me que uma vez uma das questões que esteve para ser discutida na União Europeia era uma legislação que penalizasse as ocupações de estradas. É fácil criar uma relação, uma justificação para dizer que isso é uma questão do Direito Comunitário. Porquê? Porque as ocupações de estradas também impedem a livre circulação de mercadorias, se forem junto de uma fronteira. Mas, na realidade, em termos políticos o que está em causa é que vários governos nacionais foram confrontados com essa questão, mas os custos políticos de a regular a nível nacional, de terem eles o ónus de regular isso são muito elevados. Em Portugal, imaginem se um governo, ou se tentasse fazer isso, era o regresso do salazarismo, fascismo, tudo isso. Portanto, é mais fácil tentar fazê-lo a nível da União Europeia e depois diz-se: não somos nós, é a União Europeia que está a adoptar essa decisão. Mas isto que fazem os governos faz qualquer outro actor social e político. Sindicatos que acham que a legislação nacional não corresponde aos seus interesses; ou empresas ou grupos económicos que acham o mesmo, e que a nível nacional estão no fundo numa posição minoritária no processo democrático nacional, tentam utilizar o nível de decisão europeia. Fazem coligações com outros actores sociais a nível europeu para tentar promover essa política. É por isto que a questão do controlo das competências ao nível da União Europeia não pode ser decidida, nem pode ser, nem é uma questão de um debate de jurisdições, de conseguirmos elaborar normas jurídicas que definam de uma forma clara que competências é que devem ser exercidas pela União Europeia e pelos Estados. É fundamentalmente um problema de assegurar as condições de responsabilização política, e de participação de todos os grupos de interesses nesse processo de decisão.

Uma segunda forma de crescimento desse poder e autoridade política e normativa da União Europeia, tem a ver também com a forma como as competências se têm exercido a nível da União Europeia. A União Europeia podia ter uma grande expansão das suas competências, mas enquanto elas continuassem a ser exercidas através da unanimidade, um Estado poderia sempre controlá-las na mesma, bastava que vetasse o processo de decisão. Ora, acontece que o exercício das competências a nível da União Europeia, cada vez mais está sujeito a regras de decisão por maioria. Isso significa que o grau de controlo nacional sobre aquilo que é decidido na União Europeia também é limitado.

A terceira face deste processo de europeização tem a ver com o controlo exercido pela União Europeia sobre muitas políticas nacionais. Há muitas esferas de política, ambiental, de saúde, de educação que continuam sobretudo no domínio dos Estados, ou partilhado entre a União Europeia e os Estados, mas mesmo quando são os Estados que ainda têm essas competências, o exercício dessas competências é hoje em dia muito condicionado pelas normas comunitárias. O exercício das funções de governação por parte dos Estados é, hoje em dia, sujeito a muitos limites. Posso dar-vos exemplos de matérias que vocês nunca imaginariam à primeira vista que tivessem uma relação com as normas da liberdade de circulação, as que visam garantir a criação de mercado interno, mas que já foram analisadas no seio do Tribunal. Não vou entrar em detalhes em relação a elas, mas só para vos alertar para a esfera de possíveis competências dos Estados que são afectadas: questões relativas à organização do trabalho nos Estados-Membros; questões relativas por exemplo à abertura dos hipermercados; questões relativas mesmo ao aborto, por exemplo. Já a questão da proibição do aborto, de ir a outro Estado-Membro fazer um aborto já foi contestada enquanto possível restrição à livre prestação de serviços.

Eu não estou a dizer, atenção, nestas matérias que o Direito Comunitário determine que essa legislação é válida ou inválida, mas o que acontece é que há um domínio enorme de competências dos Estados que estão hoje em dia sujeitas a um crivo e uma percepção por parte do Direito Comunitário. Seja através de normas de liberdade de circulação ou de outras. Por exemplo, é conhecido que a Comissão utilizou o poder que tem em matéria de auxílios de Estado  (como vos disse em princípio os auxílios de Estado são proibidos, excepto se autorizados pela Comissão com base em certos objectivos definidos no Direito Comunitário). A Comissão autorizou isso para autorizar aos Estados a concessão de certas políticas de auxílios de Estado, mas as condições que impunham eram condições que no fundo determinam a emergência de uma política industrial europeia. Sim, podem ajudar empresas em dificuldade económica mas sujeitos a estes critérios de reestruturação económica. E ao definir todos esses critérios, no fundo a Comissão está a construir uma política industrial europeia, numa matéria em que a competência da União Europeia é bastante limitada.

Ou seja, a União Europeia através de estudos e dos mecanismos de europeização é, hoje em dia, em larga medida, uma comunidade política de fins universais muito semelhantes a um Estado. Neste contexto, é natural assistir-se a um crescente conflito entre a razão europeia e as paixões nacionais. Há uma crescente assimetria entre esta autoridade política e normativa que a União assumiu e a natureza do seu constitucionalismo e a forma algo embrionário do seu sistema democrático.

Ora, o Tratado Constitucional, o falecido ou defunto Tratado Constitucional era para alguns (e foi entendido por alguns) como o instrumento que visava no fundo fornecer, se quiserem, paixão ao processo de integração europeia, corrigir esta assimetria. Mas, aparentemente, ele não foi muito bem sucedido.

Dois pontos muito breves sobre a caracterização do Tratado Constitucional, de forma muito ampla, depois se quisermos no debate podemos falar mais sobre isso. No seu essencial o Tratado Constitucional não alterava a natureza da forma de governo da União Europeia e a natureza ambígua do seu constitucionalismo e da sua relação com a democracia. Isso era, desde logo visível, na própria forma jurídica do Tratado, chamava-se um Tratado que estabelecia uma Constituição. Ou seja, no fundo a sua legitimidade não era proveniente de uma decisão de uma comunidade política europeia, não era um referendo a nível europeu, não bastava uma maioria de Estados; era necessária uma aprovação por cada comunidade política nacional de acordo com os mecanismos clássicos de ratificação do Tratado. Isso significa que a sua legitimidade última se fundava nas diferentes comunidades políticas nacionais, embora depois adoptasse um modelo de governo de tipo constitucional, ou pelo menos assim o dizia. E o segundo aspecto dessa natureza ambígua, para além desta relação Tratado-Constituição, era que no fundo em muitas das normas deste Tratado Constitucional, que em larga medida consolidavam já o acervo existente, e também nos debates que rodearam a própria adopção desse Tratado Constitucional eram visíveis duas visões muito diferentes, duas concepções muito diferentes da função a atribuir a uma Constituição Europeia, de porque é que era necessária uma Constituição Europeia. Para alguns, essa Constituição Europeia devia ser o alicerce de uma verdadeira democracia europeia: promovendo uma identidade comum, a definição dos valores políticos da Europa, e mobilizando os cidadãos europeus na construção e no debate sobre esses valores políticos. Para outros, a função desta Constituição ou desta meia Constituição Europeia, seria, sobretudo, garantir que a União Europeia não iria ameaçar os valores constitucionais dos Estados-Membros.

Nesta segunda visão este Tratado Constitucional, mais que um mecanismo ou um instrumento de promoção da integração política europeia, era um limite a essa integração política europeia.

O que é paradoxal talvez no contexto do Tratado Constitucional é que, é na matéria em que ele mais inovava, – o sistema institucional – que ele foi menos discutido e contestado no contexto dos referendos.

Porque é que falhou o Tratado Constitucional? Bem há as teorias do texto e as teorias do contexto, as teorias do texto assentam fundamentalmente na designação “Constituição”, o que vale um nome não é? Acho que o T. S. Eliot tem um poema muito interessante sobre o valor dos nomes, e o que é que valem diferentes nomes. No fundo esta teoria explica, ou defende que a responsabilidade é toda a atribuir à designação Constituição. Porquê? Porque essa palavra Constituição foi vista como uma ameaça, ou seja alguns cidadãos entenderam que a União ia adoptar uma forma de poder e um modelo de governo semelhante a um Estado e, portanto, haveria uma transferência de soberania excessiva para a União Europeia. Mas foi vista por outros, exactamente no sentido oposto, como uma promessa não cumprida. Ou seja, ah! chamam Constituição a isto mas afinal nós depois começamos a ver e não é bem uma Constituição, e portanto nesta segunda versão é exactamente o contrário, não se foi suficientemente longe.

As teorias do contexto assentam muito, por exemplo, nas situações de políticas nacionais específicas dos Estados onde o referendo falhou, mas também uma outra justificação. Se seguissem por exemplo o debate em França, veriam que numa certa medida o referendo ao Tratado Constitucional foi um referendo ex-post ao alargamento. Porque o debate em França era sobretudo um debate que colocava em causa aspectos do Tratado Constitucional que se limitavam a reproduzir o que já existem hoje em dia nos Tratados da Comunidade Europeia, as questões da liberdade de circulação, por exemplo, o famoso canalizador polaco… (depois descobriu mais tarde que na realidade um ano e meio antes havia um relatório da Associação Profissional dos Canalizadores Franceses que diziam que faltavam 2.000 canalizadores em França, provavelmente esse relatório foi feito numa altura em que era necessário pedir financiamentos para acções de formação profissional, dois anos depois afinal já havia era excesso de canalizadores porque já era para opor aos canalizadores polacos). Fosse por uma razão ou por outra a realidade é que esse debate, que é sobretudo um debate de carácter simbólico, simbolizava o medo, mas não é um medo com o novo Tratado Constitucional, é o medo da aplicação dos anteriores Tratados a uma Europa mais alargada e mais assimétrica do ponto de vista do desenvolvimento económico e social, por exemplo.

Não quero só fazer uma análise crítica, porque isso é normalmente o que nós fazemos no seio da União Europeia sem apontar eventuais pistas diferentes, eventuais alternativas de uma forma diferente de procurar a legitimidade no seio da União Europeia.

A ênfase na procura dessa legitimidade tem até agora sido colocada, sobretudo, na miragem de uma reforma institucional. E é o que eu chamaria uma legitimidade por input. A ideia de que o que é necessário para legitimar o processo de integração europeia é reforçar os mecanismos do seu processo de decisão, fazê-los, torná-los mais semelhantes a um sistema democrático de um Estado de forma a legitimar perante os cidadãos, os cidadãos aceitarem as decisões da União Europeia como legítimas e o poder que a União Europeia entretanto adquiriu.

Isto corresponde à percepção usual de que o problema fundamental da União Europeia está precisamente nesse défice democrático. O que é que é esse défice democrático? Há várias dimensões do défice democrático europeu, a primeira, corresponde fundamentalmente à ideia de que a transferência de competências de um Estado-Membro ou dos Estados-Mmebros para ao União Europeia, corresponde frequentemente a uma diminuição dos poderes dos parlamentos nacionais face aos executivos. Porquê? Porque o processo decisional no seio da União Europeia assenta fundamentalmente, embora cada vez menos, no Conselho, onde são os governos nacionais que predominam. E, portanto, competências que antes podiam estar sujeitas a autoridade sobretudo dos parlamentos nacionais, ao serem transferidas para a União Europeia são transferidas para o domínio dos executivos, e portanto há um reforço do poder executivo face ao poder parlamentar através da transferência de competências dos Estados para a União Europeia. Esta é a primeira dimensão frequentemente atribuída em termos de défice democrático.

O segundo é uma ideia de que o processo democrático na União Europeia está frequentemente refém das minorias, seja nas matérias que decide por unanimidade, seja porque entendem alguns que existe uma sobre representação, ou existiria uma sobre representação de alguns Estados, dos Estados pequenos, sobretudo. Eu tenho muitas dúvidas a esse respeito, isso é uma questão interessante da qual nós podemos falar. Curiosamente, hoje em dia, acho que os Estados pequenos e médios estão menos representados e vão ficar menos representados no seio dos processos decisionais da União Europeia, do que acontece por exemplo no sistema federal americano, há estudos que mostram isso, mas esta era uma das retóricas clássicas que levou ao reforço da representatividade proporcional no seio do próprio Conselho, por exemplo.

O que é que tem sido feito para combater este défice democrático? Bem, o reforço dos poderes do Parlamento Europeu tem sido um dos passos mais frequentemente dados; o outro, o reforço de carácter maioritário do processo decisional no Conselho; o reforço das decisões por maioria qualificada em vez de decisões por unanimidade; e, também o reforço da representatividade proporcional no Conselho, ou seja, o aumento do número de votos e do peso dos Estados mais populosos no seio do Conselho. Igualmente têm sido tomadas medidas de outro tipo, por exemplo, a nível da reforma da chamada governação ou governança europeia, o que lhe quiserem chamar, com ênfase no acesso e na participação ao sistema decisional na União Europeia, tornando-o mais transparente, permitindo mais facilmente aos cidadãos o acesso a informação e exprimir a sua posição no processo decisional, em particular junto da Comissão.

Mas os efeitos destas medidas não têm sido extraordinários, não têm sido particularmente bem sucedidos, e elas próprias, também apresentam problemas e suscitam questões. Por exemplo, o reforço dos poderes do Parlamento Europeu, ao contrário do que se poderia imaginar, e creio que todos imaginavam, não se tem traduzido em mais participação nas eleições europeias, - é um dos paradoxos. Quanto mais poderes o Parlamento Europeu tem tido, menor é a participação dos cidadãos nas eleições do Parlamento Europeu. E este reforço dos poderes do Parlamento Europeu não é simples do ponto de vista democrático. Porquê? Porque de novo trata-se de determinar qual é a maioria relevante, é que ao transferirmos certas decisões democráticas para o Parlamento Europeu a jurisdição democrática é diferente, deixa de ser a jurisdição democrática de um Estado para ser a jurisdição democrática de todos os Estados da União Europeia, a nível da União Europeia, e a democracia implica também determinar qual é a jurisdição relevante para determinar o que é democrático em diferentes circunstâncias. Portanto, a transferência de poderes para o Parlamento Europeu não é uma questão democrática tão simples como isso. O crescente carácter maioritário do processo decisional e a representatividade proporcional do Conselho também apresenta os seus problemas, suscita cada vez mais problemas de protecção de minorias e, eventualmente, no debate podemos ver isso. Há hoje em dia riscos, alguns riscos, de dominação do processo decisional por certos actores dominantes.

No fundo, do meu ponto de vista, eu fui particularmente crítico, estou à vontade apesar de estar hoje em dia no Tribunal, porque antes de ir para o Tribunal escrevi sobre isso, tenho sido particularmente crítico de como o sistema decisional tem evoluído e como as suas reformas têm sido conduzidas, do meu ponto de vista até com uma enorme ignorância relativamente aos princípios de representatividade e como funciona o sistema decisional quando ele é organizado através da agregação por blocos de votos, e não de uma forma clássica.

Exige igualmente a evolução do sistema num sentido cada vez mais maioritário e exige igualmente sistemas de solidariedade. Numa comunidade política nós temos basicamente três condições, de acordo com um estudo muito famoso, um politólogo e economista chamado Herschmann, que garantem a nossa adesão a um certo grupo e a uma certa comunidade que são exit, voice and loyalty, são as três formas de poder que nós temos se quiserem. Exit é termos a possibilidade de não ficar sujeitos à decisão que é adoptada nessa comunidade. Voice é quando já não o podemos fazer, quando temos que estar sujeitos a essa decisão, mas temos uma voz nesse processo decisional, temos uma voz forte, podemos determinar o que é essa decisão. Quando já não temos nem uma coisa nem outra (e é crescentemente o caso na União Europeia) porque frequentemente em muitas matérias a nossa voz é muito diminuída e já não podemos dizer que não queremos cumprir com as decisões da União Europeia, aquilo que garante e é isso que é o problema típica de uma comunidade política organizada de forma maioritária, aquilo que garante a nossa adesão em termos de estabilidade são vínculos de solidariedade, que dizem que mesmo perdendo agora eu sei que a longo prazo eu tenho uma relação estável com esta comunidade que me garante certas vantagens, lógica da solidariedade.

Ora, a União Europeia não sei se assegura já esses mecanismos de solidariedade suficientes para legitimarem e para garantirem de um ponto de vista de aceitação social a sua evolução para um sistema tipo maioritário. É uma ilusão pensar, de certa forma, que apenas através do input, da reforma institucional se pode legitimar a União Europeia, promover paixão relativamente à União Europeia. E isto porquê? Porque a União Europeia não é uma comunidade política tradicional e como tal não pode corresponder ao modelo político tradicional de organização democrática dos Estados-Membros. E mais, será sempre uma comunidade política em concorrência com outras comunidades políticas, que são as comunidades políticas nacionais. E isto determina que parte da sua legitimidade democrática terá de ser sempre derivada dos Estados, e por outro lado que a definição do nível democrático para decidir diferentes decisões será sempre contestada. Mesmo que em abstracto nós pudéssemos desenvolver um sistema institucional, que considerássemos que fosse por si só suficiente para garantir a legitimidade social e democrática necessária ao bom funcionamento da União Europeia isso não seria possível de ser adoptado. Porquê? Porque o processo constituinte (o processo de revisão dos Tratados da União Europeia) é hoje extremamente rígido, é isso que transformou a dificuldade de adopção deste Tratado reformador.

Hoje em dia há tantos Estados que têm posições negociais já estabelecidas e vantagens em certas matérias e o processo é tão rígido que é muito difícil deliberar já naquilo que Rawls definiria como a circunstância ideal de deliberação, que é debaixo de um véu de ignorância. Esse véu de ignorância não existe, é exactamente o contrário, todos os Estados têm posições negociais muito fortes relativamente a certas matérias, portanto a margem deliberativa é muito pequena, a rigidez é enorme. Isso significa que mesmo que intelectualmente eu, vocês ou milhares de académicos, grandes especialistas nesta matéria pudessem produzir um sistema institucional para a União Europeia que fosse o ideal, ele nunca viria a ser adoptado. Isto significa que a União Europeia tem que buscar outras formas de legitimidade, e tem talvez também de desviar um pouco a prioridade do seu processo de reforma para outras matérias. Do meu ponto de vista, é importante lembrarmo-nos que a União Europeia mais do que através do sistema institucional, que muitas vezes é abstracto e longínquo para os cidadãos, comunica com os seus cidadãos através das suas políticas. São elas, as políticas da União Europeia, que mobilizam os cidadãos para a participação activa, que podem mobilizar os cidadãos para a participação activa num processo político, num espaço público europeu. É através dessas políticas, que é aquilo que afecta directamente o cidadão, eu tenho um subsídio para isto ou não tenho um subsídio para isto, qual é a limitação que esta norma europeu impõe na minha actividade ou o que é que me garante enquanto consumidor. É através dessas políticas que a União consegue comunicar e comunica aos cidadãos aquilo que é. É através dessas políticas, de serem objecto dessas políticas que os cidadãos europeus compreendem aquilo que é a União Europeia, que fazem um juízo sobre a União Europeia. De certa forma, a prioridade em termos de reforma da União Europeia deve mudar, no meu ponto de vista, e eu tenho vindo a defender isto já há dois anos, do uso da ênfase no sistema institucional para uma reforma das suas políticas, da natureza das suas políticas.

A paixão contra ou a favor da Europa deve ser transformada numa paixão a favor ou contra diferentes políticas e programas para a Europa, e isso só será possível com uma reforma das políticas europeias...

 

(Um minuto inaudível)

 

... basicamente têm dificultado e que do meu ponto de vista exige e têm de ser abordadas em termos de reforma das políticas europeias, para conseguir produzir esta criação e esta emergência de um espaço público europeu.

Vou falar só de duas de uma forma muito breve. A primeira é uma assimetria de fins e meios. Se olharmos ao eurobarómetro, por exemplo, e às prioridades atribuídas pelos cidadãos europeus relativamente à União Europeia, aquilo que os cidadãos europeus esperam da Europa encontramos nos primeiros lugares matérias surpreendentes. Deixem-me ler-vos as matérias em que há mais elevada percentagem dos cidadãos que esperam mais decisões e pretendem mais decisões da União Europeia. As principais são: luta contra o terrorismo, promoção da democracia e da paz no mundo, luta contra o crime organizado, assegurar o crescimento económico, protecção dos direitos sociais, luta contra o desemprego. De forma extraordinária e paradoxal, são, provavelmente, as matérias em que a União Europeia tem menos competências e mecanismos de intervenção. Ou seja, há aqui uma enorme disparidade entre as expectativas que os cidadãos têm da Europa e aquilo que a Europa pode fornecer. Isto lembra um bocadinho e explica porque é que muitas vezes a forma como os cidadãos europeus falam da Europa parece esquizofrénica, e que lembra sempre uma anedota do Woody Allen no final da Annie Hall, não sei se se lembram é uma anedota de duas senhoras que vão a um restaurante em Nova Iorque e passam o tempo a protestar relativamente à comida, a dizer esta comida é péssima, é terrível nunca comi tão mal, é intragável, isto é completamente abominável não se pode comer isto, e depois no fim concluem, sim e para além de tudo as doses são tão pequenas.(Risos) E frequentemente a forma como as pessoas falam da União Europeia lembra-me exactamente este tipo de atitude. No fundo, esta disparidade de expectativas é resultado de três coisas: a primeira é uma expectativa natural associada a uma união de 27 Estados dotada de uma ambiciosa retórica política. Desde logo, isso por si só, gera expectativas nos cidadãos.

Segundo, é a transferência por parte dos Estados e dos governos nacionais em muitas matérias da responsabilidade por certas políticas, sem transferirem os meios necessários para elas serem prosseguidas a nível europeu.

A terceira, tem a ver com uma assimetria de novo, entre aquilo que podemos designar como integração negativa, ou seja, os limites que as normas em matéria de integração do mercado a que já fiz referência na mobilidade de circulação colocam ao exercício dos poderes de regulação económica e social dos Estados por um lado, e a capacidade da União Europeia de suprir nessa regulação económica e social que os Estados já não podem livremente fazer. Porquê? Porque as normas e os limites que colocam aos Estados existem já, estão nos Tratados e trata-se simplesmente de garantir que o Tribunal as aplique relativamente aos Estados. Mas nas matérias em que devido ao impacto que se tem noutros Estados-Membros, os Estados têm hoje em dia limites, frequentemente a União Europeia não tem capacidade de vir prosseguir esses fins. Porquê? Porque o sistema decisional por exemplo, é muito complexo mesmo nas matérias de maioria qualificada, é extremamente difícil de adoptar decisões. Isto que um autor alemão Fritz Schatten chamou entre a diferença entre integração negativa que é extremamente fácil, e integração positiva através da adopção de legislação a nível europeu, leva a que a União Europeia frequentemente entendida pelos cidadãos como já definindo o modelo económico-social dos Estados, mas sem deter os instrumentos políticos nem o correspondente debate político, para sustentar esse impacto e esse tipo de modelo.

Segundo exemplo da assimetria, com o qual queria concluir, tem a ver com uma assimetria de natureza redistributiva. A União Europeia tem muito poucas políticas directamente redistributivas, tem algumas de fundos estruturais por exemplo, de coesão, mas em geral tem muito pouco capacidade, exerce uma função redistributiva directa muito limitada. Mas isso não significa que as políticas europeias tenham pouco impacto redistributivo, não. Frequentemente as políticas europeias têm um elevado impacto redistributivo. Pensem no seguinte: pensem numa directiva que imponha certos critérios de tratamento da água, por exemplo. Uma directiva desse tipo pode exigir a um Estado que construa ou reforme certas estações de tratamento de água, e isso implica para um Estado um desvio de recursos financeiros para prosseguir os objectivos dessa directiva em vez de prosseguir outros objectivos. Ora, o direito comunitário frequentemente quando legisla sobre essas matérias não está na posição em que está um Estado de saber qual é o impacto entre essas diferentes alternativas. E, portanto, frequentemente estas consequências redistributivas das políticas europeias não são guiadas por um critério de justiça redistributiva, porque ele não existe a nível europeu. Paralelamente, a evolução do sistema político europeu no sentido cada vez mais maioritário, levará a que, frequentemente, esta disparidade e estas consequências redistributivas sejam aumentadas, sejam reforçadas.

Ora, o que é que podemos fazer nesta matéria? Bem, em primeiro lugar, podemos fazer duas coisas muito simples, independentemente de aumentar por exemplo um orçamento, o orçamento europeu. Em primeiro lugar, é necessário reestruturar as políticas europeias de uma lógica de distribuição entre Estados para uma lógica de distribuição entre cidadãos, muitas das políticas europeias têm de ser reorganizadas como atribuindo sobretudo direitos aos Estados e não por exemplo, quotas de produção com base na nacionalidade. Em segundo lugar, é preciso corrigir a circunstância da União ser frequentemente vista como distribuindo os recursos financeiros de um Estado para outro Estado. Frequentemente a União Europeia é entendida como distribuindo os recursos financeiros de um Estado mais rico, que inclui cidadãos pobres e cidadãos ricos, dando-os aos cidadãos pobres mas também aos ricos de um outro Estado. Quando os cidadãos da União Europeia deviam poder relacionar os recursos financeiros da União Europeia com a riqueza que ela própria gera, e é possível fazer isso. Ou seja, qualquer economista vos dirá que a riqueza que é produzida pela União Europeia, fruto do mercado interno, é claramente superior àquilo que é o orçamento da União Europeia. No entanto, os cidadãos europeus não conseguem fazer essa relação, não fazem essa relação.

Fundamentalmente, e porque tenho de concluir, mais provavelmente que uma reforma institucional, é esta reforma das políticas europeias, da estrutura das políticas europeias, dos objectivos e de quais devem ser as probabilidades políticas europeias, da organização do sistema de financiamento da União Europeia e do seu sistema de recursos, da organização das suas medidas legislativas já não sobretudo à luz de diferentes Estados mas numa lógica de direitos dos cidadãos, que pode ter um impacto muito mais positivo na criação perante os cidadãos europeus daquela paixão a que eu fazia necessário. É necessário promover uma reforma das políticas europeias que seja susceptível de envolver os cidadãos num espaço político europeu. Mais provavelmente que as miragens de reformas institucionais que continuamos a discutir, do meu ponto de vista, isso seria o passo mais importante a darmos a breve prazo. Muito obrigado.

 

Pedro Rodrigues: - Muito obrigado sr. Professor, vamos iniciar o período das questões dos grupos, vamos fazer blocos de duas questões, portanto vamos começar pelo grupo azul e dou a palavra ao Pedro Gil.

 
Pedro Gil
Bom dia a todos, em especial ao Prof. Miguel Maduro. A nossa pergunta, do grupo azul, é relacionada com o alargamento da União Europeia. Qual a verdadeira consequência para Portugal, com o alargamento da União Europeia a países equiparados ou abaixo do nosso em termos do desenvolvimento?

Obrigado

 

Pedro Rodrigues: - Obrigado Pedro. Tiago Esteves, do grupo bege.

 
Tiago Esteves
Boa tarde, Dr. Miguel Maduro, obrigado por estar aqui presente na Universidade de Verão.

A minha pergunta é mais ou menos relacionada com a questão anterior e era mais específica, no sentido de perguntar como é que vê a possibilidade de adesão da Turquia à União Europeia, numa perspectiva dos princípios democráticos e de alguns défices de espírito europeu aí existentes?

 
Prof.Dr.Miguel Maduro
De forma muito breve então, essas duas perguntas podem ser abordadas de forma muito diferente, porque o impacto do alargamento traduz-se em várias dimensões. Uma é uma dimensão económica, provavelmente é o que está por trás da primeira, eu não sou a melhor pessoa para o responder porque não sou economista, vi alguns estudos que demonstram que em geral todos os Estados ganharão com os alargamentos embora Portugal aparentemente fosse dos Estados que ganhava menos, mas não consigo responder a isso.

De forma que respondo àquilo que me pode parecer interessante responder. Por um lado, à caracterização daquilo que é a União Europeia, em que medida é que o alargamento pode influenciar isso ou não. Há aqui um dilema que é um dilema de fronteiras na questão do alargamento, que é, por um lado, o processo de integração europeia é largamente legitimado numa lógica de crescente inclusividade, aquela lógica que eu referi de expandir a democracia, por um lado porque é um mecanismo de reforço da democracia nos diferentes Estados-Membros, por outro lado porque se traduz para cada um dos cidadãos num aumento das esferas do poder em que eles podem participar. E dessa forma, de um ponto de vista de filosofia política, não tendo União Europeia na grande maioria, na posição que é defendida pela grande maioria de autores, uma grande coesão, que a defina por si só, histórica, étnica, cultural, a sua legitimidade tem que ser sobretudo do ponto de vista político, e essa legitimidade do ponto de vista político é a ideia de inclusividade num projecto de inclusividade crescente, cosmopolita, se quiserem. Mas os projectos de inclusividade têm sempre limites, não é, porque a democracia e a qualidade da democracia, também a qualidade da participação política é sempre um equilíbrio entre, por um lado, o campo de participação que nós temos e, por outro lado, a intensidade de participação. Quanto maior for o campo, o leque de participação, maior é a intensidade da nossa participação, menor é o nosso peso relativo, e daí a dificuldade que qualquer comunidade política tem em definir as suas fronteiras, e na União Europeia ainda mais. O S. Tomás de Aquino dizia: se todos são meus amigos eu não tenho amigos, há sempre necessidade de se diferenciar.

E este é o problema da União Europeia, como é que nós definimos as nossas fronteiras, como é que nós diferenciamos quando ao mesmo tempo o nosso político foi definido muito numa lógica de inclusividade. Eu aí seria muito pragmático, é os limites da própria inclusividade, em que ponto é que o grau de inclusividade face a novos Estados vai afectar a nossa capacidade do processo democrático funcionar em geral na União Europeia.

Nesse sistema e isso leva-ma à questão da Turquia e à terceira dimensão, que já não é uma dimensão de caracterização política, já é uma dimensão de avaliação das consequências económicas, é uma dimensão de avaliação do alargamento a nível institucional. Curiosamente eu sou muito optimista relativamente à integração da Turquia a nível institucional, porque eu acho que um Estado tão grande subitamente, por um lado iria trazer uma grande assimetria, mas por outro lado iria obrigar-nos a rever, será o único instrumento que nós vamos ter no futuro de rever aquilo que é uma evolução, da qual eu não sou particularmente favorito, do nosso actual sistema institucional. Porque iria obrigar alguns dos actuais Estados, com particular dimensão, a repensar de novo a lógica da representatividade proporcional pura que foi, por exemplo, dominante no Tratado Constitucional, e do meu ponto com alguns problemas sérios.

 

Pedro Rodrigues: - Muito obrigado Sr. Prof., vamos agora passar ao grupo castanho, Sofia Cavaleiro.

 
Sofia Cavaleiro
Bom dia a todos, bom dia ao Dr. Miguel Maduro. A questão suscitada pelo nosso grupo prende-se com o seguinte: o Tratado Constitucional, em cuja aprovação a Presidência Portuguesa está fortemente empenhada, prevê a criação do cargo de Ministro de Negócios Estrangeiros, cujo papel é o de assegurar uma política externa coerente da União Europeia, graças a um conjunto de instrumentos colocados à sua disposição. Terá necessariamente a criação desta figura, como consequência, o fim das presidências rotativas da União Europeia? Como se compensará o papel que esta rotatividade tem vindo a imprimir em cada um dos países ao nível do espírito de coesão e de entidade europeias?

 

Pedro Rodrigues: - João Torres, grupo laranja.

 
João Torres
Bom dia a todos, em nome do grupo laranja o agradecimento ao Prof. Miguel Maduro por estar aqui connosco. A nossa questão é simples e directa e consiste no seguinte: será que o processo de construção efectiva de uma União Europeia seja com os modelos de designações que procuramos tentar identificar enquanto federação, um Estado unido europeu ou algo análogo. Será que essa construção não precisa de uma reestruturação, dado que os Estados continuam com comportamentos de esconde-esconde no intuito de primarem pelo seu desenvolvimento em detrimento dos restantes Estados, seja através de auxílios estaduais camuflados ou por missões de campanhas de cariz nacionalista, como presentemente temos em Portugal, campanhas associadas ao movimento 560 e made in Portugal. Será que os Estados estão com uma mão aberta para receber mas no que consta a dar estão pelo escondido só os seus, para, digamos, impulsionarem alguma concorrência desleal?
 
Prof.Dr.Miguel Maduro
É difícil responder de forma muito breve. A primeira pergunta assenta, se me permite, nalguns equívocos. Em primeiro lugar o Ministro dos Negócios Estrangeiros já não existe, existe na figura mas já não se chamará assim, e em qualquer caso é importante dizer-se face a muito do que tem sido referido que não tem poderes muito diferentes daqueles que já existem hoje em dia. No fundo vai congregar é diferentes poderes, o poder do Alto-Representante, e o poder de alguns Comissários na matéria. Criará também eventualmente algumas questões complicadas em termos, porque tem uma responsabilidade dupla face ao Presidente da Comissão e à Comissão e face ao Conselho, vamos ver como é que isso vai funcionar na prática, mas em termos de alargamento de competências não terá muito impacto. Mas, poderá ter um impacto importante e muito positivo, do meu ponto de vista, em termos de coordenação da política europeia. Um dos problemas fundamentais, não tive tempo de falar disso, das políticas europeias, é um problema de coordenação das políticas. Mas, enfim, isso leva-me de novo a frisar essa importância. O grande projecto que nós devíamos ter hoje em dia na Europa é a reforma das suas políticas, felizmente acho que a Comissão Europeia tem no quadro da última discussão sobre as perspectivas financeiras, foi pedido à Comissão que apresentasse até ao final deste ano um relatório sobre a reforma, quer das perspectivas financeiras quer das políticas, espero que isso seja o primeiro passo nesse sentido. No que falou relativamente à presença do Conselho das presidências rotativas, isso tem a ver é com a criação quer no Tratado Constitucional quer agora no Tratado dito reformador, eu chamo-lhe Tratado de notas de rodapé a brincar, porque aquilo tem mesmo muitas notas de rodapé, quer no actual Tratado, o que foi criado é uma presidência do Conselho Europeu, mas isso não elimina as presidências dos conselhos sectoriais. Portanto, há um sistema misto, continuarão a existir presidências rotativas mas há também um Presidente do Conselho, existirá também um Presidente do Conselho Europeu. Eu acho que a preocupação que identificou é uma preocupação verdadeira. Eu acho até que curiosamente um dos maiores erros que foi feito há pouco tempo e que era justificável do ponto de vista financeiro, mas do meu ponto de vista foi muito mau para a percepção da União Europeia face aos cidadãos, foi a concentração de mais conselhos em Bruxelas. Eu acho que era muito positivo, era a maior forma de identificação dos cidadãos com a União Europeia e de entenderem que eles também tinham poder na União Europeia, e um poder verdadeiro era quando da visibilidade de terem cá os ministros dos outros Estados, em Portugal, é neste momento que nós percebemos isso. E concretamente através de uma medida tão simples como essa, eu acho que se afectou algo e que foi um erro fazer isso.

No que concerne a federação, há aí várias perguntas no que diz, por um lado é a questão de como é que se chama o bicho, eu não teria medo de lhe chamar federação por exemplo. Do ponto de vista institucional, do ponto de vista da representatividade dos Estados pequenos e médios o sistema federal americano, e eu lembro-me há 3 anos escrevi um artigo no Diário de Notícias em que dizia isso, antes no início logo a seguir ao Tratado de Nice, e quando se começou a discutir o Tratado Constitucional em que eu dizia, um sistema institucional como o que tinha sido proposto por Óscar Fisher muito semelhante ao sistema americano dava mais poder a um Estado como por exemplo Portugal, do que o sistema institucional que temos hoje em dia. O medo da palavra federação, e não é uma questão de governos é na nossa própria sociedade civil que se manifestou tanto contra isso, levou-nos a ter um sistema que no fundo acaba por ser menos representativo dos interesses dos Estados pequenos e médios, do meu ponto de vista quer do sistema das teorias de representatividade em sistema puro, quer do ponto de vista do interesse específico eventualmente de Portugal era um sistema melhor, por exemplo, a nível institucional, pelo menos, o mecanismo federal.

No que concerne o patriotismo nacional, no fundo, esse risco existe, e vem de novo frisar a importância daquela primeira dimensão da União Europeia que eu referi, essa dimensão de racionalização dos sistemas democráticos nacionais. E aí é o direito comunitário que continuará a ter um papel fundamental e tem tido, e no fundo o Tribunal de Justiça tem tido aí corrigindo muitos desses, vamos-lhe chamar equívocos nacionais, através da aplicação das normas comunitárias. Aí os princípios já existem, há que aplicá-los, o que era importante é que, porque o facto de existirem as normas jurídicas não significa por si só, porque os processos judiciais a sua efectividade e a capacidade que se têm de traduzir em práticas sociais efectivas é muitas vezes limitada, era importante que os próprios Estados nacionais, os próprios governos nacionais, os próprios sistemas políticos nacionais interiorizassem essas dimensões de direito da União Europeia. E não estivessem por um lado de certa forma a jogar com patriotismos nacionais e, por outro lado, a queixar-se depois dos problemas que há a nível da percepção por parte dos seus cidadãos da União Europeia. É esse tipo de jogo duplo que frequentemente acaba por minar a legitimidade do processo de integração europeia.

 

Pedro Rodrigues: - Muito bem. João Almeida, grupo cinzento.

 
João Almeida
Bom dia, afinal valeu a pena esperar, muito obrigado. Como sabemos, até Dezembro, as luzes europeias estão apontadas para o nosso país, acredita que este governo conseguirá aprovar o novo Tratado Constitucional até Dezembro, mas não um qualquer, um com muita paixão ou iremos adormecer mais 14 anos?

 

Pedro Rodrigues: - Obrigado João. Vasco Campilho grupo roxo.

 
Vasco Campilho
Bom dia, agradecer a sua presença e desejar-lhe uma boa viagem para o Luxemburgo a seguir, não sei se vai de carro, espero que pare pelo caminho porque o caminho ainda é longo.

 

Prof. Miguel Maduro: - Vou beneficiar da liberdade de circulação no espaço europeu.

 

Vasco Campilho: - Óptimo, ainda bem. A minha questão, a questão do grupo roxo é a seguinte: a União Europeia sempre foi criada como uma organização essencialmente dirigida e impulsionada por elites, desde já as elites políticas dos Estados e também as elites económicas que mais cedo beneficiaram da integração económica no mercado único, mas sempre naturalmente respeitando as democracias nacionais e compatibilizando-se com elas, a pulsão de democratização da União Europeia para lá de um simples acompanhamento representativo não colocará em perigo a natureza sui generis desta construção. O que é que será melhor do seu ponto de vista? Tentar assumir a União Europeia como uma democracia que está coxa na medida em que lhe falta o pé do Demos ou assumir-se como uma construção institucional de Estados e sociedades que é compatível com as democracias e tende a reforçá-las mas não se substitui a elas?

 
Prof.Dr.Miguel Maduro
As suas perguntas acabam por juntar-se, a resposta ao final da primeira pergunta acaba por responder também à sua pergunta ou melhor coordena-se com isso. No que concerne a se o governo português vai conseguir aprovar ou não até porque estou no Tribunal de Justiça não vou fazer qualquer tipo de previsão a esse respeito, não sei, de qualquer forma na União Europeia, eu costumo dizer que é sempre um bocado como dizia o João Pinto em relação aos jogos de futebol, prognósticos só no fim. Em relação à União Europeia eu aprendi que isso é realmente uma regra a seguir claramente. No que concerne se isso será se o Tratado Constitucional ou se Tratado Reformador será suficiente para já a paixão, eu acho que o meu discurso e a minha intervenção já deu a entender que eu não estou muito optimista em relação a isso, não é que faça um juízo negativo do Tratado, acho é que não será suficiente para já essa paixão. Não sei se vocês se lembram quando o Bill Clinton foi eleito havia uma frase famosa que na sua campanha eleitoral há um documentário sobre a campanha eleitoral dele, eles tinham na sala uma frase famosa que orientou toda a campanha que era “it’s economics stupid”, essa frase ficou famosa. Eu se tivesse traduzido isso hoje em dia para a União Europeia no fundo era aquilo que eu estava a dizer na minha conferência, eu punha por todas as instituições uma frase enorme a dizer “it’s policies” não diria estúpido para não ofender as pessoas mas “it’s policies”. São as políticas que é realmente fundamental e que podem vir a gerar paixão do meu ponto de vista, não é através do sistema institucional e isto relaciona-se com aquilo que dizia antes, porque as pessoas só se mobilizam, os processos políticos são frequentemente processos de elite em qualquer circunstância. Nós falamos muito e em Portugal dizemos que há uma sociedade civil que tem pouco poder. Eu acho que é o contrário. Há uma má sociedade civil, mas a nossa sociedade civil até tem muito poder. Não conheço nenhum país em que, por exemplo, o código penal, no fundo, é delegado à sociedade civil, é feito por professores, que é uma questão política de dimensão, de enorme importância, e é feito por professores. Há imensas questões. O nosso problema em Portugal, por exemplo, é um problema muito disso, de que há uma excessiva área do espaço político que é dominado pelas elites, e essa sociedade civil provavelmente é que não é uma sociedade civil muito inclusiva nem muito boa, portanto não é um problema de fraco poder da sociedade civil, até é ao contrário.

E, nessa medida, o facto da União Europeia ser um processo que é nalgumas matérias muito dominado pelas elites, não é nada de novo nem nada de excepcional. Porque é uma questão simples: as pessoas só se estimulam, só participam num processo político perante o interesse concreto. A maior parte dos cidadãos não estão constantemente a querer participar no processo político, isso é normal, acontece. É a própria natureza do sistema democrático, a única forma através dos quais se geram a participação é ou através de um governo que as pessoas identificam claramente com políticas a favor ou contra por exemplo. E aí é uma das questões que nós temos de nos defrontar no seio da União Europeia por exemplo, se queremos ter uma Comissão Europeia mais dependente, mais correspondente à maioria política do Parlamento Europeu, por exemplo, e que permite aos cidadãos fazer um juízo e criar um debate mais assente nessa matéria, mas fundamentalmente é através da natureza das políticas europeias. Lá está, é aquilo que eu dizia: mudar o discurso da Europa de um discurso de paixão sobre a favor ou contra a Europa; para a favor ou contra de certas políticas europeias. É natural que haja pessoas que vejam dizer que a União Europeia é neo-liberal, ou que pelo contrário, que a União Europeia é demasiado protectora do ponto de vista social. Isso é bom, quando o discurso europeu for sobretudo esse tipo de discurso, é sinal de que União Europeia atingiu a maturidade suficiente para ser considerada uma democracia embrionária, sempre dependente das próprias democracias nacionais, sempre em relação com as democracias nacionais, mas que tenham um espaço político próprio. Essa criação de um espaço político próprio do meu ponto de vista, devido às dificuldades das reformas institucionais tem de passar, e o primeiro passo é pelas reformas das próprias políticas, é através daí que vamos conseguir estimular essa paixão.

 

Pedro Rodrigues: - Muito obrigada Sr. Prof., Marta Santos do grupo rosa.

 
Marta Santos
Boa tarde a todos, Prof. Dr. Miguel Maduro, obrigado pela sua presença.

Todos sabemos que a Europa precisa de uma Constituição reguladora de Direitos, Liberdades e Garantias, se a Constituição ou o Tratado Constitucional forem chumbados, o que é que acontece? Há um plano B? E seremos, nós, os jovens, algum dia eleitores de um governo europeu?

 

Prof. Miguel Maduro: - Pode repetir a segunda parte da pergunta?

 

Marta Santos: - Seremos nós os jovens algum dia eleitores de um governo europeu?

 

Pedro Rodrigues: - Obrigada Marta, Mariana Costa do grupo verde.

 
Mariana Costa
Boa tarde, eu queria agradecer a presença do Dr. Miguel aqui hoje.

Nós, quando nos foi entregue hoje o retrato falado sobre o Dr. Miguel reparamos que não fez referência à nacionalidade, não sei se poderá esclarecer-nos se o Sr. Dr. é de Portugal ou é de onde?

 

Prof. Miguel Maduro: - Eu sei que o meu português por esta altura já deve estar um bocado contaminado por estrangeirismos mas sou português.

 

Mariana Costa: - A dúvida era se o Sr. Dr. era português ou europeu?

 
Prof.Dr.Miguel Maduro
Sou português/europeu é o cliché que se diz, mas também um cliché verdadeiro, há muitos clichés que existem precisamente porque reproduzem coisas que são profundamente verdadeiras. Hoje em dia todos nós, e vocês também, temos aquilo que há um sociólogo que definiu como uma identidade compósita, é um aspecto chamam-lhe pós-modernismo, chamem o que quiserem e, portanto, associamo-nos e identificamos com diferentes níveis de identidade, seja um nível cosmopolita e um nível nacional, seja um clube de futebol e um partido político por exemplo, mas cada vez mais a nossa identidade é compósita. Portanto, definir a nossa identidade de forma extremamente coesa e fechada é já impossível, aliás, já agora, isto é um desafio muito interessante para os políticos, acho que é um dos aspectos que hoje em dia os políticos ainda não compreenderam, é que continuam a fazer política muito assente na ideia de que as pessoas têm uma identidade unívoca. Por isso é que a política, hoje em dia, é aquilo que muito nos Estados Unidos da América se fala de Issue politics. Porquê? Porque frequentemente as pessoas já não enquadram todas numa determinada área ideológica, não há esse tipo de coesão. Isso é produto desta identidade compósita que as pessoas têm, que hoje em dia já não vivemos numa rede social, mas vivemos em várias redes sociais e que isso nos leva por exemplo, de um ponto de vista moral poder ser muito classicamente de esquerda, mas de um ponto de vista económico ser mais de direita e isso transforma por exemplo, a actividade política em algo de extremamente mais complicado e difícil. Por outro lado, justifica por exemplo, muito mais, a existência da União Europeia, porque diferentes mecanismos de identidade podem exigir diferentes níveis de participação, diferentes espaços de participação política e de participação pública.

De forma que eu sou uma pessoa dessas, tenho uma identidade compósita como seguramente vocês têm. Eu provavelmente tenho uma identidade, como dizem muitos amigos meus, excessivamente cosmopolita porque estudei muito no estrangeiro, fiz quase a minha vida toda no estrangeiro e isso identifica-me e leva-me a que tenha depois uma série de características, mas não me deixo de sentir português por isso.

No que concerne a primeira pergunta, em relação aos eleitores de um governo europeu já respondi isso basicamente, por exemplo, se houver uma maior identificação da Comissão Europeia com a maioria parlamentar no Parlamento Europeu isso será um primeiro passo nesse sentido, haveria que repensar eventualmente também o calendário das eleições para o Parlamento Europeu, há ideias que poderíamos ter nesse sentido, acho que poderia ser um passo interessante, essa maior identificação da Comissão com um governo europeu, mas também tem os seus riscos. Tem claramente os seus riscos. Grande parte da legitimidade da Comissão Europeia e da autoridade que tem tido, porque a União Europeia é em parte um executivo, é em parte um governo, mas é noutra parte aquilo que hoje em dia se define como Alta-Autoridade, ou seja, como uma Alta-Autoridade para a concorrência por exemplo, uma Alta-Autoridade para certos espaços de regulação e aí a sua legitimidade é muito mais de um ponto de vista funcional tecnocrático. Portanto, essa dificuldade de encontrar, de encaixar o modelo clássico do governo com isso também se pode traduzir nalguns tipos de problemas. Mas é seguramente uma questão sobre a qual devíamos reflectir mais.

Quanto ao plano B, é o Tratado actual, se falhar o outro é o que temos. Também não tem funcionado tão mal como isso. Aliás, há estudos interessantes, recentemente, que dizem que, a contrário do que se esperava, o processo decisional tem sido facilitado. Ou seja, o tempo de decisão e a facilidade de tomada de decisões depois do alargamento aumentou, ao contrário da expectativa. A razão é simples, e é uma razão que decorre da teoria dos jogos que é, como todos os actores do processo deliberativo sabem hoje que se algum causar problemas, a probabilidade do sistema bloquear é grande, no fundo inibem-se. E no fundo interiorizaram os riscos de bloqueio do sistema e levaram a que o sistema funcione até de forma melhor do que funcionava antes do alargamento, são paradoxos curiosos.

 

Pedro Rodrigues: - Muito obrigado. Vamos passar ao último bloco de questões, Filipa Guimarães do grupo amarelo.

 
Filipa Guimarães
Não vou agradecer a sua presença atendendo que já foi repetido inúmeras vezes. Vou falar da questão do processo de decisão política e das prioridades das preocupações das populações a nível de terrorismo, segurança, narcotráfico, tráfico humano e violação dos direitos humanos. Sabemos que os politólogos defendem que nas questões da política de decisão, nestas áreas de segurança, é o modelo da Black box inspirado no realismo da Anders Morgenthau, eu queria-lhe perguntar temos as questões das missões de PetersBerg, será que países como a União Europeia, alguns deles com algumas dificuldades, podem continuar a suportar 27 forças aéreas, 27 exércitos, 27 marinhas, atendendo que os orçamentos para as políticas de defesa são muito, muito dispendiosos, será que a União Europeia necessita de um braço armado na questão da construção de um exército europeu. Qual é a sua ideia relativamente a esta questão, atendendo que já temos as missões de PetersBerg?

 

Pedro Rodrigues: - Obrigada Filipe, Francisco Correia do grupo encarnado.

 
Francisco Correia
Bom dia. Será possível aprovar-se uma Constituição Europeia com um referendo a nível europeu que tenha em conta o número total de votos dos cidadãos enquanto europeus, em vez de serem contabilizados pão países?
 
Prof.Dr.Miguel Maduro
A resposta à segunda pergunta é fácil: não. É muito simples, em teoria seria possível, mas eu não acho que as condições estejam reunidas para isso, simplesmente porque os portugueses, provavelmente, também não quereriam ficar sujeitos a uma Constituição Europeia contra a qual tivessem votado. É uma questão tão simples como esta. De novo esse tipo de questões são questões que eu tenho sempre uma grande dificuldade em responder, porque são questões que não me competem a mim responder, lembra-me um bocadinho Lewis Caroll na Alice no País da Maravilhas, há uma altura em que a Alice no País das Maravilhas chega a um bifurcação e tem duas estradas, e pergunta a um gato que está no cimo da árvore que estrada é que eu devo apanhar? E o gato responde “isso depende para onde é que quer ir”.

E é a resposta que eu tenho vontade de dizer muitas vezes a esse tipo de perguntas. Se quiserem é possível fazer, juridicamente pode-se construir essa possibilidade, mas será que os cidadãos dos diferentes Estados-Membros querem ficar sujeitos ao voto de uma maioria europeia e não ao voto da sua comunidade política relativamente a ser ou não sujeitos a uma decisão do Tratado, isso depende. Isso é uma decisão individual de cada um, uma questão técnica, uma é um problema técnico, a outra é a questão política que depende de cada cidadão. Eu acho que na maior parte dos Estados-Membros claramente isso não acontece e a maior parte dos cidadãos nacionais ainda não querem, ainda não estão preparados para uma decisão a esse nível da União Europeia.

Isso é no fundo uma resposta que é semelhante à resposta anterior. Se nós perguntarmos às pessoas vocês querem ter um exército europeu, para poder agir em Darfur, ou onde acham que é necessário ou eventualmente poderia ter agido em Timor-Leste, ou ter uma política europeia que fosse forte relativamente à questão de Timor-Leste quando era necessária, todos nós diríamos que sim. Mas se depois você inverter essa pergunta e disser: quer uma política europeia, um exército europeu que tenha de intervir e que vá intervir com os soldados da sua nacionalidade mesmo onde você não queira, as pessoas se calhar dizem que não, é tão simples como isso. Essa é a dificuldade do problema, mas o problema fundamental é que nós não podemos ter o primeiro, não podemos ter uma política de defesa europeia, não podemos ter uma política externa europeia relativamente efectiva, sem abdicarmos do veto na segunda parte, é tão simples como isso. E de novo depende se queremos ou não fazer isso.

 
Dep. Carlos Coelho
Muito bem, cabe-nos em nosso nome agradecer ao Prof. Miguel Maduro a lição que nos deu e as respostas que nos deu, o Pedro Rodrigues e eu vamos acompanhá-lo à saída de acordo com a tradição, peço ao Duarte e à Zita para virem para aqui conduzir o processo de votação e faço minhas as palavras de alguém que já disse, muito obrigado e boa viagem até ao Luxemburgo.( Aplausos)

 

Zita: - Vamos proceder à votação então por grupos. Começamos pelo grupo bege, podem votar.

 

Votação

 

Duarte Marques: - Obrigado, bom almoço, divirtam-se.