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14.30 - Assembleia (simulação)
20.00 - Jantar-Conferência com o Dr Vasco Graça Moura
30-08-2007
Globalização: O novo mundo em que vivemos
 
Dep. Carlos Coelho
(Um minuto inaudível)

 

sobre o Wall Street, diz que a Bolsa termina a sessão em forte queda e dá a noção da evolução negativa dos mercados bolsistas a nível mundial. Podemos perguntar a propósito disto, em que medida é que isto nos afecta. Muitas pessoas falam em globalização, por vezes para sublinhar os aspectos mais negativos, e frequentemente para se centrar na temática das deslocalizações.

O que é facto é que o que se passa lá fora (no estrangeiro, como alguns dizem) afecta-nos, condiciona-nos e a globalização é uma realidade nova.

Quando o Dr. Marques Mendes pediu ao Dr. Balsemão, ao Dr. Agostinho Branquinho e a mim próprio, para coordenarmos o esforço da revisão do Programa do Partido, chegámos à conclusão que o actual Programa do PSD não tem nada que nos envergonhe. Não há nada no actual Programa que esteja desactualizado, mas há muitas omissões. Há questões essenciais, que têm que pertencer à chave com que nós entendemos a modernidade, que faltam no actual Programa do PSD. E uma delas é a globalização.

Muita gente fala de globalização mas não sabe bem o que é isso. O ensaio que convosco quero fazer esta manhã, tenta responder a esta questão. Ficarei satisfeito, se depois desta nossa conversa, todos nós compreendermos melhor o fenómeno, percebermos a sua complexidade, sejamos capazes de identificar pontos fortes e pontos fracos, e consigamos situar Portugal neste contexto.

Não é por falta de estudos científicos que não se sabe o que é a globalização. São publicados por ano mais de 3.000 ensaios ou teses académicas, e todos os anos há no mercado internacional, perto de 1.000 livros novos sobre a temática.

No entanto, as definições são muito diversas. Vamos começar (estamos numa Universidade) com algumas definições.

Esta é a definição mais tradicional de globalização: - “Um processo de integração económica, entre países, que os torna interdependentes no âmbito da livre circulação de bens, serviços, capitais, pessoas, ideias e tecnologias”. Reparem nas ideias integração económica e interdependência.

Para uma visão mais politicamente orientada da globalização, houve quem definisse globalização: - “como algo que alimenta um monstro, o capital, e ameaça a democracia, pois só visa o lucro. Ela não apoia as pessoas e a comunidade, mas a sociedade desumana de exclusão”. Quem fez esta definição foi Mário Soares.

Um outro socialista, mas com uma abordagem mais científica, o Prof. Boaventura Sousa Santos, sociólogo, define a globalização como: - “o processo pelo qual determinada condição ou entidade local, estende a sua influência a todo o globo e ao fazê-lo desenvolve a capacidade de a designar como local, outra condição social ou entidade rival”. Ouvimos esta definição e percebemos que o Prof. Boaventura Sousa Santos está provavelmente a pensar nos Estados Unidos, que estende a sua influência a todo o globo, e consegue designar como local uma entidade que se lhe opõe. Hoje a Rússia é mais um potência regional do que propriamente uma potência global.

Podemos considerar que esta abordagem é demasiado estratégica, e provavelmente um bocadinho suspeita relativamente aos americanos.

Houve alguém que foi mais claro, disse que: - “a globalização é o novo nome da hegemonia da política americana”. Mas não foi Putin que disse isto, quem disse isto foi Henry Kissinger, o antigo Secretário de Estado norte-americano do presidente Nixon.

Na primeira Universidade de Verão, o Deputado José Matos Correia que deu uma aula sobre

Relações Internacionais, referindo-se à globalização, definiu-a como: - “uma explosão e aceleração de fluxos de mercadorias, serviços, informações, imagens, modas, ideias e valores, incluindo intensificação de aumento de capitais, e passando pela mobilidade internacional do trabalho”.

Na mesma linha Anthony Giddens, o ano passado, num livro chamado Europe in the Global Age, sublinha a ideia da interdependência crescente entre indivíduos, nações e regiões, mas sublinha que isso não quer dizer apenas interdependência económica.

Eu gosto muito, para terminar as definições, de uma definição dada por Ruud Lubers. Ruud Lubers foi Primeiro Ministro holandês, foi Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, do qual se demitiu para dar lugar a António Guterres, (demitiu-se por um problema de assédio sexual, ele diz que conduziu uma senhora no final de uma reunião à porta com a mão nas costas dela, a senhora diz que a mão estava um bocadinho mais abaixo). Podemos dizer que foi graças à mão de Ruud Lubers que António Guterres teve um emprego novo. (Risos)

Ruud Lubers define a globalização como: - “um processo onde as distâncias geográficas são cada vez menos importantes, para o estabelecimento ou a manutenção de relações económicas, políticas, e sócio-culturais trans-fronteiras”.

Gostaria que pegassem nesta ideia, que é a ideia que as distâncias geográficas deixam de fazer sentido. Na minha opinião essa é que é a questão essencial do processo de globalização, que gera um conjunto de interdependências como vamos ver.

Em Abril de 2001, Fernando Henrique Cardoso, então Presidente da República Federativa do Brasil, disse numa intervenção pública: “foi Portugal que inventou a globalização”. Referindo-se, naturalmente, à gesta dos descobrimentos e aos séculos XV e XVI.

O Prof. Dr. Adriano Moreira utiliza uma expressão que eu gosto muito, que é “mundialização do mundo”. A ideia de que nós somos e, temos a percepção de que somos uma grande família, que a interdependência e a comunicação se geram a nível mundial, que a integração económica é crescente e que a divisão geográfica está um pouco ultrapassada.

Para lá de alguma nuance muito subtíl entre o conceito de mundialização e de globalização, eu acho que ele traduz, sobretudo, a influência das fontes. Quem segue mais a fontes anglo-saxónica utiliza o termo globalização, do inglês globe, globalization; quem é mais influenciado pela cultura francesa prefere o termo mundialização, do francês monde, mondialisation .

Vocês recordam-se duma brincadeira que percorreu a net, quando foi do falecimento da princesa Diana. Dizia-se que esse tinha sido o caso mais evidente de globalização. E porquê? Porque uma princesa inglesa, com um namorado egípcio, que usava um relógio suíço, teve um acidente num túnel francês, num carro alemão, conduzido por um segurança belga, embriagado com uísque escocês, que era seguido por paparazzis italianos em motos japonesas.

Mais a sério, a globalização não é um processo só económico. Podemos dizer com alguma redundância que a globalização é um processo global. Escolhi essa imagem porque dá ideia que nós estamos com o mundo às costas. E há percepções da globalização em muitos domínios como a informação, a informática, a economia, a cultura, a saúde, a moda, o ambiente, a demografia e o crime. E gostaria de vos propor uma passagem rápida por cada uma destas realidades.

A globalização da informação. Hoje a CNN, a Al Jazeera, ou o impacto dos acontecimentos de 11 de Setembro, só existem nas nossas vidas, por causa da globalização da informação. Na altura dos vossos avós, dos meus pais, a única televisão que eles conheciam era a RTP, a RTP a preto e branco e o canal 1, porque não havia canal 2 ainda. E há pessoas que entraram na nossa vida, que nós hoje ouvimos falar como se fossem da nossa família. Este senhor por exemplo, nunca existiria na nossa realidade, o senhor Bin Laden, se não tivesse acontecido o que aconteceu e se não tivesse havido um impacte mediático relativamente às suas acções.

Como vivemos com alguma emoção as tristezas dos funerais no cemitério de Santa Cruz em Timor, ou a intervenção das Forças de Paz; ou sentimos um pouco como nossa a alegria do Povo Timorense no momento em que estamos a fazer perguntas a Ramos Horta, quando celebraram a sua independência.

E há momentos no desporto que nos entraram pela casa dentro, e que marcaram o quotidiano de imagens que não esquecemos; ou imagens bélicas da actualidade no Médio Oriente, que enchem os noticiários de todos os dias; ou ainda coisas que a televisão nos diz, como por exemplo, o nascimento de três crias de ursos panda na China, este é um de três que nasceram na mesma altura, e o curioso é que nós sabemos com mais facilidade quando nasce uma cria de um bebé panda na China do que sabemos quando nascem crias no Jardim Zoológico de Lisboa.

Acabando a globalização de informação, já numa passagem para a informática, temos o Google. O Google hoje tem 150 milhões de acesso dia, um número em crescendo, e na literatura inglesa já baptizou um termo, criou-se um verbo to google, I’m going to google something. Em português fica um bocadinho mais bizarro, não proponho a vocês que googlem qualquer coisa, vamos googlar um termo para saber o que é que ele diz, mas isso está relativamente banalizado nos países de língua inglesa.

Falámos do Google, vamos passar para a globalização informática. Vocês chegaram à Universidade de Verão e nenhum de vocês achou estranho que nós tivéssemos uma intranet em wireless, que pudessem ligar os vossos computadores à intranet ou à Internet, pudessem comunicar, que me enviassem sugestões directamente por via cibernética, nada disso vos surpreendeu, porque vocês nasceram, e viveram e cresceram num mundo em que isso já é perfeitamente banal. Os vossos colegas da primeira Universidade de Verão, 2003, estranharam a wireless, na altura não estava na moda, hoje é relativamente banal.

O que é verdade é que em 1972 (para vocês parece uma data muito remota, mas onde eu já existia e já tinha 12 anos) havia 150 mil computadores no mundo, 150 mil computadores no mundo. Hoje, estima-se que haja mais de 1.000 milhões de navegadores, 1.000 milhões de navegadores, em toda a população mundial. A informação aumenta 10 vezes ao ano, o número de locais web duplica-se 50 em 50 dias, uma nova homepage é criada em cada segundo. E isso lança uma consequência para os dias de hoje, é que hoje em dia os analfabetos são os info-excluídos. Essa é a realidade do século XXI.

Isto tem consequências para a sociedade do saber e da informação, para a revolução tecnológica, para o domínio da língua estrangeira: o inglês é a língua dominante na Internet por enquanto, e para a análise dos défices de competências. Hoje qualquer empregador considera um défice de competências se o candidato ao lugar não domina a utilização do computador e das suas principais ferramentas.

A penetração da Internet é muito desigual. Vêm aí a penetração por regiões, em cima têm a América do Norte, 70% em números redondos; a Europa está com 40%, pouco mais de metade dos americanos. Metade seria 35%; e a África está com 4%. Um número impressionante que é bem o retrato do atraso do continente africano.

Se virmos a utilização por utilizadores. A maior fatia, são só os asiáticos com 36%; a seguir os europeus, com 28%; os norte-americanos, inclui os Estados Unidos e o Canadá com 20%; a América Latina, já com 9%; e, a África com 3%; aqueles 2% são da Austrália e os outros são do Médio Oriente.

Isto tem consequências linguísticas. Quais são as três principais línguas da Internet, fazem ideia? A primeira é o inglês, e a seguir vocês têm razão é o chinês, e a seguir ao chinês é o japonês. Depois o espanhol, o alemão, o francês. O português com 3%. Por enquanto o inglês ainda é a língua dominante na net, mas à velocidade a que os chineses estão a investir e estão a desenvolver-se, é bem previsível que a curto prazo, a segunda língua ultrapasse a primeira, e se presumo que todos vocês dominam razoavelmente bem o inglês, já tenho as minhas dúvidas que o consigam relativamente ao chinês.

O que é que isto significa nas famílias? A distribuição também é irregular, vêem aí uma comparação simples, entre vários países, identifiquei quatro que me parecem mais interessantes: o Luxemburgo que é um país comunitário em que há computadores em 75% das casas; a Alemanha, com 70%, a Espanha, com mais de metade, 55% em números arredondados; e Portugal, com 42,5%. Ou seja, menos de metade dos lares portugueses dispõem de Internet.

Os países mais atrasados não se resignam a este atraso e querem investir nesta área. Este gráfico tem o crescimento da despesa em ciência e tecnologia, entre 2000-2005. Mede a taxa de crescimento (não é o investimento global, é a taxa de crescimento) portanto, mede quem subiu mais entre 2000-2005. Vocês reparem quais são os países que cresceram mais: o Irão, a Roménia, a Rússia, a Índia, a Ucrânia, a China, e o Equador. Estamos a falar de países com realidades económicas bem diferentes, mas com a mesma ambição: não ficarem para trás na corrida ao saber e às tecnologias da informação.

Vejamos agora a globalização da economia, aquilo que as pessoas associam mais à globalização. Há ou não uma globalização da economia e porquê? Há diversas razões, deixem-me dar aquelas que me parecem mais evidentes. Primeiro, cresceu imenso o comércio mundial. Vêem aí evolução nos últimos 50 anos, entre 1940 e o ano 92, em que a percentagem do comércio internacional no PIB quase que triplica. Este valor é perceptível neste gráfico que mede apenas a evolução das exportações, que é uma das realidades do mercado mundial, não estão aqui as importações, mas o retrato é similar. E o investimento directo estrangeiro em percentagem do produto, sobe de 10% para 70%, multiplica por 7, entre 1940 e o ano 2000, portanto grosso modo, nos últimos 50 anos.

Se quiserem avaliar por países, a realidade é desigual. Têm aí a evolução entre o ano 1992 e o ano 2005. Com a seta azul temos a média dos países OCDE, com a seta vermelha temos a média dos países comunitários, e vemos quais são aqueles que têm maior crescimento do comércio e com isso maior projecção sob o ponto de vista económico. Vêem com a seta verde um caso de sucesso que é a Irlanda, à direita e um caso de menor sucesso é Portugal com a seta amarela à esquerda, com um dos crescimentos mais baixos desse gráfico.

Uma das razões pelas quais o comércio mundial cresceu e a economia mundial se globalizou, tem a ver com a diminuição de custos. Há dois custos muito importantes, o custo dos transportes e o custos das comunicações. Percebe-se que se o transporte for muito oneroso, há menos comércio internacional; e se as comunicações forem muito onerosas, a mesma coisa.

Isso dá-vos uma ideia de qual foi a diminuição dos custos de transportes internacionais e de seguros ligados a esses transportes, em percentagem do valor do produto entre 50 e 93, baixou praticamente para metade. E o custo das comunicações foi brutal, entre 1930 e os dias de hoje, uma chamada de 3 minutos de telefone entre Nova Iorque e Londres, passou de 300 dólares para menos de 1 dólar. Ou seja, uma relação de trezentos para um.

Este gráfico é mais completo, na linha 100 têm os preços de 1930, e se repararem o telefone passa de 100 para menos de 1, 0,3 ou 0,2; o frete marítimo passa para 30% do valor, ou seja, é hoje um terço daquilo que era nos anos 30; o transporte aéreo está a 10%, uma relação de dez para um do que era em 1930, e tende a baixar depois de 2000 com o o fenómeno das low costs. Há um conjunto de empresas a baixarem o custo quer do transporte de passageiros, quer de mercadorias. Os custos de satélite, (porque é uma inovação mais recente, entre 70 e o ano de 2000) baixam para 20% do valor que eram no início.

Ou seja, transportes e comunicações baixam drasticamente e justificam também um grande aumento do mercado internacional.

O mercado internacional não é apenas bens e mercadorias, é também capitais, e vêem aí a evolução dos fluxos financeiros internacionais, desde 1970 até aos dias de hoje, e uma vez mais estamos numa relação de quase de um para cem, ou seja, nestes trinta anos, multiplicou por 100 o volume das transacções financeiras nos mercados internacionais.

A China. A China de Mao para a China actual, caricaturada com o McDonald’s em chinês, é uma realidade interessante, preocupante para uns, e curiosa para outros. Mao nunca terá pensado que no momento em que nós estamos a falar, a China é já o maior credor do Estados Unidos da América, ou seja, nos mercados internacionais a China comprou títulos de tesouro dos Estados Unidos, e tem sobre a maior potência do mundo, uma capacidade de coação financeira substancial. Isso é relevante sob o ponto de vista financeiro, mas é muito relevante o ponto de vista estratégico.

Em 2004, a China foi responsável pelo aumento da procura de petróleo em 30%. E muitos de nós, quando estávamos preocupados pelo aumento do custo do petróleo na Europa e em Portugal, e perguntávamos quais as razões, uma das razões relevantes foi o aumento do consumo na China e na Índia, para lá de outros problemas como a instabilidade política e a guerra nos países produtores, os humores do sr. Putin que às vezes fecha as torneiras do gás natural, ou outras questões que resultam da nossa dependência energética. O consumo na China é uma das principais causas das dificuldades com que nós temos que gerir a nossa dependência energética.

E sobre isso, queria chamar a vossa atenção para uma coisa curiosa, que é uma projecção do que acontecerá no consumo chinês se a China evoluir para um nível de consumo parecido com o dos países ocidentais. Os números são impressionantes. Para termos uma ideia, nos Estados Unidos da América, de uma forma geral, cada cidadão tem um carro, não chega, é 0,95. Ou seja, por cada cidadão há 0,95 carros, se quiserem em números razoáveis, há 950 carros para cada 1.000 habitantes. Esse número é grosso modo metade na Europa, na Europa nós temos 584 carros para cada 1.000 habitantes, Portanto, de uma forma geral há um carro para cada dois habitantes.

A situação na China é bem diferente, a situação na China é que existem 8 carros para cada 1.000 habitantes. Bem, qual é a situação que se cria com isso? É que é expectável que o mercado chinês queira aumentar, ou seja, que os chineses considerem, tal como os americanos e os europeus, que também têm direito a ter carros. Agora, imaginem que à data de hoje, em 2007, a China tem tantos carros quanto os americanos. Isto é, que existem 150 carros para 1.000 chineses.

Qual seria a consequência disto? Se a China tivesse tantos carros como os americanos, a actual capacidade de produção petrolífera não seria suficiente para alimentar o parque automóvel da China. Todo o petróleo produzido no mundo não seria suficiente para assegurar a alimentação dos carros chineses.

Isso dá-vos uma ideia de qual é o impacto de crescimento da produção de petróleo na China.

A China é também responsável pelo aumento do consumo de cobre e aço. No total de consumo, são já o maior consumidor mundial, 20% do cobre e 30% do aço, são consumidos na China.

Há uma margem de crescimento muito razoável. Há uma margem de crescimento, que como podem ver pelo gráfico que vai aparecer e que eu acho particularmente impressionante. O volume das bolas significa os habitantes, percebem que a bola maior é a China, nós estamos aqui, União Europeia, neste eixo nós temos o produto em bruto, ou seja, quem tem mais riqueza produzida são os Estados Unidos, e neste eixo temos o rendimento per capita, estes eixos não estão numa escala aritmética, estão numa escala progressiva e portanto, têm que perceber, aqui temos 100 mil, aqui já temos 10 mil, aqui temos mil. É irrazoável esperar que esta bola da China e esta bola da Índia continuem neste canto do gráfico, quer sob o ponto de vista do produto em termos globais, em termos brutos, quer sob o ponto de vista do rendimento per capita, eles tenderão a seguir esta linha. Isto é, subir para cima e deslizar para direita, sendo mais ricos em termos globais, e sendo mais ricos per capita.

Essa evolução é a evolução normal dos próximos anos na China.

Globalização da cultura, outro retrato. O Amazon todos sabem o que é, o que é que significa em termos de comércio em linha de pagamentos on line, e de pressão sobre os sistemas de distribuição, vários países tiveram que alterar o seu sistema de correios, para responder às necessidades da Amazon.

Literatura. Literatura globalizada, o exemplo talvez seja este livro. A Dra. Leonor Beleza esteve na Índia, falou-nos na Índia, não nos falou deste livro que estava a ser vendido em Bangalore na Índia, mas também estava a ser vendido na China, também estava a ser vendido em Hong Kong, também estava a ser vendido na Malásia, também estava a ser vendido em Londres, também estava a ser vendido nas Filipinas, também estava a ser vendido no Japão, e quando chamo a atenção para isso, não estou a falar apenas de traduções, que há livros que são traduzidos em diversas línguas, estou a falar-vos de um livro que teve um lançamento mundial, com uma estratégia de lançamento e uma cronologia de lançamentos feita para ter o maior impacto ao nível mundial.

Este livro, que alguns de vocês já terão ouvido falar, o Harry Potter, também existe em filme, e o filme tem uma grande projecção, mas não é o único. Este é o filme que eu vos recomendei, o Dia Depois de Amanhã, filme também é o de  Lord Vader, que é uma imagem que toda a gente conhece, e o facto de nós conhecermos estas imagens, é também uma evidência da globalização.

Por ano, na Europa, são exibidos, grosso modo, 500 filmes europeus, e 200 americanos. Mas desta produção, 500 europeus e 200 americanos, vistos por mais de 5 milhões de europeus, portanto, com taxas de audiência superiores a 5 milhões, só 30 europeus e 144 americanos. 83% dos filmes europeus são vistos por menos de 1 milhão de pessoas.

Se juntarmos o market share dos Estados Unidos e da União Europeia, juntamente com as populações destas áreas, dos filmes vistos por mais de 5 milhões de pessoas, 404 são americanos e apenas 40 são europeus.

Esta é uma análise que a Comissão Europeia fez, sobre os filmes na Europa. Dos filmes que são vistos pelos europeus, 73% são filmes americanos; 15% são filmes do país europeu onde se está, isto é uma média; 8 % são doutros países europeus; e, apenas 4% são de outra origem.

Outra expressão da globalização da cultura, são os downloads da música, é a revolução do MP3. Onde, uma vez mais, a distância perde sentido. Já não é necessário irmos à discoteca ao lado, e temos acesso a músicas que vêm do outro lado do mundo, em vez daquelas que são feitas por bandas ou grupos que vivem na nossa própria cidade.

Outra fotografia, a globalização da saúde. A globalização da saúde é um dos problemas maiores da saúde pública, por causa da rapidez no contágio, da dispersão dos vírus. Estamos habituados a ver os alertas da Organização Mundial de Saúde, e é obrigatória a intervenção de um escalão a nível mundial para prevenir a disseminação de vírus perigosos.

Tivemos as vacas loucas, tivemos a gripe aviária, tivemos a pneumonia atípica, como alguns dos casos mais mediáticos.

Agora, há doenças de que se fala pouco, mas ainda são chagas. Uma delas é a lepra, a lepra previa-se que estivesse sido erradicada no ano 2000, pois bem, continua em 15 países e há 500.000 novos casos por ano. Há uma previsão agora para ser erradicada até ao ano 2030, mas, é apenas uma previsão.

A Sida, é outro exemplo. Em 2002 houve 3 milhões de mortos, 5 milhões de novos infectados com o vírus HIV. Há 42 milhões de seropositivos no mundo, desses 42 milhões dois terços estão na África subsariana, menos de 4% destes casos estão tratados. Ou seja, há 96% de seropositivos que não estão a ser acompanhados, e dizem as estatísticas que há 14.000 novos casos por dia.

Isto é uma imagem da disseminação da gripe aviária pelo Mundo, com indicação onde houve casos mortais e pessoas afectadas, vemos no mapa que é um fenómeno global.

Este é uma evolução do HIV, a linha vermelha são as mortes, esta linha azul são os casos de seropositividade na África subsariana, que está a estabilizar ou a decrescer. Mas nos países desenvolvidos a curva está a aumentar. Embora sob o ponto de vista da sua expressão numérica, não seja tão grave, é um fenómeno crescente e não decrescente.

Este é um dos problemas de saúde pública, o problema da Obesidade. Este cavalheiro está muito orgulhoso porque venceu a anorexia, já falamos disso também, este fulano está orgulhoso por outra razão, chama-se Daniel Sadler, tem 18 anos de idade, e ganhou um concurso mundial de dietas de emagrecimento, perdeu metade do peso, perdeu 83 quilos, mostra os jeans que usava antes numa sessão fotográfica tirada num hotel de Londres onde recebeu o prémio. Este rapazinho pesava 165 quilos, e agora está francamente mais elegante como se pode ver pela foto. O problema da obesidade é um problema global, mas com maior expressão nos países mais ricos, como se pode ver por este gráfico, e o problema da obesidade é que hoje tem uma projecção não apenas nos adultos mas também nas crianças, e a obesidade infantil é um problema de saúde pública grande. A Times Magazine em 25 de Junho de 2007, escrevia a propósito, que “a comida não é só o que comemos, descreve as tendências das economias, reflecte a alteração do padrão das alianças geopolíticas e comerciais, e define os nossos valores, a nossa posição social, e a nossa saúde para o melhor e para o pior”.

A moda também está globalizada. Vocês vão a qualquer cidade do mundo, dos países mais desenvolvidos aos países menos desenvolvidos, e vêm as mesmas lojas com as mesmas marcas. Isso não é apenas uma questão comercial, é naturalmente uma questão comercial, há uma estratégia comercial, mas, para lá da projecção comercial, há uma projecção estética, há padrões de gosto, de moda, que dessa forma são generalizados ao mundo inteiro.

E atrás dos padrões estéticos muitas vezes vão padrões de outras coisas. Hoje é um problema de saúde pública, a anorexia, sobretudo junto a jovens adolescentes, que sobretudo as mais sensíveis, seguem exemplos dos desfiles da moda que abusam das modelos desnutridas – para usar um termo elegante.

Esta é uma frase publicitária a propósito do Wonderbras, censurado, como são censuradas as revistas que entram na Arábia Saudita, dizendo que o Wonderbras estará disponível proximamente nos Estados Árabes Unidos. A sugestão subliminar é de que com o Wonderbras a senhora ficará com uns seios que ocupam o espaço que está marcado a negro. E portanto, uma projecção deveras interessante, quem olha esta publicidade, pensará que é um ocidental dinamarquês a gozar com os países muçulmanos, curiosamente esta publicidade foi desenvolvida no Dubai, para alguns países muçulmanos mais liberais.

Globalização do ambiente. O ambiente é das expressões mais notáveis da globalização, por razões que nós percebemos, o mar é de todos, os rios são muitas vezes internacionais, e o ar não conhece fronteiras. A imagem do Prestige. O Prestige afundou-se em Novembro de 2002, derramou 6.000 toneladas de combustível nos mares, teve a projecção que se recordam, dramática. Mas para lá das 6.000 toneladas que vierem ao de cima com o Prestige estão lá em baixo 70.000 toneladas, se vierem à superfície vão causar uma destruição muito maior do que aquela que foi causada com 6.000. Estão 70.000 toneladas lá em baixo. Quando vocês ainda estavam em férias, eu pensava em vir aqui para a Universidade de Verão, uma embarcação de 145 metros, o D. Pedro, de uma empresa chamada IscoMar, que fazia transporte de contentores, bateu em Ibiza, terão acompanhado isso nas notícias, lançou apenas 100 toneladas de fuel, nada como o Prestige, e 50 toneladas de gasóleo, portanto, uma coisa pequenina comparado com o outro, foi suficiente para pôr o alarme nas praias de Espanha, tiverem que se fechar duas praias grandes em Ibiza. Esta é uma fotografia da praia de Talamanca que ficou fechada para ser limpa. Com consequências no turismo espanhol.

Esta é a imagem dos Glaciares. A previsão dos ambientalistas, é que o degelo dos glaciares causará uma grave crise hídrica. 80% dos glaciares dos Himalaias estarão derretidos nos próximos 30 anos. E vocês perguntarão, olhando para mim, porque é que aquele Deputado careca estará aqui a chatear-nos com o degelo dos Himalaias, porque carga de água é que estaremos preocupados com os glaciares dos Himalaias.

Primeiro, porque, hoje, nós sabemos que todas as consequências climáticas se projectam sobre o globo, e não apenas na zona geográfica onde elas podem ter expressão. Mas o problema do degelo dos glaciares dos Himalaias é que isso pode significar que os três principais rios da Índia ficarão a ser rios sazonais: seis meses de seca e seis meses de água, na altura das monções. Entre eles, o rio Sagrado, o rio Ganges.

Dito de outra forma, o degelo dos glaciares dos Himalaias, vai afectar o abastecimento de água potável a perto de mil milhões de pessoas, ou seja, a um sexto da humanidade.

E não é expectável presumir que, se tivermos mil milhões de pessoas com alguma capacidade económica, que a Índia já tem, a precisarem de água potável, isso não vai ter repercussão no resto do mundo e também em Portugal, quer por via de emigração, quer por via do aumento do custo da água, quer por via dos desequilíbrios ambientais que isso pode trazer.

O desespero da água, é um desespero grande, a água é vida. Um relatório da CIA, um relatório público, aprovado pelo director da CIA há dez anos, antevia que nos próximos 30 a 50 anos, as lutas pela posse da água, possam ser mais determinantes, e sob o ponto de vista militar mais expressivas, mais violentas, do que as lutas pela posse do petróleo. Ou seja, de que a água possa ser nalgumas partes do globo, um bem mais disputado do que as fontes de matérias primas.

E a ONU, através da Universidade das Nações Unidas, prevê para 2010, dentre de três anos, 50 milhões de refugiados. Não os refugiados das guerras, não os refugiados normais, mas aquilo que eles chamam refugiados ambientais: esgotamento do solo, desertificação, enchentes, catástrofes naturais, mudanças climáticas. Esta noção de refugiado ambiental não existe no direito internacional, mas a previsão já está aí, dentro de 3 anos, teremos 50 milhões de refugiados ambientais.

Mais de mil milhões de pessoas não têm acesso a água potável, e as diferenças entre 90 e 2004, é que de uma forma geral há uma evolução positiva, excepto na Europa e na Ásia Central, no Médio Oriente e no Norte de África, e na África subsariana.

Outra questão, que já falámos aqui com o prof. Joanaz de Melo que tem a ver com as emissões de CO2. Vêem que desde 60 a 2002, as emissões de gases com efeito de estufa continuam a aumentar. Os Estados Unidos têm duas vezes as emissões da União Europeia, as previsões da ONU é de que continue a haver um aumento até 2010, e que os países industrializados continuem a subir mais do que a média do mundo. Ou seja, os países que deviam dar o exemplo e deviam fazer um esforço maior para conter essas emissões. A recuperação do Leste Europeu e o crescimento das chamadas economias emergentes, tenderá a agravar e não a diminuir este fenómeno.

Este é um gráfico para o qual chamo a vossa atenção. Estas bolinhas amarelas são os objectivos a que os países se comprometeram no âmbito do Protocolo de Quioto, são os objectivos para 2008-2012. E as colunas azuis são as emissões em 2003, portanto, já produzidas. Portugal não tinha apenas um dos maiores crescimentos face aos seus objectivos. Já estava a emitir bastante mais do que era expectável, e já ultrapassou em 2003 o tecto que tinha sido fixado para 2008.

Outro retrato: globalização das Migrações. Os migrantes têm subido num número exponencial. Em 1970 eram, grosso modo, 82 milhões, e hoje são 200 milhões de migrantes. 200 milhões de migrantes corresponde mais ou menos à população do Brasil, que é o quinto maior país do mundo. E isto dá-nos uma ideia de qual é a expressão desta realidade. Em 2000 a Europa já tinha mais entradas legais do que os Estados Unidos e o Canadá juntos. São quase 2 milhões de pessoas que estão a entrar por ano legalmente na União Europeia e, segundo a Europol, há a acrescentar a isto mais de meio milhão de entradas ilegais. Prevê-se que neste momento haja entre 3 a 5 milhões de imigrantes ilegais na Europa.

A taxa de fecundidade baixou, baixou 50%, baixou de 6 filhos para 2,9. Têm aí a taxa de fecundidade entre a África subsariana e a Europa, 5,4 para a África subsariana e 1,4 na Europa, e ao mesmo tempo que a taxa de fecundidade baixou, subiu a esperança de vida. A esperança de vida aumentou nos últimos anos de 48 para 64 anos, portanto, um aumento significativo. As previsões são de que no ano de 2050, nós tenhamos 9.300 milhões de habitantes.

Qual foi o impacto deste imigração? O impacto desta imigração é o seguinte: é que nalguns países, e chamo a atenção para a Europa, o crescimento populacional que se verificou, por exemplo, entre 90 e 2000, foi 89%, graças à imigração. Ou seja, o aumento da população que nós tivemos na Europa, não foi graças a novos nascimentos, isso é apenas atribuível a 11%, 89% do aumento da população deve-se à imigração.

A Europa está envelhecida. Em 1975, a população com mais de 65 anos eram 13%; em 95, eram 15%; e as previsões para 2025, é que sejam 22%. Ou seja, que do total dos habitantes europeus 22% tenham mais de 65 anos.

E a Europa até 2030 vai precisar de 21 milhões de trabalhadores para lá da sua base de trabalho, ou seja, vamos precisar de imigração, pelo menos, ao nível de 21 milhões de imigrantes, para sustentar os nossos processos produtivos e a nossa economia.

Isto é uma imagem de fluxos de imigração, é uma comparação impressionante. A África subsariana tem o dobro dos habitantes da Europa, isto é a Europa a 15, 15 ou a 12, ainda com 312 milhões de habitantes, a África subsariana tem grosso modo, 770 milhões, e vêem a comparação do produto. Ou seja, quem tem o dobro dos habitantes, tem 621 milhões, e quem tem metade tem 9.000 milhões.

Esta comparação justifica porque é que as pessoas imigram. Porque é que elas imigram? Vamos comparar a zona euro com a África Subsariana. Esperança de vida: na Europa 80 anos, na África Subsariana 47; taxa de crescimento da população: 0.6 taxa de fecundidade na Europa, 2.3 na África Subsariana; percentagem de população com a escolaridade obrigatória, o ensino básico: 98.9 na zona euro, 65.7 na África Subsariana; percentagem da população com SIDA: 0,3 na zona euro, 5,8 na África Subsariana; acesso à Internet por mil habitantes: 440 na zona euro, 29 na África Subsariana; número de dias necessários para constituir uma empresa, ou seja, nível de empreendorismo: 27 na zona euro, 62 na África Subsariana.

Nós temos também isto: os preços no mercadonegro para o tráfico de seres humanos, quanto é que é por barco, quanto é que é por terra, e quanto é que é por ar. São números recolhidos pelas Nações Unidas. E uma coisa muito curiosa: não é há 50 anos atrás mas em 1990 os países subdesenvolvidos tinham como principal fonte de receita a ajuda internacional, - é esta linha. Em 2004, as remessas dos imigrantes já eram mais ou menos três vezes a ajuda internacional. E hoje além das remessas dos imigrantes, temos investimento directo estrangeiro. Ou seja, a imigração tem consequências financeiras quer para os fluxos financeiros internacionais, quer para o desenvolvimento das terras de origem.

Tudo isso levou Kofi Annan, na altura Secretário-Geral das Nações Unidas, a dizer uma coisa que alguns continuam politicamente a não querer compreender, é que “não podemos parar as migrações, temos de saber geri-las”.

Vocês não repararam, mas têm lá ao fundo um esquema, ali na ponta esquerda é o ano -500 mil a.C., e na altura prevê-se, (de acordo com os paleontólogos) que existissem dezenas de milhares de habitantes na Terra. Por volta de -400 mil a.C., devia haver centenas de milhar, e esta linha continua praticamente, ao longo de toda a história da humanidade equilibrada, até aos últimos dois milénios. É nos últimos dois milénio que esta linha dispara. E dispara, particularmente, no último milénio, como vão ter ocasião de ver. E isso, podem ver já aqui. Quando Cristo nasceu havia 250 milhões de habitantes, depois de Cristo tínhamos 350 milhões, temos o primeiro milhar de milhão em 1800, o segundo em 1927, o terceiro em 1960, 74, 87 e 99.

Quero chamar a vossa atenção a vossa atenção para os intervalos. Isto é, entre o primeiro milhar de milhão e o segundo milhar de milhão, entre 1800 e 1927 foram necessário 127 anos para a humanidade crescer mil milhões de habitantes. Entre 27 e 60, ou seja, entre 2 mil milhões e 3 mil milhões, já foram necessários apenas 33 anos. Para o outro milhar de milhão, foram necessários 14 anos. Aqui foram 13, e aqui foram 12. E se esta evolução continuar, em 2010, ou seja 11 anos depois de 1999, nós estaremos com 7 mil milhões de habitantes, e esta progressão tende a prosseguir.

Ou seja, temos um problema na população mundial que é o crescimento veloz, assustador do número de habitantes no globo para partilhar recursos e para gerir necessidades.

Outra fotografia é a globalização do crime. O crime transnacional está a aumentar, o crime organizado. Todos os relatórios internacionais o indicam. O terrorismo, que é a nova expressão do crime organizado. E aquilo que é o núcleo das actividades criminosas, que é o branqueamento de capitais, a lavagem de dinheiro.

O tráfico de seres humanos, nos últimos anos, elevou-se à terceira categoria de actividades criminosas mais rendosas, ao nível internacional. Segundo a ONU, e a CIA confirma esses dados, a seguir ao tráfico de drogas e ao tráfico de armas, o tráfico de seres humanos é a actividade mais lucrativa. E todas as grandes redes criminosas, hoje são especializadas em diversos tipos de actividade criminosa: fazem branqueamento de capitais, podem fazer terrorismo, fazem tráfico de produtos tóxicos, fazem tráfico de armas, fazem tráfico de droga, fazem tráfico de seres humanos, e por aí fora.

O tráfico de seres humanos é para trabalho escravo, é para aproveitamento sexual, quer por via da prostituição, quer por via da produção de material pornográfico (filmes, fotografias, etc.), e é para uma coisa que nos horroriza ainda mais, que são as redes de extracção de órgãos. Que precisam das pessoas, fiquem elas mortas ou vivas, depois de extraírem os órgãos. E quando falamos de tráfico de seres humanos, falamos de homens, de mulheres, mas também de crianças. Prevê-se que hajam dois milhões de menores explorados no mundo inteiro. Na Ásia prevê-se que existam um milhão e quinhentas mil crianças prostitutas, e existem mais de 20.000 sites pedófilos já identificados no mundo inteiro.

O carácter transnacional do crime, lança uma responsabilidade para a União Europeia, que não tem fronteiras internas, que é a necessidade de reforçar o controle das fronteiras externas e essa é uma das matérias a que dou mais importância no Parlamento Europeu, uma vez que sou o Relator permanente do Parlamento para as fronteiras externas do espaço Schengen.

Concluídos os retratos da globalização, é altura de concluir respondendo à questão: a globalização é bom ou mau? É bom ou mau?

Tem aspectos positivos e tem aspectos negativos.

Deixem-me ver rapidamente alguns aspectos positivos segundo os defensores. Os países mais abertos ao comércio internacional são aqueles que crescem mais. E, portanto, devemos estar abertos à globalização para poder crescer e ter mais riqueza.

Há uma identificação do crescimento per capita, com os países globalizados. Têm aí os países não globalizados com rendimento per capita a decrescer, os países ricos, com crescimento do rendimento per capita na ordem dos dois dígitos, e, a seguir a 1980 os países que aderiram à globalização, a crescer bastante.

O Fundo Monetário Internacional, sublinha os casos do Botsuana, da China e da Tailândia que, praticamente, duplicaram o rendimento per capita.

Relativamente à questão da pobreza, as economias dos países subdesenvolvidos, aumentaram a taxa de mercado nos fluxos do comércio internacional. Ou seja, a acusação de que a globalização tem como consequência que apenas os mais ricos ganham mais dinheiros, parece desmentida com a circunstância de, os países subdesenvolvidos verem aumentar a sua faixa de negócio com a globalização.

E, finalmente, a percentagem de pessoas que vivem com menos de 1 dólar por dia, (1 dólar são 80 cêntimos, grosso modo), está a decrescer em termos percentuais. Sublinho em termos percentuais, porque não significa a diminuir em termos reais. Como temos mais habitantes, desde que se consiga manter, congelar o número de pessoas nessas circunstâncias, temos uma diminuição percentual que está assinalada no gráfico que vocês vêem.

Dois gráficos que decompõem isto por regiões, demonstram que de uma forma geral, essas pessoas estão a diminuir em todas as zonas, excepto na Europa. Na Europa e na Ásia Central, há mais pessoas muito pobres a aumentar, o que não deixa de fazer um sinal de alarme sobre o nosso modelo civilizacional. Isso também se verifica nas pessoas com menos de 2 dólares por dia, em que uma vez mais, só na Europa e na Ásia Central é que há crescimento. Entre 1981 e 2004.

Quais são as críticas à globalização?

Primeiro, as críticas pelos desequilíbrios. Desequilíbrios que já vimos, todos os anos desaparecem 37.000 km2 de gelo, o que é atribuível ao consumo desenfreado, ao estímulo da industrialização, a uma industrialização insensata. Todos os anos desaparecem 140.000 km2 de floresta. 12.500 espécies de fauna e flora em risco de extinção. Os transportes, que são responsáveis por 25% das emissões de CO2. Em 1950, 65% da população vivia no campo, e prevê-se que em 2025, 60% irá viver nas cidades.

Segunda crítica, há indiscutivelmente uma distribuição da riqueza muito desigual, como se pode ver nesse mapa, e como se pode ver nalguns dados que eu gostaria de deixar para a vossa memória.

Os dados são impressionantes: 1/3 da população mundial, 2 mil milhões de pessoas, eu sei que estes números, a esta altura nós já estamos insensíveis, nós em Portugal somos 10 milhões, na Europa comunitária somos 500 milhões, meio milhar de milhão, 500 milhões, a China e a Índia são, grosso modo, números redondos, mil milhões, 1.300 milhões na China, mil milhões na Índia.

2 mil milhões, vivem com menos de 2 dólares por dia; mil milhões vivem sem habitação, não têm habitação, não têm tecto; 1.200 milhões, não têm água potável; 600 milhões de crianças, estão na pobreza; 2 milhões de crianças, morreram na última década devido às guerras; e, existem em 68 países, 110 milhões de minas por detonar.

Os fluxos estão muito desequilibrados, a Europa, a América do Norte, o Japão, e oito províncias costeiras da China, concentram 90% do Investimento Directo Estrangeiro; o resto do mundo, com 70% da população, é destinatário dos 10% de Investimento Directo Estrangeiro remanescente.

Três famílias, entre elas a do sr. Bill Gates, têm tanta riqueza como os 48 Estados mais pobres de África, que têm 600 milhões de habitantes. Três famílias têm tanta riqueza como 48 Estados de África, com 600 milhões de habitantes.

Os 225 homens mais ricos do mundo, têm tanta riqueza como metade da humanidade: 3 mil milhões de pessoas mais pobres do mundo.

20% do mundo, consome 80% dos recursos. E nós, estamos do lado dos 20%.

De cada 100 crianças nascidas, 55 nascem na Ásia, 16 na África, as outras dispersas, e 33 destas 100 crianças, nunca serão registadas. Nunca terão um BI, serão desnutridas, nunca serão vacinadas, não saberão o que é água potável, mas muito provavelmente vão saber o que é a guerra.

Todos os anos morrem crianças com menos de 5 anos, por doenças evitáveis, sobretudo devido à má qualidade da água: doenças diarreicas. Resolúveis com qualquer medicamento de venda livre nas farmácias portuguesas. As crianças que morrem com menos de 5 anos no mundo inteiro, por causa disso, são 11 milhões por ano, ou seja, 30 mil por dia.

Se eu quiser violento, em termos retóricos, digo-vos estou-me nas tintas para as 30 mil crianças que vão morrer hoje. Estou preocupado com as que morreram ontem, e co  as que vão morrer amanhã, e depois de amanhã, e depois, e depois de amanhã.

Mas há crianças que são felizes, que são ajudadas, que vivem no nosso mundo, há crianças cujas fotografias nos inspiram ternura e simpatia e são umas bonequinhas, mas há outras que passam fome e que lutam pela sobrevivência, e estas duas imagens vocês sabem pelos números que vos dei, que são imagens de vários milhões que existem no mundo todo.

Isso levou, Lula da Silva, Presidente da República Federativa do Brasil, a criticar esta ordem económica, dizendo que é uma ordem económica em que poucos comem cinco vezes por dia, e muitos passam cinco dias sem comer.

Minhas Caras Amigas e Meus Caros Amigos, tenho uma má notícia para vos dar e uma boa notícia para vos dar. A má notícia é que vivemos mesmo num mundo muito desigual; a boa notícia é que vocês estão na parte boa do mundo.

Todos nós temos problemas e todos nós estamos na nossa vida confrontados com muitos problemas, mas quando abrimos a torneira e bebemos água, não corremos perigo de vida; e há milhões de pessoas que não se podem orgulhar do mesmo, por esse mundo fora.

Respondo e concluo, a globalização é boa ou má?

Eu digo-vos que é inevitável. Não vale a pena ter preconceitos ideológicos, não nos leva a parte nenhuma; não vale a pena lutar contra aquilo que é inevitável, o que temos é que tirar partido das oportunidades e prevenir os aspectos mais controversos e mais problemáticos. E, desde logo, não podemos pensar que vamos enfrentar a globalização sozinhos. Portugal não tem peso específico. Mas Portugal não está isolado, Portugal está na União Europeia e é dentro da União Europeia que faz esse combate. Um exemplo flagrante, foram as negociações com a China a propósito dos têxteis.

E não estamos sozinhos nesta guerra. Isto é, para aqueles tontos em Portugal, que acham que Portugal podia estar fora da União Europeia, vale a pena ver o que é que se passa no mundo, isto não é nenhuma bizarria, o mundo está organizado em blocos, porque todos têm o mesmo problema.

Nós conhecemos a CEI, a Comunidade de Estados Independentes, que tentou manter no mesmo espaço económico as antigas Repúblicas da União Soviética; conhecemos a União Europeia, que é o nosso espaço; conhecemos também a União Africana, que com os problemas de África que vimos, está a tentar imitar a União Europeia. A União Africana, está a tentar, e acho que vai conseguir um dia (não será a curto prazo), ter uma moeda comum, ter uma união política, ter um mercado interno como a União Europeia, ou pelo menos algum nível de cooperação económica.

Isso já existe nos países do ASEAN, que envolve 500 milhões de pessoas: a Indonésia, a Malásia, as Filipinas, Singapura, Tailândia, Brunei, Vietname, Laos e o Myanmar, têm 500 milhões de habitantes, e essa zona é uma zona crucial do globo, porque é uma zona onde está metade da população mundial, a China, a Índia, a Indonésia, o Paquistão, o Japão e o Bangladesh têm metade, (3 mil milhões de pessoas) estão nessa zona, ainda sem uma coesão económica, mas também a dimensão da China e da Índia não os obriga a associar-se a ninguém, por si só são grandes potências, e sê-lo-ão cada vez mais no futuro.

O Mercosul, que está a alargar-se. E a NAFTA, a North American Free Trade Association, que o presidente Bush quis alargar. Reparem, há um mercado do México, dos Estados Unidos e do Canadá que o presidente Bush achou que não era suficiente, e tentou alargar à América do Sul, lançando a AFTA- American Free Trade Association, ou em português, a Associação Livre de Comércio Americano, que foi travada porque o Brasil travou, achou que era má para a América do Sul, e infligiu uma desilusão ao presidente Bush.

A União Europeia, quer sob o ponto de vista dos bens, quer sob o ponto de vista dos serviços, é o maior mercado do mundo, mercado maior que os próprios Estados Unidos, como se vê pelos gráficos que têm aí.

Bem, e com a consciência que estou a falar há tempo de mais e que vocês já estão fartos de me ouvir, termino com uma nota de política, porque vocês são quadros políticos e interessam-se por isso com certeza, que é: como é que os portugueses olham para a globalização? E como é que os europeus olham para a globalização?

Há países como a Dinamarca, em que os europeus vêem aspectos positivos e oportunidades na globalização, e apenas 16% vêem na globalização uma ameaça.

Portugal, está aqui, abaixo da Bélgica, e Portugal tem uma situação equilibrada, embora um bocadinho mais céptica. Portugal tem 39% de pessoas que vêem a globalização como uma ameaça, e 37%, dois pontos menos, que a vêem como uma oportunidade.

Mas dos países mais cépticos, temos Chipre, Luxemburgo e a França. E quando vemos este valor da França, 64% dos franceses vêem a globalização como uma ameaça, e apenas 25% vêem como uma oportunidade, percebemos algumas das afirmações do presidente Sarkozy.

Meus caros amigos, espero ter-vos dado uma perspectiva geral, mais complexa, mas mais completa do que é a globalização nos dias de hoje.

Muito obrigado pela vossa atenção.

(APLAUSOS)

 

Pedro Rodrigues: - Obrigado Carlos, vamos então iniciar a fase das questões dos grupos inicialmente previstas. E dou a palavra ao Grupo Amarelo, ao Fernando Araújo.

 
Fernando Araújo
Muito bom-dia a todos. Um cumprimento especial ao nosso Reitor da Universidade de Verão, que agora veste a camisola de orador. A nossa questão é a seguinte: há uns anos atrás aprendíamos com um conceituado em economia que os factores de produção era o capital e o trabalho, hoje em dia já se começa a falar em quatro factores de produção, capital, trabalho, matérias-primas, e empreendorismo. E sempre que a essência da globalização está nas operações cada vez mais globalizadas desses quatro factores de produção, a minha pergunta é, que políticas devem os governos europeus implementar para ajudar as suas empresas a competir no mundo globalizado?

E nesta perspectiva, que importância pode desempenhar a imigração, e saliento a imigração com ‘i’, nestas medidas, tendo em conta o surgimento de uma sociedade multicultural?

Muito obrigado

 
Dep. Carlos Coelho
Muito obrigado pela pergunta. Eu não sou economista não estou em condições de vos dar uma resposta global, relativamente a quais são as políticas que os governos têm que aplicar.

Diria que há coisas relativamente razoáveis, isto é, não faz sentido termos políticas proteccionistas para manter artificialmente empresas que não tem qualquer viabilidade, que drenam recursos públicos e que não são competitivas.

Creio que aquilo que os Estados devem fazer é tentar que as suas economias sejam o mais competitivas possíveis e, portanto, tirar partido onde pode haver mais valias, em que pode haver ganhos. Isso significa ter uma visão, se quisermos, mais liberal da economia. Eu receio que em muitos países europeus haja ainda uma lógica proteccionista que seja nociva do desenvolvimento que se pretende. Independentemente da simpatia que possa ter por algumas posições do presidente Sarkozy, receio bem que ele muitas vezes tenha esta visão proteccionista. Na discussão do Tratado ele veio com uma proposta completamente bizarra, que era voltar atrás no mercado interno. Bem, a União Europeia não faz sentido sem o mercado interno.

Em segundo lugar, a questão da imigração que você referiu e bem, é uma questão crucial. Como eu vos expliquei, até 2030 nós vamos precisar, grosso modo, por baixo, de 21 milhões de imigrantes. O que é que está a acontecer, está a acontecer que nós estamos entre dois extremos. O extremo político daqueles que dizem imigração sem controlo, toda a gente que entra deve entrar, o que é completamente demagógico, nós não temos capacidade de absorver todos aqueles que querem vir para a Europa, que vêem na Europa o El Dorado; mas também não podemos cair no discurso xenófobo, que é dizer, não, o mercado de emprego deve ficar para os que cá estão, porque não chega, a nossa economia não sobrevive assim.

E portanto, qual é a resposta? É matriciar a imigração. Nós temos que ter a capacidade de dizer quem é que queremos. Precisamos de Engenheiros, precisamos de Carpinteiros, precisamos de Programadores de Informática, precisamos de Médicos? O que é que precisamos? Matriciar a imigração.

Ora, isso é um discurso político que obriga a uma certa coragem, porque é um sistema de quotas, e há quem discorde. Há quem discorde à esquerda e à direita. Uns porque vêem no imigrante um potencial criminoso, e fazem um discurso completamente inaceitável, e outros porque acham que nos devíamos escancarar as portas e permitir que se entre de qualquer lado.

Eu prometi a mim mesmo que vou dar respostas curtas, até para permitir perguntas livres. Para já creio que estas duas orientações eram as mais importantes.

 

Pedro Rodrigues: - Obrigado Carlos. Dou agora a palavra ao André Salvado, do Grupo Encarnado.

 
Dep. Carlos Coelho
André, peço desculpa, antes de você começar, eu preparei-vos um caderno de documentação que está a ser fotocopiado, porque atrasei-me ontem a fazer as coisas, e às seis da manhã não consegui acabar tudo, faltava-me fazer o índice. Portanto, vocês vão receber um caderno de documentação, que são retratos. O caderno de documentação não é um texto, são vários textos, são sobretudo textos publicados no Courrier Internacional (a versão portuguesa), com retratos diferentes de factores da globalização que me parecem interessantes para vocês ficarem e lerem com tempo. São cerca de 10 a 12 artigos, alguns deles com mais de uma página, portanto, não é muito papel, mas são coisas que eu achei que valia a pena e que são interessantes.

André, peço desculpa.

 
André Salvado
Bom dia, caros colegas. A nossa pergunta gira em torno daquilo que nós, dentro do grupo, decidimos chamar mundo Babel. Passo a citar, em Babel a ideia original era construir uma torre muito alta onde pudessem por um objecto de idolatria, de forma que as pessoas acabariam assimilando a ideia que era a idolatria que controlava o que acontecia lá em baixo. Hoje, estamos a chegar a um ponto, em que todos nós conseguimos, de uma forma ou de outra, entendermo-nos por meio de uma plataforma comum. Povoando excessivamente algumas zonas, em vez de nos espalharmos de forma equitativa pela superfície terrestre, um pouco à semelhança do que aconteceu com os povos do oriente que habitavam Babel.

Tendo nós capacidade para executarmos quase tudo o que quisermos, e imaginando que nos tornamos unos como em Babel, o que esperar a seguir? O caos? O marasmo? Uma realização nunca antes conseguida? Não corremos assim, igualmente o risco de nos tornarmos seguidores de um mito algo superior, criando assim um ciclo?

Obrigado.

 
Dep. Carlos Coelho
Bem, essa é uma pergunta difícil, terão também um recorte de imprensa sobre isso, sobre os nacionalismos. Vamos cá ver, duas respostas diferentes: à medida que a humanidade está mais globalizada e que nós vamos a qualquer país do mundo e temos os McDonald’s e os Jeans e a moda está standardizada e portanto, há marcas que reconhecemos em qualquer lado, vimos emergir e reemergir os factores de identidade local, regional e nacional.

Mesmo em Portugal. Quanto mais integrados estamos na UE, mais aparecem pessoas a dizer: eu quero ser português. E sob um determinado ponto de vista isso é saudável. Eu digo sempre: eu quero ser europeu, mas sem deixar de ser português. Eu só sou europeu, porque sou português.

Acho que não podemos, mas acho irrazoável esperar que haja uma diluição das identidades, acho que a globalização acarreta, como uma lógica de contrapeso, um reforço das identidades.

Portanto, sob o ponto de vista da questão da identidade, eu não sou pessimista, sou um optimista.

Sob o ponto de vista da gestão, ou como se chama da governança. Isto vai ser uma torre de babel, vamos todos desentender? Eu acho que não, mas eu sou um optimista nestas coisas. Eu acho que as pessoas mesmo na sua falta de lucidez, são muito determinadas pela necessidade. Quando as coisas se têm que fazer, fazem-se. Ora, o mundo está hoje confrontado com problemas globais.

Portanto, se você falar com algum dirigente ecologista de há 15 anos atrás, ou de há 20 anos atrás, a perguntar se há 20 anos atrás se pensava que chegámos hoje ao nível de consciência ambiental e de pressão sobre os poderes públicos como nós temos hoje, diriam que não, que era impensável. Hoje qualquer líder no mundo, tem que pôr na sua agenda as questões ambientais. Porquê? Para parecer bonito? Bem, talvez, também por causa da imagem. Mas sobretudo porque o votante dá valor a isso. Porque há uma consciência social relativamente a um conjunto de problemas que não existiam há vinte anos atrás.

Nós dizemos em português que “a necessidade aguça o engenho”. Eu acho que o mundo está confrontado com problemas tais, que a necessidade vai obrigar a encontrar factores de regulação mundial. Como de certa forma já estamos a fazer no ambiente. O presidente Bush já se está a coçar todo relativamente às posições que tomou no que se refere ao ambiente. Ele foi desautorizado nas suas próprias fileiras. Hoje um dos maiores ambientalistas dos Estados Unidos da América, é o sr. Schwarzenegger, Governador Republicano.

Acho que as pessoas vão ganhando a percepção dos problemas, que isso vai gerar uma pressão sobre os decisores, que os obriga a encontrar as soluções.

 

Pedro Rodrigues: - Vou agora dar a palavra à Joana Simões, do Grupo Azul.

 
Joana Simões
Bom dia. O meu grupo gostava de lhe perguntar até que ponto é justa a aplicação do livre comércio e de livre circulação de pessoas e bens, quando existem países que não respeitam os direitos humanos, como por exemplo a exploração infantil, que acaba por vender os produtos mais baratos no Ocidente, como na China, como há pouco tempo foi falado, competindo com esses mesmos países que respeitam os direitos e as leis internacionais, nomeadamente os horários, e direitos sociais dos trabalhadores.

Obrigada.

 
Dep. Carlos Coelho
Vamos cá ver. Não há liberdade de circulação relativamente a esses países, a liberdade de circulação no nosso caso está limitada à Europa, dentro das fronteiras europeias, dentro da UE, temos liberdade de circulação.

Há é acordos comerciais, com maior ou menor índice de liberalismo com outros países, que são regulados pela OMC, pela Organização Mundial de Comércio, e é por isso que estamos a colocar na OMC um conjunto de dossiers. Estamos a fazer pressão para que a OMC regule o free trade, portanto, comércio livre, mas também o fair trade, comércio justo. Hoje em dia, nós não podemos, e a pergunta foi muito bem colocada, falar de free trade sem falar de fair trade, pelas razões que referiu. Eu não posso concorrer com um copo feito em Portugal e um copo feito na China, em termos de preço, ainda admitindo que a qualidade é exactamente a mesma, se para fazer este copo eu usei mão-de-obra infantil, crianças com menos de 14 anos a trabalhar 16 horas por dia, 7 dias por semana. Há milhões de trabalhadores na China a trabalharem em troca de uma malga de arroz. O que é completamente inaceitável. Ou com indústrias completamente obsoletas com um impacto terrível sobre o ambiente.

Portanto, isto não é fair trade. Estamos a tentar colocar as questões na Organização Mundial de Comércio, e temos mecanismos. Por exemplo, a União Europeia decretou multas para a China e congelou as exportações de produtos, calçados, têxteis, etc., porque violaram acordos, e não foi um problema ao nível do tipo de produção, mas foi ao nível do volume de exportação.

Portanto, temos mecanismos e estamos a utilizá-los.

Agora, estamos a utilizá-los porque estamos na União Europeia, se fosse Portugal sozinho a negociar com a China, não tinha força nenhuma para fazer nada, comia com os têxteis todos, quer quisesse, quer não quisesse.

 

Pedro Rodrigues: - Luís Valente, do Grupo Bege.

 
Luis Valente
Ora, muito bom dia a todos. A nossa pergunta vai mudar um bocadinho de assunto, não vamos falar sobre economia, mas doutro problema também dos nossos dias.

O problema do terrorismo. Deveremos optar por uma opção de força, militarizada, uma espécie de política mundial, ou por uma opção social, apoio a países subdesenvolvidos? E como explicar isto à população europeia, à sociedade, vítima até já de alguns atentados terroristas? Como é que conseguimos passar a mensagem de que as pessoas estão seguras? E já agora, outra pergunta muito pequenina, chegaram a passar voos da CIA por Portugal?

 
Dep. Carlos Coelho
Na análise das migrações eu não tenho dúvida nenhuma. Enquanto houver uma décalage terrível, como nós vimos nos gráficos que eu vos passei e espero não os ter afundado em números e afundado em gráficos, mas acho que nós temos que perceber qual é a realidade do mundo em que estamos. A décalage de nível de vida vai fazer uma pressão sobre os nossos países, e a única forma de evitar isso é investir no desenvolvimento desses países.

Portanto, uma política activa de desenvolvimento desses países é essencial para a Europa, para América e para os países desenvolvidos.

Agora, eu não acho que isso resolva todo o problema do terrorismo ou sequer a maior parte do problema do terrorismo. Acho que o terrorismo se nutre de alguma revolta nalguns desses países, mas não é ditado genuinamente por isso. Há uma agenda, há uma agenda de um conjunto de radicais que quer destruir a sociedade ocidental. E portanto, relativamente a esses nós temos que lutar contra eles. Como é que se luta contra eles? Com medidas de prevenção, com medidas de repressão, e sobretudo com intercâmbio, intercâmbio de informação.

Um dos perpetradores do atentado de 11 de Março em Espanha, estava fichado na polícia alemã. A polícia alemã sabia que ele era um potencial terrorista, a polícia espanhola não sabia. Porquê? Porque não houve colaboração entre as polícias espanhola e alemão. Isso já não torna a acontecer. Porque essas informações estão a passar.

No combate aos crimes de ponta, já há um bom nível de cooperação entre as polícias, assegurado através da Europol.

E tem de haver transferência de informação ao nível da chamada inteligência, ou seja, dos serviços secretos. Os serviços secretos, têm que partilhar informação, neste momento estão a partilhar de forma muito incipiente, porque é um bocado como os exércitos, é uma questão de soberania. Quer dizer, cada chefe do governo tem os seus serviços secretos e não gosta de partilhar informação com os outros. Isso está a ser muito mais complicado.

O presidente Bush quando começou na guerra contra o terrorismo, com algum exagero, na minha opinião, nalgumas coisas, defendeu a partilha de informações entre os serviços secretos, o que ele chama o Intelligence Sharing. Eu quando fui a Washington a propósito da CIA, ouvi o ex-director da CIA numa audição à porta fechada, e perguntei-lhe o que é que ele achava do Intelligence Sharing, (ele é republicano, muito pró-Bush), e ele sorriu para mim, assim como se eu fosse um idiota, e disse: Ó Sr. Presidente, (eles nas audições são muito formais), quando as crianças são pequeninas e estão no jardim infantil, metemos os brinquedos na areia e ensinamos a partilhar os brinquedos, mas isso é para as crianças, os adultos não partilham nada e sobretudo, os serviços secretos não partilham nada. É a troca por troca. É o fair trade. Tem uma informação que me é útil, eu dou uma informação que é útil. Mas o quê? Partilhar informação? Assim, como quem diz: o quê, nós trabalharmos para vocês? Nem pensar nisso.

E isto é um problema, não está a partilhar.

Quanto aos voos da CIA, houve voos da CIA que passaram por Portugal, não tenho dúvidas nenhumas, a questão não é essa. A questão é saber se houve voos da CIA a praticar actos ilegais em Portugal, voos da CIA passam quase todos os dias. Isso, eu não sei, não posso provar, não tenho nenhum dado objectivo. Não tenho nenhum dado objectivo, que me diga, este voo praticou um acto criminoso, aterrou em Portugal ou passou pelo espaço aéreo português. Tenho suspeitas, mas não tenho nenhuma prova. E não tenho nenhum índice de probabilidade que tenha havido conivência das autoridades portuguesas.

Isto é, não estou sinceramente a ver que nenhum dos Primeiros-Ministros que passaram por essa fase, ou seja, António Guterres, Durão Barroso, Pedro Santana Lopes ou José Sócrates, porque há voos desde Guterres até Sócrates, eu não estou a ver o presidente Bush ou a Condolezza Rice a telefonar a Guterres, a Barroso, a Lopes ou a Sócrates a dizer: eu tenho uns aviões com uns tipos da CIA e uns gajos algemados, que em violação do direito internacional vão passar por aí, vocês importam-se?

Acho que há países onde houve comprometimento ao mais alto nível. Da Polónia não tenho dúvidas nenhumas mas aí havia uma prisão secreta em solo polaco, era mais complicado eles terem isso sem a conivência das autoridades.

 

Pedro Rodrigues: - Dou a palavra à Filipa Saldanha Figueiredo, do Grupo Castanho.

 
Filipa Saldanha Figueiredo
Bom dia, Sr. EuroDeputado. A minha pergunta é sobre as organizações internacionais. As organizações internacionais, no fundo, são fruto da globalização e nos vários âmbitos que abrangem e no papel capital que desempenham em termos de aproximação e de cooperação entre os Estados, a seu ver, quais são os prós e contras destas instituições que tanto unem os Estados como diluem as entidades?
 
Dep. Carlos Coelho
Eu não sei se partilho do seu pressuposto. Portanto, eu acho que a União Europeia une Estados mas não dilui identidade nenhuma. Desde logo, o modo de funcionamento, o português é a língua oficial da União Europeia, e não creio, sinceramente, que nenhum de nós que está nesta sala se sinta menos português por ser mais europeu. Não tenho nada essa percepção. Acho que há um conjunto de esforços no mundo para unir os países sob o ponto de vista estratégico, sob o ponto de vista económico, dei-vos alguns exemplos num dos últimos slides, mas não vejo que nenhuma dessas realidades faça diluir as identidades.

Vocês poderão dizer: ok, mas grande parte daquelas coisas não são tão bem sucedidas. Se calhar a União Africana é uma realidade virtual, a NAFTA é apenas económica. Tudo isso é verdade, mas não creio que uma coisa obrigue a outra como vos disse há pouco na primeira resposta que dei. Acho que a maior integração pode dar num mecanismo de equilíbrio, uma afirmação maior da diversidade cultural, da identidade de cada povo, e até da identidade de cada região.

Dou-vos um exemplo, bem sei que é marginal, mas no caso espanhol e no belga, a emergência dos factores regionais foi mais acentuado a partir do momento em que nós estamos na União Europeia. Ou seja, as regiões em Espanha falam mais alto quando a Espanha entrou a União Europeia. A Bélgica está à beira de uma cisão, está com uma crise política terrível, e eles não acham que acha risco nenhum porque estão dentro da União Europeia, se não tivessem na União Europeia pensariam duas vezes em partir o país ao meio, e isso pode acontecer.

Portanto, acho que uma coisa não obriga a outra, acho que, pelo contrário, uma coisa pode facilitar a emergência e o reforço das identidades.

 

Pedro Rodrigues: - Manuel Monterroso, do Grupo Laranja.

 
Manuel Monterroso
Sr. Deputado Carlos Coelho, antes de mais muito obrigado por ter feito uma exposição sobre este tema, que se reveste da maior importância nos dias de hoje, e que é tão abrangente, que até na moda, na moda dos soutiens é deveras interessante. Recentemente num encontro sobre a globalização o Prof. Aníbal Cavaco Silva afirmou que a competição à escala global está a mudar, emergindo uma economia cada vez mais baseada no conhecimento. Ora esta reflexão do Sr. Presidente da República leva-me a perguntar: havendo uma grande diferença entre os países a nível de conhecimentos, não se corre o risco dos países menos desenvolvidos não beneficiarem da globalização e assistir-se pelo contrário a um neo-colonialismo? Como se pode compatibilizar o processo da globalização da economia, sem o acelerar do desemprego?

Obrigado.

 
Dep. Carlos Coelho
São duas excelentes perguntas. Vamos cá ver, eu disse-vos que vocês não podem olhar para globalização com preconceito ideológico, mas também não devem olhar com ingenuidade.

A globalização acentua as diferenças de riqueza. Porque como gera mais riqueza e ela não é distribuída igualmente, as assimetrias são maiores. Aquela coisa de três famílias terem a mesma riqueza de 600 milhões de pessoas, aterroriza-nos.

E, portanto, isso pode acontecer e pode agravar-se. Pode agravar-se se os países se fecharem. O que é que está a acontecer no Zimbabué? Está a acontecer que um ditador está a dar cabo de um país, um país que até tinha um bom nível de vida, um bom nível de produção, está fechado relativamente à comunidade internacional, e está completamente arruinado. Até outras ditaduras africanas já não se coíbem de dizer que o Mugabe está louco e que está a afundar o Zimbabué.

 

Há alguns países que seguramente vão ficar cilindrados na história. Mas isso aconteceu em todos os processos.

O que nós, hoje, temos é uma maior consciência, há aqui um sistema mais transparente. E a opinião pública desses países pode perceber o que é que perdem não estando no processo de globalização.

Agora, admito que da comunidade internacional tenha que haver aqui uma atenção especial. O problema é que não há órgãos de governança mundial.

Deixem-me dar um exemplo concreto. Se eu, em Portugal, achar que há uma parte do território português que precisa de ser ajudada para ser desenvolvida, porque temos que alterar as estruturas todas, eu posso arranjar um conjunto  de mecanismos de apoio regional para investir numa determinada zona. De certa forma é aquilo que a União Europeia faz com os países da coesão, de que Portugal beneficia. Para que esses países se aproximem da média comunitária, nós temos aqui uma forma de regulação europeia, que é a Comissão Europeia, que é o Parlamento Europeu, que é o Conselho, que aplicam algumas verbas para que haja uma redistribuição. De forma a que, os ajustamentos que se fazem ao mercado, não se traduzam em mais pobreza e em mais desemprego.

Ora, ao nível mundial, isso não existe. E portanto, nós temos, aliás, na experiência recente, algumas receitas mais duras do FMI, que no momento em que foram aplicadas criaram grande insatisfação nos países que as tiveram de aplicar. Porque não houve nenhuma ajuda da comunidade internacional. Noutros casos houve, houve perdão de dívidas, portanto, créditos esquecidos.

Eu acho que no caso de África, a comunidade internacional vai ter que ter uma forma especial de ver, porque de outra forma, eles sozinhos, receio bem que não vão lá.

Quanto ao desemprego. O desemprego pode ser um custo de ajustamento. O problema aí é saber como é que nós nos defendemos. É que nós vivemos num Estado que tem preocupações sociais e tem um sistema social, com vulnerabilidades mas com preocupações. Hoje em dia está muito na moda a chamada flexsecurity. O que é que é a flexsecurity? É a garantia de que, por um lado, pode-se facilitar o despedimento para dar flexibilidade ao mercado de emprego e às empresas, mas ao mesmo tempo, atribuir uma responsabilidade social ao Estado para não deixar as pessoas penduradas na rua. Esse sistema funcionou nalguns países. Dizem os especialistas que é muito complicado funcionar em Portugal, e que seria ruinoso para as finanças publicas. Mas então temos que encontrar um modelo. Se nós queremos flexibilizar por um lado, temos que dar garantias de protecção por outro. Porque que para nós, as pessoas não são números, são pessoas.

 

Pedro Rodrigues: - Alexandre Leal do Grupo Cinzento.

 
Alexandre Leal
Bom dia a todos, cumprimento o sr. Eurodeputado, Carlos Coelho, o presidente da JSD, caros colegas.

Antes de mais, gostaria de lhe dar os parabéns por toda a capacidade organizativa desta iniciativa, que é a Universidade de Verão, e pela oportunidade que nos dá, de um enriquecimento dos nossos conhecimentos, e por esta excelente nova experiência que todos estamos a ter. E depois agradecer também, toda a excelente apresentação com que nos brindou esta manhã, e que acabou por, de certa forma, cortar algumas das perguntas que nós tínhamos preparado e que tivemos que aqui tentar ajustar um pouco, estas nossas questões.

De qualquer forma, a pergunta que o nosso grupo gostaria de colocar era que, tendo em conta o exemplo que nos deu da China com relação do número de carros e a necessidade da produção de petróleo, consequente do aumento desse número de carros. Com a potencial emergência que a China tem tido, se realmente esse potencial também se reflectir no aumento do número de carros, e se for de encontro também ao que se compara na América, como é que seria possível racionalizar os recursos e atingir o equilíbrio, e não estar a tirar a uns para dar a outros, e conseguirmos aqui criar a harmonia que se quer com toda esta aldeia global.

Obrigado.

 

Dep. Carlos Coelho: - Ó Alexandre, peço desculpa, a pergunta é como é que se redistribui?

 

Alexandre Leal: - Como é que conseguimos racionalizar os recursos para distribuir a nível global. Ou seja, não tirar a uns para dar a outros e conseguirmos equilibrar.

 
Dep. Carlos Coelho
Pois, eu acho que neste momento há vários cientistas e vários políticos à volta da mesa a tentar encontrar uma solução.

Isto tem uma expressão muito grande, sobretudo, na redução das emissões de CO2. Na prática a pergunta que o Alexandre faz é dizer: como é que nós distribuímos os custos deste ajustamento?

É mais fácil dar exemplos concretos, se não estamos a fazer um discurso teórico e torna-se pouco compreensível.

Cenário nº 1: eu digo o seguinte, congelo as emissões. Ou seja, nenhum país pode crescer as suas emissões de CO2.

O que é que isso significa? Significa que os chineses vão continuar a ter 8 automóveis por cada mil habitantes, não podem crescer. Significa que cada país subdesenvolvido, não se pode desenvolver, com indústrias, com actividades que têm emissão de CO2.

O Cenário do congelar as emissões de todos os países de uma forma igual é dizer, congela-se o subdesenvolvimento, cristalizam-se as diferenças entre os povos.

E, portanto, sob o ponto de vista ambiental, era uma óptima solução, melhor até era dizer não era congelar as emissões, era diminuir as emissões, mas, isso tem um preço social, e é insustentável na esfera internacional.

Uma outra abordagem é dizer: vamos fazer um esforço equivalente è riqueza, isto é, quem é mais rico paga mais.

Isto sob o ponto de vista do modelo não é muito eficaz, porque aqui o problema não é quem tem mais dinheiro ou quem tem menos dinheiro, é que quem polui mais ou quem polui menos. E é muito duvidoso que os países mais ricos aceitem uma solução dessas.

Em cima da mesa, neste momento, está uma solução que tem a ver com o número de habitantes. Isto é, prever quanto é que é possível cada um poluir. Aliás, o Prof. Joanaz de Melo falou disso na aula dele. E portanto, isso permitia um nível de crescimento à China que tem mais habitantes, do que relativamente ao resto do mundo. O problema, é que o mundo precisa mesmo que se diminuam as emissões de CO2.

E portanto, nós temos que investir em tecnologias, em procedimentos, em mecanismos que garantam que hajam menos emissões, que a nossa indústria é menos poluente. E portanto, temos aqui uma tensão contraditória. Queremos que o Mundo polua menos, mas temos que dar o direito aos países subdesenvolvidos de se desenvolver.

Eu não tenho nenhuma solução para isto, a solução está a ser estudada. Uma coisa parece-me evidente, é que, há um objectivo que nos deve unir a todos, porque proteger o clima do globo é do interesse colectivo, mas não podemos cercear numa camisa de sete varas o desenvolvimento daqueles que estão mais atrasados.

As formas concretas para encontrar isso, estão em cima da mesa, têm que ser justas, mas eu não sou um homem do ambiente, nem sou negociador em nome de Portugal dessas soluções. Sinto, é que nós estamos mal nesse campeonato. Já estivemos bem, Portugal ia para as reuniões internacionais e dava cartas, porque era um bom exemplo, agora, somos um mau exemplo. Porque nós já ultrapassámos aquilo a que tínhamos direito, e já ultrapassámos as metas a que nós próprios nos obrigámos, que não é exactamente o melhor exemplo para fora.

 

Pedro Rodrigues: - João Saracho do Grupo Roxo.

 
João Saracho
Primeiro de tudo, queria agradecer aqui ao Carlos Coelho, por ter aceite o convite de estar presente na Universidade de Verão. (Risos) Não. Vamos falar de coisas mais sérias agora. Nós, numa era em que a globalização está a desenvolver-se a nível da integração mundial, e esta evolução impossibilita o livre acesso a tecnologias, políticas, economia, transpondo diversas barreiras, faculta também a possibilidade de tornar banalmente a informação perigosa. Num mundo livre, global, a questão do grupo roxo é, será mais saudável não ter livre acesso à problemática global, como ainda acontece nalguns países em que existe alguma resistência a este processo de globalização, ou então, será em lugar de viver num país de livre acesso ao processo lá, perdendo assim barreiras individuais e tradições culturais. Ou seja, não estaremos a cair no risco de, neste processo que é tão atroz, perdermos a nossa identidade?
 
Dep. Carlos Coelho
Eu vejo muitas questões ligadas à identidade, e eu sinceramente não consigo ver o perigo, quer dizer, vocês podem não acreditar, mas em mais de metade das sessões que eu faço sobre a União Europeia, grande parte das perguntas centram-se, exactamente nessa questão. E eu percebo que há uma sensação de receio, e essa sensação de receio é politicamente interessante. Devemos olhar para ela com curiosidade intelectual e com resposta política, mas com curiosidade intelectual. As pessoas têm receio de perder a identidade e acham que a participação em fenómenos transnacionais reforçam esse risco.

Eu compreendo isso sob o ponto de vista intelectual, mas não vejo onde está a razão para o receio. Porque, vamos ser claros, sob o ponto de vista cultural nós dependemos mais de outros factores que não são europeus. A importância do cinema americano, no nosso código de valores, é mais importante do que a nossa adesão à União Europeia. Na nossa linguagem, a vossa geração já é uma geração marcada pela influência que as telenovelas brasileiras tiveram na televisão portuguesa, não apenas nas palavras, coisas que hoje se dizem que não se diziam há vinte anos, “eu estou carente”, é um termo que não existe em português, existe no português do Brasil, não existe em português de Portugal, “eu estou carente”, a palavra em português é carenciado, e não tem a expressão, não tem a mesma carência física, não é carência afectiva, emocional. O “Eu estou carente”, no sentido de “eu preciso de mimo”, não existe.

Mais importante do que a linguagem, foi a forma de observar determinado tipo de comportamentos sociais. Mesmo a própria expressão da nudez na televisão, foi muito trazida pela telenovela brasileira.

Portanto, sob o ponto de vista cultural, isso foram mais ameaças ou enriquecimentos, conforme a perspectiva, do que propriamente o facto de nós estarmos integrados em organizações internacionais, seja a ONU no plano internacional, seja a União Europeia no plano europeu.

Eu sinceramente, vejo, é um reforço das identidades, é as pessoas a agarrarem-se, aquilo que vos disse há pouco.

Percebo o receio. Porque as pessoas quando olham para uma realidade mais global, mais complexa, mais distante, preferem agarrar-se aquilo que conhecem. Isso é normal. Mas, a vossa geração é diferente, quer dizer, há alguns anos atrás, não se pensaria no conjunto de jovens que hoje fazem Erasmus, como hoje acontece. Hoje um jovem universitário admite como perfeitamente razoável, e muitos deles, muitos de vós, como uma mais-valia o facto de fazer o Erasmus e ter uma componente lá fora. Há alguns anos atrás, as pessoas entre a opção de fazer o curso todo na sua universidade, na sua terra, perto da família, dos amigos, etc., ou correr o risco de ir para fora, a maior parte dizia não, não corria o risco, era uma aventura. Quando eu era jovem, era perfeitamente marginal a percentagem dos meus amigos que faziam o inter-rail, que era a maior noção de aventura, que era ir de comboio para Paris, era uma aventura incrível, aquilo era uma ida, nós íamos a Espanha, ao sul de Espanha para fazer férias, e íamos para o estrangeiro, quer dizer, era uma sensação. Agora, a vossa geração já é manifestamente diferente.

 

Pedro Rodrigues: - Sabrina Coutinho Furtado, do Grupo Rosa.

 
Sabrina Coutinho Furtado
Bom dia a todos. A questão do grupo Rosa, prende-se com o seguinte: dado que a globalização é um fenómeno inevitável, como vê a Europa e o Mundo daqui a 30 anos?
 
Dep. Carlos Coelho
Precisava de ter uma bola de cristal que não tenho, bola de cristal que não tenho. Como é que eu vejo o mundo daqui a 30 anos. Primeiro vejo totalmente diferente daquilo que é hoje. Eu olho para o mundo há 30 anos atrás, eu tenho 47, portanto, há 30 anos atrás eu tinha 17 anos, e portanto, já me olhava ao espelho, já fazia a barba, e tenho alguma ideia das coisas que aconteciam. Bem, vocês não fazem a mínima ideia, é que há coisas que não vos passa pela cabeça. A primeira vez que eu vi um telefone móvel num carro já tinha vinte e muitos anos, já tinha vinte e muitos anos, era Presidente da JSD e fui com um ministro dum governo nosso, o governo do Prof. Cavaco Silva, portanto, terá sido no final da década de 80, eu estava num carro ofícial, ele tinha um telefone, era um telefone assim, é uma caixa assim, o telefone, telefone era maior do que este, mais largo, pesadão, e na altura este telefone custava 700 contos, na altura, não estou em condições de fazer, mas imaginem mil e muitos contos, em euros, para aí uns, entre 5 mil e 7 mil euros ou coisa assim do género. Era o telefone, havia muito poucos em Portugal, praticamente só os ministros e os grandes empresários é que tinham telefones no carro. E se nessa altura, fazíamos uma chamada do carro, toda a gente nos passeios olhava para nós. Se me dissessem naquela altura que passados 20 anos seria capaz de comprar um telefone pequenininho, um dos nossos portáteis, por tuta-e-meia, fazer chamadas por tuta-e-meia falar para Londres ou para Washington a menos do que 1 euro na hora em que a chamada é mais cara, eu diria que era completamente impossível, era completamente impossível há vinte anos atrás.

O meu primeiro computador foi um Spectrum, alguns de vocês terão ouvido falar. Era uma coisa muito gira, era um caixinha mais pequena do que isto, uma caixinha que se ligava a um gravador e que se ligava à televisão. Era muito engraçado porque tinha muitos jogos, e era fantástico, tinha uns jogos fabulosos, e tinha a programação em basic, era muito barato, era o computador mais barato na Europa, eu não sei porquê, porque eles feitos em Espanha e em Espanha custavam o dobro do preço que custavam em Portugal, e tinham uma capacidade de memória fabulosa, tinham 48 Kb, e metíamos aplicações lá dentro. Não sei se estão a ver. Um computador com a capacidade de memória de 48 kb, jogos, golfe, corridas de carros, com cores, com barulho, com as rodas a resvalarem no asfalto, 48 kb. Hoje 48 kb não é nada, é uma folha A4, não é?

Portanto, se o mundo mudou tanto neste 30 anos, o que é que vai ser daqui a 30 anos. Para concluir a resposta, acho que há três ou quatro coisas que a gente pode dizer: vamos ser mais, não sei se seremos os 9 mil milhões como a ONU prevê, mas vamos ser muito mais; vamos ter mais problemas de mudanças climáticas, vamos ter refugiados ambientais; vamos ter mais desigualdades no mundo; vamos ter problemas de segurança; e, vocês vão ter que fazer mais pela vida.

 

Pedro Rodrigues: - Muito bem. Dou a palavra ao Albino Silva, Grupo Verde.

 
Albino Silva
Caríssimo Carlos Coelho, a pergunta do Grupo Verde é a seguinte: há bocadinho falou e denotou alguma dificuldade entre uma possível conciliação no futuro entre objectivos ambientais e globalização, dentro deste cenário, perguntava, que importância terão no futuro as energias renováveis em relação à situação actual de dependência económica do petróleo?

A outra pergunta é: na sua perspectiva o que é que mudou após o 11 de Setembro?

 
Dep. Carlos Coelho
Bem, vocês só me fazem perguntas difíceis. Relativamente ao petróleo tenho dois ou três recortes giros na pasta de documentação, que espero ser-vos hoje distribuída, só acabei de fazer o índice enquanto respondia às vossas perguntas, não devia ter adormecido às 6 da manhã, devia ter feito directa.

Vamos cá ver: Petróleo. Petróleo é uma coisa que aprendi com o Eng. Carlos Pimenta, já lá vão uns anos e que achei muito engraçado. É que as reservas de petróleo são móveis, e vou-vos explicar porque é que elas são móveis. Há 50 anos atrás já se disse que as reservas de petróleo só davam para 30 anos, porque há uma diferença entre reserva e recurso. A reserva é o petróleo que é comercialmente explorável; o recurso é o petróleo que é muito dificilmente explorável.

Vamos cá ver: há petróleo para milhares de anos, só que está lá tão fundo, tão fundo, tão fundo, nas fossas abissais que não há tecnologia para o retirar. Petróleo, no planeta, há imenso, há imenso. O problema é que uns nós não conseguimos lá ir, porque não temos tecnologia para lá ir, outros é tão caro, tão caro, tão caro, que é mais barato extrair diamantes ou extrair ouro, do que extrair esse petróleo, conhecido pelo ouro negro, mas não tanto.

Porque é que eu digo que isto é móvel? Porque à medida que o preço do crude sobe, começa a ser rentável, ir buscar petróleo que antes não era. Quanto mais caro for o petróleo, mais reservas há.

A Venezuela, que hoje dispõe de petróleo numa quantidade incrível, só tem o petróleo que tem hoje porque o preço subiu, porque as reservas que eles estão a explorar, não eram comercialmente interessantes ao preço a que o petróleo estava há alguns anos atrás.

E, portanto, esta noção de que o petróleo vai acabar, depende do preço, é virtual.

Eu posso dizer que tenho petróleo para mais de 50 anos ao preço a que está hoje, no pressuposto que não se descobrem no entretanto novas jazidas. Agora, eu não posso antever qual é o preço a que o petróleo vai estar daqui a 5 anos, porque há dez anos atrás ninguém pensava que o crude estivesse aos níveis a que está hoje, há 10 anos atrás.

Portanto, primeira noção, eu não posso antever qual é a duração das reservas porque não sei o que é que são as reservas. As reservas dependem do preço a que se está.

Primeira noção, é diferente reservas de recursos.

Segundo, é exclusivamente por causa do preço, também por causa do preço, mas também por causa das questões poluentes, o mundo está acordar para a necessidade de encontrar alternativas, e nós hoje vemos uma grande aposta nas energias alternativas. Já há aliás quem se queixe de ver eólicas a mais na paisagem. Há um investimento muito grande no hidrogénio, considerado a energia do futuro. Há outros que acham que é o fotovoltaico, portanto, a conversão de luz do sol em energia eléctrica, que aliás, tem a vantagem de, se conseguirmos interfaces inteligentes e eficazes, podermos beneficiar da luz e ter energia, isto é, podemos pôr uma película no vidro que deixa passar a luz, mas retira energia e faz energia eléctrica. Podemos pintar os prédios com tintas que absorvem a energia do sol e a convertem em energia eléctrica e alimentam o prédio de energia eléctrica. Está tudo a ser estudado, não é exactamente ficção científica, não há ainda explorações comercialmente rentáveis da maior destas coisas, mas estão a ser estudadas. Há o solar típico, que já é utilizado para o aquecimento da água. Há um grande investimento agora no Alentejo, agora, aqui ao pé, na conversão da energia solar para energia eléctrica.

Portanto, há um conjunto de factores que estão a despertar no mundo que, aparentemente, vão tornar o petróleo menos necessário, mas como diz um dos recortes que vos vou dar, é que há utilidades de energia, que nós podemos substituir mas há outras que não. Nós não podemos com energia eólica pôr um carro a andar. Não dá. Podemos pôr um carro a andar com gás natural, podemos pôr o carro a andar, talvez com hidrogénio. Vi um protótipo muito giro, na Sciencie & Vie aqui há dois anos, gozando aliás uma actividade marginal de jovens, que eram jovens a snifar o tubo de escape do carro. Porquê? Porque a combustão do hidrogénio liberta vapor de água, e portanto, não é exactamente uma actividade muito tóxica, mas era engraçadíssimo ver a malta a snifar o tubo de escape e inspirar vapor de água.

Mas enquanto não substituirmos os motores dos automóveis, vamos precisar de petróleo, pelo menos, para fazer andar os automóveis. Embora, hajam carros híbridos, hajam carros eléctricos agora com mais frequência.

A segunda pergunta era, o que é que mudou desde o 11 de Setembro. Mudou muito. Mudou, para os Estados Unidos que se fecharam, mas a Dra. Leonor Beleza disse isso no jantar, eu escuso de repetir.

Há uma opção securitária que ameaça as liberdades, e eu sou claramente contra isso, eu acho que se deve combater o crime mas dentro do Estado de Direito Democrático. Eu acho que o combate ao crime permite, por exemplo, que a nossa intimidade seja violada, que violem a nossa correspondência, que escutem as nossas chamadas telefónicas, que vejam a nossa correspondência mas com tutela judicial.

Aquilo que os Estados Unidos estão a fazer é uma vergonha. Aprovaram leis, que o Congresso deixou passar, que permite ao Presidente dos Estados Unidos da América violar a intimidade da vida das pessoas, sem qualquer tipo de cobertura judicial. Acho isso inqualificável.

Na nossa União Europeia há países que fazem mais ou menos a mesma coisa. No Reino Unido, um ministro, não são todos, mas os chamados Ministros de Estado, podem decretar escutas sem cobertura judicial. Portanto, se você for inglês e eu for ministro do interior posso dizer: olhe, quero escutar as chamadas telefónicas do João. Sem autorização judicial. Depois há uma cobertura judicial a posteriori. Há um juiz nomeado pelo governo, que em 1.000 casos tira 3 para ver se os procedimentos foram respeitados ou não. Portanto, faz uma avaliação aleatória, e faz um relatório para o governo e para uma comissão parlamentar de controle dos serviços secretos que é nomeada pelo governo. É o único parlamento no mundo que eu conheça onde existe uma comissão parlamentar cujos membros são nomeados pelo Governo, que não responde perante o parlamento, responde perante o Primeiro-Ministro.

Acho que há uma violação dos direitos, há uma erosão dos direitos.

Aquilo que está a acontecer em Guantanamo, é uma vergonha para os Estados Unidos da América. Há pessoas que estão lá há quatro anos, há mais de quatro anos, sem culpa formada, sem serem apresentados no tribunal, na base da mera suspeita, muitos já foram, muitas centenas já foram libertados.

Eu recebi um deles, o Sr. Kunaz que foi testemunhar à minha comissão parlamentar, impressionou-me, um homem fragilizado emocionalmente. Um brutamontes, ainda mais largo que o Pedro Rodrigues, com uma cabeleireira descomunal, que esteve quatro anos na prisão inocente, que os americanos prenderam. O sr. Kunaz foi detido, foi preso, foi torturado, os americanos dizem que respeitam as convenções internacionais e que não torturam, mas têm procedimentos de, (com esta administração americana), de investigação agressiva que são considerados tortura na Europa, mas não são considerados tortura nos Estados Unidos.

Eu quando estive no Departamento de Estado tive uma discussão sobre isso, disse, os senhores estão a fazer tortura, e eles diziam, não, não, não fazemos tortura. Eu falava no Waterboarding, (tinha tido uma reunião com agentes da CIA em secreto, que me tinham revelado algumas coisas), e o John Bellinger que é o braço direito da Sra. Condoleezza Rice, olhou para mim e disse: Sr. Presidente, mas o Waterboarding não é tortura, é uma forma de interrogatório agressivo permitido nos Estados Unidos da América. Entretanto foi proibido. Waterboarding, é uma simulação de afogamento. É pôr celofane na cara, dificulta a respiração, a pessoa recebe jactos de água, que dá a sensação que está a afogar e entra numa situação de pânico com incapacidade de respirar, e houve pessoas que já morreram de ataques cardíacos porque causa dessas formas de interrogatório agressivos.

É de tal forma que os Estados Unidos recentemente proibiram o Waterboarding.

Mas temos estas nuances. Os Estados Unidos, aparentemente em 2002, (portanto, um ano depois) aperceberam-se que este Sr. Kunaz era inocente, tentaram libertar, mas a Alemanha tinha um governo socialista, e esse governo socialista que tinha más relações com os Estados Unidos, achou que era complicado ficar com o homem, e não mostraram interesse nenhum de ficar com o homem, e os Estados Unidos então disseram: se os alemães não querem ficar com ele, nós ficamos aqui com ele. E foi a Chanceler  Ângela Merkel, que se condoeu com a situação, e quando foi a Washington recuperar a relação com os Estados Unidos disse: têm um inocente que é de origem turca mas é cidadão alemão, libertem-no lá que é uma vergonha. E o fulano foi à minha comissão contar aquilo que lhe fizeram, contar o que é que passou.

E, é uma vergonha. Desculpem! Quatro anos de vida! Quem lhe devolve os quatro anos de vida, a ele e à família?

Agora, há dezenas de pessoas que ainda lá estão…, outro que eu falei, o Sr. Arar, que esteve um ano a ser torturado na Síria.

Não vos quero perder tempo com isso, mas o que é incrível é que muitos destes cidadãos estão a interpor acções contra a administração americana para serem ressarcidos, e os tribunais americanos, porque a administração americana invoca o segredo de Estado, para não dizer o que é que fez, para não fornecer os dados ao tribunal, diz que é actividade dos serviços secretos, é segredo de Estado, e os tribunais sem conhecerem os factos não podem julgar. O que é uma vergonha, porque é a negação do direito.

Um Estado responsável, é um Estado que assume a responsabilidade do que faz, e que paga pelos erros que faz, pelo menos indemniza. Invocar o segredo de Estado nestas circunstâncias, para negar a justa reparação a quem se fez tanto mal, é uma vergonha, é uma vergonha para uma país desenvolvidos, é uma vergonha para um país civilizado.

 
Dr.Pedro Rodrigues
Terminámos as questões dos grupos, vamos passar às questões livres. Mas antes de passarmos às questões livres, só queria chamar à atenção para um desafio que hoje vos foi colocado pelo JUV, e que consta da primeira página do JUV que diz respeito exactamente a esta conferência.

Lançou-vos o desafio de vocês próprios fazerem a capa do JUV de amanhã, e por isso, quem estiver interessado em ajudar o JUV a fazer a capa de amanhã, faça chegar à organização, ao Paulo Colaço, ou a outro membro da organização, o título ou aquilo que acham que devia ser a manchete e o título do JUV de amanhã, tendo em conta a conferência que hoje foi realizada.

Eu tenho já uma inscrição, que é a inscrição do Nuno Brito, portanto, dou a palavra ao Nuno Brito, e se o Carlos concordar, fazíamos blocos de duas questões, portanto, dou a palavra ao Nuno Brito e a seguir ao Vasco Campilho.

 
Nuno Brito
Bom dia a todos, eu gostava de em primeiro lugar, aproveitar para dar os parabéns ao Carlos Coelho pela Universidade de Verão e porque é uma pessoa a quem eu tenho muito mais a agradecer do que a excelente apresentação que fez aqui hoje, que ainda por cima teve em devida os problemas ambientais, aos quais sou particularmente sensível.

A pergunta que lhe gostava de fazer é: tendo em conta que a globalização é marcada por uma forte liberalização económica, essencialmente por liberação do comércio internacional, se na sua opinião a solução é mesmo, como é frequentemente apontada, que cada parte do mundo se deve especializar e fazer aquilo em que é melhor? E já agora que tenda em conta que os problemas que existem na China e nos outros países essencialmente produtores, no fundo são os de mão-de-obra, que hoje em dia já são os maiores produtores de todos, e da China já vêm os carros que deviam ser a especialidades da Alemanha, e já vêm os fotovoltaicos que poderiam ser a especialidade da Alemanha também.

Obrigado.

 
Vasco Campilho
Bom dia. Eu queria agradecer ao Carlos Coelho esta intervenção e como sei que o nosso Reitor valoriza particularmente o exercício da controvérsia, queria fazer também uma pequena crítica à parte final da apresentação, que penso que não fez justiça à mensagem global que acho que perpassa pela apresentação.

Na medida em que, quando falou das coisas boas e das más, para no fim dar uma resposta sobre se a globalização seria boa ou má, penso que nas coisas más terá seguido às vezes algum complexo relativamente às críticas que são feitas à globalização. E vou já explicar. Por um lado, alguns elementos, vá lá, menos positivos da globalização que nos apontou podem ser um pouco enganadores, por exemplo, quando se compra a riqueza pessoal das três maiores famílias ao PIB de 48 países mais pobres, claro que a discrepância é brutal e não deve ser escamoteada, mas apesar de tudo são grandezas de natureza diferente, porque uma coisa é património, outra coisa é o PIB produzido no ano. E o património, por exemplo, do Bill Gates não é um rendimento que ele tem disponível para andar aí a passear, quer dizer, é património que está a trabalhar e que está a gerar milhares e milhares de empregos por todo o mundo.

Portanto, apesar de, de facto essas discrepâncias serem impressivas, também temos que as interpretar de uma maneira um pouco mais fina, do que à primeira vista podem parecer.

Por outro lado, há factores de que falou e que são de facto flagelos do mundo actual, mas que não são forçosamente devidos à globalização. A questão das guerras, por exemplo, as guerras actuais mais mortíferas, devem-se essencialmente a elementos locais, por exemplo, a guerra do Ruanda, em 1994, em que morreu, mais ou menos, meio milhão de pessoas em três semanas, aquilo foi feito essencialmente à catanada, era uma questão étnica, que tinha raízes no colonialismo, evidentemente, mas onde não foram necessárias grandes vendas de armas, nem grandes fluxos globais. Coisas semelhantes estão-se a passar neste momento no Sudão. E as guerras mais globais neste momento, de forma interessante, como por exemplo, o conflito isarelo-palestiniano, até são as que têm menos mortes, justamente, talvez, por causa do escrutínio global sobre o que por lá se passa.

E, por outro lado, alguns elementos de que nos falou, por exemplo, as grandes desigualdades mundiais e um terço da população a viver com 2 dólares por dia, são também verdade, uma verdade deste mundo em que vivemos, que se está a globalizar; mas são uma realidade que a globalização está a contribuir para melhorar. Temos tido o desenvolvimento de países, infelizmente não está a passar por África ou pela maior parte dos países africanos, mas como a China e a Índia, justamente está a retirar milhões de pessoas da miséria extrema, que ainda estão na miséria menos extrema muitas delas, mas portanto, há coisas que estão a melhorar.

E é por isso que, eu seria mais claro numa apreciação positiva da globalização, eu caracterizaria de uma forma um pouco diferente, politicamente, porque penso que a globalização é um processo reversível, não é um processo inevitável, na medida em que a sua condição é a paz e a liberdade. Ela precisa de paz para poder existir, basta um guerra, basta um conflito global para nós regressarmos a termos muito menos globalizados. Basta ver o que se passou em 1914, é também um processo político e que deve portanto, ser defendido e aperfeiçoado.

E penso, aliás, que aquilo que o Deputado Carlos Coelho tem vindo a fazer no Parlamento Europeu ao relevar os retrocessos que a administração americana tem tido no respeito das liberdades e garantias, é uma luta pelo aperfeiçoamento da globalização.

E penso que é importante, nós, não cedermos a complexos de esquerda, quando estamos a falar de globalização e defendermos a liberdade e as trocas ao nível global de uma forma mais clara.

Muito obrigado.

 
Dep. Carlos Coelho
Vou tentar ser muito curto para dar oportunidade a mais pessoas. Nuno Brito, especialização, contínuo com a ideia de que é correcta. Não concordo com a comparação com a China, porque a China são mil e trezentos milhões de pessoas, portanto, a China é um continente, e portanto, ela de facto não precisa de se especializar, pode fazer de tudo. Portugal não pode fazer de tudo, e a União Europeia tenho dúvidas que possa fazer de tudo.

Agora, concordo que o objectivo da especialização tem que ser matizado com outro, que é o da autonomia. Isto é, se nós chegámos à conclusão em concreto, que não faz sentido termos agricultura na Europa, devíamos fechar tudo o que é agricultura, e devíamos fazer as outras coisas, em nome da nossa autonomia e da nossa segurança, eu diria, não devemos fazer isso, porque a Europa tem que ter a capacidade de produzir o mínimo de alimentos para não ficar totalmente dependente do exterior; a mesma coisa, relativamente às fontes de energia. Ainda que nalgumas matérias seja mais barato comprar do que produzir, para que não tenhamos de ficar totalmente dependentes do exterior, temos que produzir.

Portanto, há interesses estratégicos que temos que continuar a investir, ainda que, no domínio da especialização isso não fosse determinante. Depois, o Vasco fez uma crítica e eu agradeço a frontalidade com que a fez, e acho que ele parcialmente tem razão. Não tenho problemas nenhuns em conceder que no balanço final, algumas das coisas negativas que eu apontei, não são exclusivas da globalização, algumas delas podem ser acentuadas pela globalização, e outras até podem ser combatidas pela globalização, mas são dados das desigualdades do mundo em que estamos, que acabam por ter uma expressão mais gritante por causa da globalização, ou seja, por causa do crescimento económico que a globalização permite.

Agora, dito isto, duas coisas que eu não concordei com aquilo que o Vasco disse. Primeiro, a ideia de que as guerras não são uma condicionante disto. São parcialmente, porque elas são fruto duma indústria que está interessada em exportar, uma das coisas mais delicadas no mundo é que todos os países, os principais países que tem assento no Conselho de Segurança são os principais exportadores de armas no mundo. E esse é um comércio desagradável. O comércio legal é uma coisa que nos impressiona, o comércio ilegal então é um terreno fora da lei.

Como eu vos disse há pouco, o comércio ilegal de armas é a segunda actividade criminosa detectada pela ONU, a primeira é o tráfico de drogas, o segundo é o tráfico ilegal de armas. E isso está ligado aos grandes produtores de armas, que são os países mais importantes, são os Estados Unidos, são a Rússia, são a China, são o Reino Unido, são os países que produzem armas.

É verdade que algumas guerras são à catanada, mas a maior parte dos conflitos bélicos, mesmo no caso do Sudão que referiu, são com armas, e algumas delas bem desenvolvidas e bem modernas, e alguém as forneceu, alguém fez dinheiro com isso.

Eu tenho uma visão positiva da globalização, e peço desculpa se isso não foi evidente. Agora, quero que vocês vejam os dois lados da moeda, porque acho que isso é que é formação, não há verdades únicas e há uma coisa que para mim, como social democrata, é claro, eu não endeuso o mercado, o mercado para mim não é sacro-santo. O mercado tem falhas, e é exactamente nas falhas de mercado que o Estado tem de intervir. Qual é problema a nível nacional? É que não há um poder político para fazer essa compaginação. Enquanto no plano nacional, enquanto no plano europeu, enquanto no plano local, há um poder político capaz de acorrer à falha de mercado e tomar uma decisão política, ainda que resulte em menor eficiência do mercado, mas para proteger o interesse social legítimo, ao nível mundial não há esse nível de poder.

E, portanto, o problema do mercado ao nível mundial, é esse, é que pode gerar uma dinâmica económica que não é compensada em termos sociais.

E foi isso, sobretudo, que eu quis sublinhar.

Mas muito obrigado pelo desafio.

 

Pedro Rodrigues: - Acácio Coelho e João Almeida.

 
Acácio Coelho
Bom dia. Para já uma pequena afirmação, disse que Portugal tem um papel insignificante no processo de globalização. Eu penso que ainda ontem vimos que talvez não será bem assim. Mas afinal, neste processo de globalização, Portugal tem ou não vantagens comparativas como nação, como povo e como cultura? Não devíamos estar a orientar esforços para aproveitar essas mesmas oportunidades?
 
João Almeida
Bom dia a todos. Neste momento somos 27, Portugal é um país periférico, existe uma reestruturação dos órgãos europeus, perda de deputados, aumento do tempo da presença no Conselho Europeu. Pelas minhas contas, só daqui a 14 anos teremos novamente a presidência da União Europeia. Daqui a 14 anos, o que é esperado de um país que não aproveitou as vacas gordas da Europa?
 
Dep. Carlos Coelho
Bem, a pergunta do João é muito interessante mas não tem rigorosamente a ver com globalização, tem a ver com outra coisa, tem a ver com a Europa. Eu proporia que o João ou falasse comigo depois lá fora, ou exportasse a pergunta para o Tema do Prof. Miguel Maduro.

Relativamente ao Acácio Coelho, deve ser empatia entre coelhos, concordo com a pergunta. Quanto à observação inicial, quando disse que Portugal não tem muita força, em 6.000 milhões de habitantes nós somos apenas 10 milhões, portanto, Portugal sozinho não tem instrumentos para lutar no plano global, e dei o exemplo dos têxteis. A China passou a inundar o mercado português à revelia dos acordos que tinha assinado com têxteis a mais, se nós estivéssemos sozinhos não podíamos fazer nada. Só conseguimos porque estávamos na União Europeia e a União Europeia disse “calminha”, e com a União Europeia os chineses não brincam.

Portanto, quando falei do peso de Portugal, tinha a ver com isso.

O peso de Portugal no mercado mundial. Relativamente à valorização da cultura e da língua portuguesa, acho que devemos fazer muito mais, mas vamos ter dois momentos na Universidade de Verão para discutir isso, nas Assembleias, há um grupo que tem exactamente essa temática, vamos ver como é que ele a explora, e temos um jantar com uma das grandes figuras da cultura portuguesa, que é o Dr. Vasco Graça Moura, será um boa pergunta para o grupo colocar durante o jantar.

 

Pedro Rodrigues: - João Louzeiro e Maria João Mestre.

 
João Louzeiro
Obrigado por este grande momento que tivemos, gostei bastante da apresentação, e também por esta Universidade de Verão. As questões que gostaria de colocar são as seguintes: como vê as oportunidades que Portugal pode obter com o estreitamento das relações comerciais e culturais, no espaço lusófono? Ainda a importância deste espaço, enquanto possível parecer estratégico para a Europa? Também, como vê a importância da ajuda dos países mais desenvolvidos nos países menos desenvolvidos, particularmente a questão Europa/África, e América do Norte/América do Sul? E, já agora, permita-me uma outra questão: qual a importância dos Estados em controlar as actividades dos privados neste mercado global, e as injustiças que estas actividades podem criar, evitar nomeadamente que os lucros sejam obtidos à custa de muita miséria humana?
 
Maria João Mestre
Bom dia a todos. A minha pergunta vai no sentido que num período em que a globalização é um facto incontornável, como vimos aqui, creio que a chamada Mcdonalização do mundo também é acompanhada por outro movimento que só foi aqui parcialmente falado que é a Jihad, mas não quer dizer que seja a Jihad islâmica, ou seja, no sentido de um movimento anti globalização, de afirmação da tribo, ou seja, de afirmação daquilo que é local. Será que a batalha entre dois movimentos, que são centrífugos e centrípetos, um puxa-nos para fora, outro puxa-nos para dentro, vai sempre existir, ou seja, estes dois movimentos vão sempre proporcionar mais confrontos mundiais?
 
Dep. Carlos Coelho
Presumo que são as duas últimas perguntas, porque estamos a chegar à hora final e respeitamos as horas.

João duas respostas breves. Primeiro, Lusofonia, sem dúvida. Agora, vamos ser claros, a Lusofonia são duas realidades é o Brasil e são os outros, os outros são África, e África é o problema que eu vos mostrei. Portanto, sob o ponto de vista económico eu acho que podemos fazer mais em África, mesmo assim já há uma grande impacto nos países de língua oficial portuguesa. Agora, de uma forma geral, o nível de investimento da China está superior ao investimento de Portugal ou mesmo da Europa toda.

Os chineses foram lá e estão a ir a sério, levam capital, levam alguma tecnologia e levam pessoas, levam mão-de-obra. E estão em terreno em que, por razões evidentes, nós deveríamos ter mais espaço.

Relativamente à questão dos privados e dos mercados, foi aquilo que eu falei da OMC, aí acho que não é uma intervenção para o Estado nacional, mas é para um poder internacional. Isto é, admito que regulação das iniciativas dos privados ou dos públicos, na China há muita actividade pública, não é privada, que se alimenta da miséria humana. Não é por ser pública que deve deixar de ser combatida. Aqui o nosso ónus de fiscalização, não é por ser privado ou por ser público, é por violar ou não as normas, por violar ou não os princípios, por haver ou não exploração da miséria humana. E tem que ser na OMC.

De uma forma geral, nos países desenvolvidos, a lei acautela isso, em Portugal não pode haver exploração de mão-de-obra infantil, se houver trabalho escravo ele é penalizado, está neste momento a ser produzido na União Europeia, uma lei que criminaliza os empregadores que tiverem mão-de-obra ilegal, exactamente para combater a exploração de mão-de-obra ilegal.

Maria João. Duas questões diferentes, relativamente às duas pulsões, foi aquilo que eu disse no início das respostas, acho que elas são convergentes. Ou seja, acho que, a pulsão da globalização permite o reforço das entidades locais e regionais, e portanto, elas não são necessariamente inimigas ou adversárias, isso pode acontecer nuns lados, pode não acontecer nos outros, mas acho que depende dos poderes públicos garantir que o maior nível de integração económica não significa nenhuma descaracterização nem nenhuma diluição cultural.

E, portanto, aí não estou convencido que uma coisa seja necessariamente oposta a outra.

Já relativamente à Jihad. A Jihad islâmica insere-se numa lógica diferente, a Jihad islâmica insere-se naquilo que se designa chamar pelo conflito das civilizações. E nós temos um conjunto de pessoas que estão a tentar explorar o fundamentalismo religioso para tirar partido da raiva, do desespero de um conjunto de pessoas, com objectivos políticos. Os movimentos que se alimentam da Jihad islâmica para fazer o terrorismo no Ocidente, querem destruir a nossa civilização, querem atingir-nos onde dói mais, uns por umas razões, outros por outras, mas com o mesmo modus operandi.

Eu não dou ao movimento da Jihad islâmica o prémio de considerar que é um factor genuíno, que é um factor autêntico de reforço de entidade local face a um fenómeno global. Não acho que seja isso. Acho que é um factor induzido por outras coisas, que depois se alimenta disso que referiu e bem, ou seja, há muita gente que por razões religiosas repudiam o modo de vida ocidental, e portanto, é facilmente instrumentalizável por essa gente. Mas o factor indutor não é, a meu ver, uma coisa autêntica, uma coisa genuína, há um desígnio de um conjunto de terroristas que se alimenta da credibilidade das gentes, do fanatismo de outros, e que nos tenta atingir onde somos mais sensíveis.

Muito obrigado pela vossa atenção. De acordo com as regras o Pedro Rodrigues vai-me acompanhar à saída. E ficam com o Duarte Marques e a Zita.

(APLAUSOS)

 
Duarte Marques
Espero que tenham gostado deste nosso convidado, acho que o Reitor gostou imenso. Agora vamos votar por grupos. (Risos)

 

Votação.

 

Uma coisa, vocês vão receber uns recortes que eram de uma revista de imprensa sobre o tema que tiveram agora, vão recebê-la mais tarde, por isso podem sair, obrigado. Vão à visita, não se esqueçam que é muito giro. Vão ter surpresas durante a visita, e a própria cidade tem coisas que vocês nem imaginam que existem cá. Por isso vale a pena.